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G. Ciências Humanas - 1. Antropologia - 8. Antropologia
DEBATES, DIÁLOGOS E CONFRONTOS: UMA ANÁLISE DO PROJETO DE PARCERIA CIVIL REGISTRADA.
Moisés Alessandro de Souza Lopes 1   (autor)   sepolm@hotmail.com
1. Pós-graduando do Departamentode Ciências Sociais da Universidade Estadual de Londrina - UEL
INTRODUÇÃO:
Esse trabalho se centra, mais especificamente, em uma análise da parceria civil homossexual, tema que ganhou espaço e visibilidade no Brasil em 1995 quando a então deputada Marta Suplicy apresentou ao Congresso Nacional um projeto de sua autoria que buscava regulamentar a união civil entre pessoas do mesmo sexo. Recebendo o nome de Projeto de Lei de Parceria Civil Registrada, o PCR esteve algumas vezes na mídia gerando polêmica entre religiosos conservadores e grupos gays. Entretanto, após um período inicial de maior visibilidade na mídia e de uma discussão mais generalizada na sociedade o projeto acaba desaparecendo quase totalmente da cena pública. O principal objetivo desse trabalho foi analisar os valores impregnados nos diferentes discursos expressos pelos diversos atores que tratam da união civil entre pessoas do mesmo sexo. Discuto como esses diferentes discursos se intercruzam e se influenciam mutuamente. Assim, esse estudo adquire relevância, pois busca discutir um tema de importância especial para um grupo (os homossexuais), ao analisar a luta destes para terem seus direitos assegurados. E, também de grande importância para a sociedade, pois se a cidadania não chegou para alguns, isso não é um problema de poucos. Não respeitar as diferenças existentes na sociedade e em nós mesmos, reforça os preconceitos herdados, criados e construídos discriminando os que não são ou parecem iguais.
METODOLOGIA:
Ao desenvolver a análise do Projeto de Lei de Parceria Civil Registrada me coloquei dentro de uma arena de discursos, de múltiplas explicações, díspares, conflitantes e, às vezes, contraditórias; lógicas, significados, valores que conseguiram de alguma maneira, coexistir, entrelaçar-se e se auto-influenciar. Imersos neste universo de sentidos os diversos atores que participam da discussão a respeito da união civil entre pessoas do mesmo sexo acabam trazendo para o centro desta discussão valores, significados e representações sobre a homossexualidade. Tal diversidade de valores e lógicas transmitidos através de representações sociais sobre a homossexualidade, tornaram-se aqui objeto de minha análise e ponto de partida na busca por responder a questão motivadora desse trabalho: Que valores e lógicas são veiculados pelos diferentes discursos sobre a união civil entre pessoas do mesmo sexo expressos por diferentes atores sociais e de que maneira os mesmo influenciam ou mesmo impedem a aprovação do PCR no Congresso Nacional? Para responder a essa pergunta tive como fonte de análise os Anais da Câmara dos Deputados, a partir de 1995 até hoje. Como referencial teórico e metodológico tomo as contribuições de Georges Balandier sobre as dinâmicas sociais e o jogo das continuidades e descontinuidades, principalmente no trabalho do imaginário social, juntamente com a discussão de Norbert Elias sobre o papel da longa duração nos processos da civilização ocidental.
RESULTADOS:
Operacionalmente dividi a análise do material em 3 fases. Na primeira delas desenvolvi meu primeiro contato com o material de análise através de uma “leitura flutuante” e do estabelecimento do corpus de análise. Em uma segunda fase, desenvolvi uma exploração mais profunda do material, buscando extrair dele algumas regularidades que me permitissem criar categorias de análise. Inicialmente verifiquei a existência de algumas regularidades nos discursos dos personagens que faziam parte dessa discussão, são elas a recorrência da categoria “pecado”, da categoria “doença” e, também, a existência da categoria “direito”. Na terceira fase, a partir das categorias criadas realizei a análise dos dados a partir do referencial teórico definido. De uma maneira geral ocorreu o posicionamento dos atores de duas maneiras, os favoráveis ao projeto e os contrários ao projeto. Ambas as posições se basearam em múltiplas explicações e justificativas para defenderem seus posicionamentos, mas após uma análise mais profunda depreendi que os personagens que apoiavam a aprovação do PCR se pautavam por uma perspectiva científica e de defesa da cidadania e dos direitos humanos das minorias, nesse caso, especificamente dos homossexuais. Na posição inversa ocorreu a utilização de uma diversidade de argumentos, mas com a predominância dos de ordem religiosa e moral; em menor número, a utilização de argumentos da ordem constitucional/legal; e, a recorrência a explicações de ordem biológica.
CONCLUSÕES:
Na tramitação do projeto de lei na Câmara dos Deputados ocorreu a manifestação de diversos deputados, de inúmeros partidos em muitas datas diferentes e com posicionamentos distintos. Esses discursos constituíram material importante para a análise do referido projeto e um rico subsídio para a discussão da união civil entre pessoas do mesmo sexo e da homossexualidade na realidade brasileira já que trazem para a cena política representações, significados e valores acerca das sexualidades (i)legítimas em nossa sociedade. Quando me deparei com discursos sobre a homossexualidade, levei em consideração a existência de várias categorias analíticas, teorias e interpretações que surgiram para “explicar” a homossexualidade, oriundas de vários segmentos da sociedade e diferentes áreas do conhecimento. Dividi essas explicações e os núcleos significativos presentes, em três discursos: o biológico, que se fundamenta em explicações que atribuem o desejo homossexual a fatores genéticos, hormonais ou psicológicos; aquele que propõe explicações religiosas, portanto baseado em dogmas e crenças; e o discurso político pautado na defesa do direito e da cidadania construídos a partir da luta dos movimentos de emancipação homossexual. Estes três discursos – biológico, religioso e político – aparecem na fala dos deputados como explicações para aprovar ou não o PCR e ganham força na medida de sua aceitação/dispersão na sociedade brasileira o que provoca sua pouca discussão e a difícil aprovação.
Instituição de fomento: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - CAPES
Palavras-chave:  Parceria Civil Registrada; Imaginário Social; Homossexualidades.

Anais da 56ª Reunião Anual da SBPC - Cuiabá, MT - Julho/2004