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H. Artes, Letras e Lingüística - 4. Lingüística - 6. Lingüística
O HETEROGÊNEO SUJEITO E SEUS DISCURSOS: UM ELENCO DE VOZES
Viviane Brito Silva 1   (autor)   vivian.brito@bol.com.br
1. Escola Agrotécnica Federal de Senhor do Bonfim - EAF-SB
INTRODUÇÃO:
Sob diferentes óticas, as várias áreas do conhecimento têm se debruçado sobre a questão do sujeito. Nos estudos sobre a linguagem, a subjetividade também tem merecido destaque. Homogeneidade, completude, consciência, liberdade são características que já não se aplicam plenamente ao sujeito, que só pode ser entendido pela sua relação indissociável e inevitável com o outro.O espaço da subjetividade é tenso porque o sujeito tem a ilusão de que é livre e constrói o sentido, embora seja atravessado por vários discursos e preso às coerções sociais. Nessa contradição, nem completamente livre, nem completamente submisso, ele é múltiplo, porque representa vários papéis. Esse sujeito comunicante, embora seja único é, ao mesmo tempo, um sujeito coletivo, já que está inserido numa determinada comunidade, numa dada situação histórico-social. É dessa forma que a Análise do Discurso reconhece o sujeito e é sob essa perspectiva que ele será considerado aqui. Pretendendo contribuir com as discussões sobre o sujeito da linguagem, esta pesquisa buscou investigar como se constitui o sujeito nos textos escritos por alunos, numa situação formal de exame. Para tanto, pretendemos descrever os mecanismos enunciativos da passagem de indivíduo-pessoa a sujeito-aluno; recuperar, por análise das condições em que se constitui o discurso, as imagens que o sujeito faz de si para constituir-se como aluno e analisar os efeitos de sentido manifestados no texto, em razão da existência dos sujeitos textual e imaginário.
METODOLOGIA:
À luz dos princípios teóricos da Análise do Discurso, a presente pesquisa é de natureza qualitativa e interpretativista, de caráter introspectivo, tendo em vista os objetivos propostos. Essa interpretação está baseada especialmente na teoria não-subjetiva da subjetividade proposta por Pêcheux que considera o sujeito como uma categoria fundamental nos discursos, mas o destitui do poder de ser a origem e fonte dos sentidos e nas contribuições de Authier-Revuz e Norman Fairclough, os quais têm influenciado outros estudiosos cujas abordagens serão também indispensáveis para definir os rumos da análise aqui desenvolvida. O corpus foi constituído de redações de alunos, submetidos a um processo seletivo para ingresso na Escola Agrotécnica Federal de Senhor do Bonfim – Bahia, no ano de 2002. Elegemos a redação, gênero discursivo da esfera escolar, porque sabemos que é ainda o texto escrito mais solicitado nas escolas, apesar da divulgação de resultados de pesquisas que demonstram que a escola precisa enfocar a diversidade de gêneros discursivos existentes na sociedade. Além do mais, a redação escolar é muito valorizada em nossa cultura, uma vez que serve como critério de avaliação (quase sempre eliminatório) em muitos exames de seleção, concursos e vestibulares.
RESULTADOS:
O que tentamos mostrar, guiados pelos objetivos e hipóteses levantadas nesta pesquisa é que, para produzir sua redação, o sujeito é interpelado ideologicamente para que assuma uma posição-sujeito de aluno-autor. A essa função cabe organizar redes discursivas a fim de configurar um texto. Essa tarefa pressupõe a articulação de diversos discursos e a assunção de diferentes sujeitos escondidos pelo efeito de homogeneidade, de unidade textual. O processo de incorporação dessas redes discursivas constitutivas do discurso é realizado de maneira que o interdiscurso não figure explicitamente, uma vez que os já-ditos aparecem como se naturalizados pelo sujeito, que acredita ser a fonte do dizer. O sujeito, inconscientemente, apropria-se de uma rede discursiva formada pelos já-ditos sobre o tema. Esses discursos são internalizados e quando reaparecem nos textos, o sujeito os organiza de tal maneira que são mascaradas as marcas da exterioridade, o que produz o efeito de unidade acabada de sentido. No momento de escrever a redação, o sujeito-aluno pretende que o seu texto seja original, ele não tem consciência que o discurso é da ordem do repetível e, para ele, seu texto é novo e único. O sujeito necessita dessa ilusão de origem e originalidade, bem como da ilusão de completude. É esse processo que revela a existência de um sujeito assujeitado e criativo ao mesmo tempo, pois a (re)elaboração dos enunciados em condições específicas é o que caracteriza sua atividade discursiva.
CONCLUSÕES:
A redação do aluno, apesar de todos os aspectos que interferem em sua produção constitui um espaço de subjetividade porque nela reconhecemos um sujeito que, dentro de um conjunto de possibilidades, elabora um texto único, diferente, ainda que em muitos momentos apenas repita discursos. A repetição também é significativa. Na repetição do mesmo, novos sentidos emergem. E é isso que o sujeito sempre está fazendo: recuperando discursos internalizados pela memória discursiva e reformulando-os para que novos sentidos apareçam. É certo que muitos textos parecem meras cópias e em outras a dispersão só permite a incoerência, mas isso pode ser explicado pela pouca experiência dos alunos como produtores de textos, bem como pela formação deturpada que recebem da escola para lidar com a linguagem. Inegavelmente, os sujeitos, no nível da formulação, trabalham no fio do discurso – no intradiscurso – tentando articular os diversos discursos (da mídia, da ciência, da natureza, da política, da religião...) para que eles apareçam como se incorporados à própria voz do sujeito e isso faz com que cada texto seja um novo texto do ponto de vista discursivo. É nesse sentido que todo texto é a conjunção do velho e do novo, do já-dito e do dito de outra maneira. É esse processo que revela a existência de um sujeito assujeitado e criativo ao mesmo tempo, pois a (re)elaboração dos enunciados em condições específicas é o que caracteriza sua atividade discursiva.
Palavras-chave:  sujeito; texto; discurso.

Anais da 56ª Reunião Anual da SBPC - Cuiabá, MT - Julho/2004