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G. Ciências Humanas - 5. História - 9. História Social
UM ESTUDO SOBRE O ABORTO EM MEIO ÀS RELAÇÕES DE GÊNERO NO MARANHÃO (1945-1955)
Viviane de Oliveira Barbosa 1   (autor)   vivianedeob@yahoo.com.br
Tatiana Raquel Reis Silva 1   (autor)   
Bárbara de Sousa Cascaes 1   (autor)   
Antonio Evaldo Almeida Barros 1   (colaborador)   eusouevaldo@yahoo.com.br
Maria da Glória Guimarães Correia 1   (orientador)   Prof. Ms.
Sandra Maria Nascimento Sousa 2   (co-orientador)   Profa. Dra.
1. Depto. de História, Universidade Federal do Maranhão - UFMA.
2. Depto. de Antropologia e Sociologia, Universidade Federal do Maranhão - UFMA
INTRODUÇÃO:
O estudo acerca do imaginário, das sensibilidades e das inter-relações tecidas entre os diversos agentes pode contribuir, significativamente, para a compreensão da história das sociedades. Abordamos, principalmente através de registros escritos de meados do século XX, como se davam as práticas de aborto no Maranhão (1945-1955), em meio às quais vários elementos se interligavam, tais como: amor, paixão, corpo, desejo, adultério e moral. Para melhor compreensão de nosso objeto de estudo, enfocamos como deveriam ser, segundo os padrões sociais estabelecidos, a vivência sexual feminina e masculina, analisando os elementos sociais e simbólicos que faziam parte do universo da sociedade em questão. A compreensão dessa vivência sócio-cultural é importante para a análise das relações que se processaram, o que nos pode permitir notar permanências e rupturas no processo histórico. Procuramos saber a quais setores (social, moral, político) se relacionavam os discursos sobre a vivência sexual feminina, examinando, ainda, as contraposições entre as categorias de sexo, buscando perceber a padronização do campo de atuação da mulher. Aceitando que as relações de gênero se dão no seio das relações de classe/grupo social e que estas se dão no seio daquelas, se tratando de relações de poder (sob a óptica foucaultiana) que se processam no cotidiano, necessitando de permanente (re)negociação, é que efetivamos nossa análise sobre o aborto  uma das práticas da sociedade maranhense daquele período.
METODOLOGIA:
Este estudo sobre o aborto em meio às relações de gênero no Maranhão (1945-1955) se insere dentro das temáticas colocadas em questão pela História Social, campo este fomentado inicialmente pelas feministas que na década de 60 do século XX, reivindicavam por sua história  a História das Mulheres. Neste campo inserem-se os elementos que desenvolvemos em nosso estudo, o qual se volta para uma abordagem dentro da noção de gênero. A pesquisa em arquivos localizados na cidade de São Luis/MA, foi essencial: pesquisa no Arquivo da Biblioteca Pública Benedito Leite, onde trabalhamos com manchetes de jornais, anúncios de medicamentos e colunas sociais, e da Biblioteca do Seminário Santo Antonio. Também entrevistamos (entrevistas semi-estruturadas) pessoas que viveram o período em foco e pesquisadores que desenvolveram/desenvolvem pesquisa na área. Temos efetivado uma pesquisa bibliográfica de cunho interdisciplinar, trabalhando com bibliografia da Antropologia e da História, bem como da Sociologia e da Filosofia. O referencial teórico básico da discussão temos buscado a partir das produções de Rachel Soihet, Mary Del Priore, Magali Engel, Simone de Beauvoir, Carla Bassanezi, Margaret Mead e Michel Foucault.
RESULTADOS:
Com a verificação das fontes escritas percebemos que, em geral, as meninas daquela sociedade eram educadas para adquirirem altos conhecimentos domésticos, a fim de tornarem-se perfeitas donas de casa, enquanto os rapazes eram formados para exercerem uma autêntica vida de cidadania. A vivência sexual feminina estava (ou deveria estar) associada ao privado, pois o espaço público deveria ser de domínio masculino. Inseridas nessas relações, as mulheres deveriam atingir aquilo que era considerado o ideal de experiência feminina  ser boa esposa e boa mãe. Os anúncios de remédios que visavam um bom parto explicitam essa realidade: Três drageas por dia e fique tranquila! A futura mãe [...] não se poderia dar um conselho melhor para assegurar um parto feliz e um bebê sadio. Nesse mesmo contexto, os jornais nos mostram como eram presentes as práticas de aborto: Uma criança dentro de uma garrafa  Policia procura a mãe que condenou ao exterminio o proprio filho, Encontrado um feto num carrapatal  Estava embrulhado em folha de jornal. Encontrar um feto era lido como resultado de um crime. Naturalmente alguma mulher querendo esconder relações ilicitas que haja praticado, resolveu praticar o aborto. Tal ato era reprovado, na medida em que se tratava de Um ser que fora condenado ao exterminio pelo desespero de uma mulher que procurou ocultar uma mancha, fugindo ao repudio da sociedade, aos escrupulos morais de sua propria familia.
CONCLUSÕES:
A sociedade maranhense enfocada buscava delimitar os espaços feminino e masculino, representando o discurso de que a mulher para ser considerada uma boa moça, boa mãe e esposa (o ideal), deveria limitar o seu cotidiano ao espaço doméstico, ao tempo em que o lugar extra-casa deveria ser do homem. Contudo, tal discurso nem sempre era confirmado na prática, pois algumas mulheres freqüentavam cotidianamente o espaço público, dentre outros, por motivo de trabalho. Nessa sociedade, algumas mulheres eram acusadas de cometer loucuras, entre estas o aborto, motivadas pela paixão e pelo amor. Elas eram vistas como seres emotivos, carregados de intempestividade, já os homens eram percebidos como a confirmação da razão. Costumava-se pensar que o aborto era prática comum em relações extraconjugais, era lido como crime e associado às mulheres de má formação moral. Embora condenassem tal prática, diretamente relacionada às relações ilícitas, em que o corpo e o desejo estavam presentes, existia a preocupação com esses elementos nas relações lícitas, pois os homens deveriam ter bom desempenho sexual para satisfazerem suas esposas. Enfim, o aborto poderia configurar, de fato, uma alternativa para as mulheres solteiras e para aquelas que vivenciavam relações extraconjugais, era uma prática que constitui uma das fugas ao padrão sexual pré-estabelecido pela sociedade maranhense de meados do século XX.
Trabalho de Iniciação Científica
Palavras-chave:  História do Maranhão; Relações de Gênero; Aborto.

Anais da 56ª Reunião Anual da SBPC - Cuiabá, MT - Julho/2004