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H. Artes, Letras e Lingüística - 3. Literatura - 2. Literatura Comparada
A ARQUEOLOGIA DO IMAGINÁRIO DE "AMAR" (DRUMMOND) E "VERSOS ÍNTIMOS" (AUGUSTO DOS ANJOS)
Sandra Sassetti Fernandes Erickson 1   (autor)   sferickson@ufrnet.br
Liedna do Nascimento Silva 1   (autor)   liedna@zipmail.com.br
1. Depto. de Letras, Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN
INTRODUÇÃO:
Em A melancolia da criatividade na poesia de Augusto dos Anjos (João Pessoa: UFPB, 2003) Erickson deixa claro que a luta criativa é o tema principal da poesia de Augusto dos Anjos (1884-1914). O grotesco e a morbidez de seus poemas escondem o aspecto sublime de sua agonia na tentativa de se estabelecer como poeta forte no cânone. Nosso projeto de pesquisa “A subversão do terror pelo sublime na poética de Augusto dos Anjos” continua a investigar tanto as influências recebidas por Augusto dos Anjos quanto as influências exercidas por ele sobre seus “filhos poéticos”. Entre estas filiações está Carlos Drummond de Andrade (1902-1987). O presente trabalho estuda tal influência a partir da análise dos poemas: “Amar” (Drummond, Claro enigma, 1951) e “Versos íntimos” (Augusto dos Anjos Eu, 1912).
METODOLOGIA:
Usando o mapa da desleitura (Harold Bloom, 1995), comparamos esses poemas, examinando em seus versos e na estrutura das estrofes a ocorrência de imagens que se relacionam. Em “Amar” encontramos, por exemplo, “criatura” (l. 1 e 2) paralelo à “fera” (“Versos íntimos” l. 7 e 8). Notamos também por a maneira cautelosa com que Drummond apropria-se das imagens de “Versos íntimos” numa tentativa, ao que parece, de amenizar sua “ferocidade”.
RESULTADOS:
Os resultados dessa análise indicam que Augusto dos Anjos pode, sem exercício de textualidade violenta (Escola Critica de Yale), ser considerado pai poético de Drummond, já que os dois poemas estabelecem uma espécie de diálogo entre si--um diálogo agressivo em que os dois, por assim dizer, medem forças. Drummond luta para superar seu pai poético desmontando “Versos íntimos” em “Amar”. Para derrotar Augusto dos Anjos, ele tenta refutar o imaginário de “Versos íntimos” não só por tentar amenizá-lo (nesse sentido seu poema é mais “fraco” do que o do poema pai), mas também por deslocá-lo, por mudar a “ordem” em que as imagens aparecem em “Amar” e às vezes repeti-las para enfatizar sua discordância do poema pai (mecanismo denominado de “desvio”). Por exemplo, o “enterro” (da quimera) que em “Versos íntimos” aparece logo no segundo verso, é aludido em “Amar” apenas no sexto verso em “olhos vidrados”; outras imagens ainda repetem esta alusão no poema: “sepulta” (l. 11), “chão de ferro” (l. 16), “peito inerte” (l. 12).
CONCLUSÕES:
Os sinais da influência de Augusto dos Anjos na produção de um poeta forte como Drummond consolidam a importância, ainda pouco investigada, de Augusto dos Anjos na poesia moderna brasileira. Em “Amar”, Drummond não derrota seu pai poético. A força poética de seu poema pai (“Versos íntimos”), poema que luta com pesos pesados da tradição ocidental (Hesíodo, Calímaco, Propércio e Nietzsche), conforme Erickson, o coloca entre os poemas “feras” do cânone, sendo, assim, uma quimera difícil de derrotar; porém, ao alcançar a proeza de revisitar um poema como “Versos íntimos”, Drummond demonstra sua força própria força poética, provando-se, assim, uma “fera” entre as feras e um membro da família poética de Augusto dos Anjos. A luta criativa que Drummond trava com Augusto dos Anjos assegura a fortaleza deste seu pai poético ao mesmo tempo em que expõe as fraquezas, vis-à-vis seu pai poético, do próprio Drummond que não compartilha da “inevitável necessidade de também ser fera” da voz lírica de “Versos íntimos”. Incapaz de “apedrejar”, “cuspir”, ou seja, combater até o fim o imaginário do poema pai, esse poema de Drummond, admite sua “pequenez” poética ao indagar, “que pode uma criatura, senão entre criaturas amar?”. O imaginário de Augusto dos Anjos se torna, nesse, como em outros poemas, “uma pedra” no caminho do poeta, mostrando neste trabalho comparativo a sublimidade oculta no aparente grotesco de “Versos íntimos” e a angústia criativa do aparente “up beating” poema de Drummond.
Instituição de fomento: CNPq
Trabalho de Iniciação Científica
Palavras-chave:  Agon; Angústia da influência; Poesia.

Anais da 56ª Reunião Anual da SBPC - Cuiabá, MT - Julho/2004