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G. Ciências Humanas - 5. História - 9. História Social
A CONSTRUÇÃO DE UMA VIDA LIVRE: A NEGOCIAÇÃO DO ESPAÇO SOCIAL PELOS EX-ESCRAVOS DO ARRAIAL DE PAULO MOREIRA – 1854-1870.
Ícaro Trindade Carvalho 1   (autor)   icarotrindade@bol.com.br
Jonas Marçal de Queiroz 2   (orientador)   jonasqueiroz@ufv.br
1. Graduando do Deptº de Artes e Humanidades da Universidade Federal de Viçosa-UFV
2. Prof.Ms.do Departamento de Artes e Humanidades da Universidade Federal de Viçosa- UFV
INTRODUÇÃO:
A história social da escravidão no Brasil tem recebido importantes contribuições nos últimos anos, resultante da realização e divulgação de pesquisas regionais. Entre elas destacam-se trabalhos voltados para compreensão do universo do escravo, sobretudo para os significados que a liberdade assumia para os mesmos e, em contraposição, para os seus proprietários. Minas Gerais, considerada a província com a maior população escrava do país, durante o século XIX, tem sido beneficiada por estas contribuições. Vários estudos têm sido realizados nas últimas décadas, resultantes, em grande parte, da expansão dos programas de pós-gradução e das instituições de ensino e pesquisa.
Os resultados que ora apresentamos são parte de uma pesquisa desenvolvida no âmbito do subgrupo de pesquisa Movimentos Sociais e Representações Políticas, do curso de História da Universidade Federal de Viçosa, e trata do processo de alforria e da comercialização de escravos no Arraial de Paulo Moreira, atual município de Alvinópolis, Minas Gerais. O objetivo desta pesquisa foi caracterizar o escravo alforriado e o comercializado a fim de perceber as transformações ocorridas no sistema escravista local, ao longo do tempo. Na presente oportunidade, apresentamos os dados relativos à primeira parte.
METODOLOGIA:
O Arraial de Paulo Moreira possuía o maior número de escravos do termo de Mariana, em meados do século XIX, sendo importante área produtora de gêneros agrícolas que abasteciam mercados locais e até mesmo da Corte. Seus cartórios possuem uma documentação vasta, relativa ao século XIX, como escrituras de compra e venda e cartas de liberdade.
As cartas de liberdade, em particular, nos permitem analisar as formas de concessão de manumissões e as características do escravo alforriado. Elas apresentam em geral o nome, a idade, a cor, o estado civil, o valor, a ocupação, a condição da alforria, o nome do dono e uma breve justificativa sobre consentimento da manumissão. Estes dados são importantes para que se possa analisar as características do sistema escravista mineiro, em particular do Arraial de Paulo Moreira.
RESULTADOS:
Para Jacob Gorender, os alforriados eram geralmente da área urbana, do sexo feminino, ocupados em serviços domésticos. Além disso, a maioria era de cor parda e de idade avançada ou inválida, tendo sido alforriada em períodos de crise econômica. Peter Eisenberg, pesquisando as alforrias em Campinas, concluiu que, ao longo do século XIX, mudam as motivações para a concessão de cartas e o perfil do libertando. Até 1870, quando a maioria da população escrava em idade produtiva e empregada como mão-de-obra não qualificada era masculina, negra e crioula, as alforrias registradas foram desproporcionalmente distribuídas entre escravas mulatas, crioulas, muito jovens ou, em grau menor, muito velhas, empregadas no serviço doméstico. A partir de 1870 haveria uma mudança nesse perfil: o indivíduo majoritariamente alforriado era um escravo masculino, negro e, por força da legislação emancipadora, um crioulo na faixa etária mais produtiva (de 11 a 49 anos).
Tarcísio R. Botelho, pesquisando as alforrias concedidas em Minas Gerais, concluiu que as conjunturas econômicas, o caráter urbano e as variáveis estabelecidas para outras regiões não servem como padrão explicativo. Assim, observou que a maioria das alforrias eram gratuitas, porém com prestação de serviços. Além disso, a maioria era do sexo feminino e crioula.
Em nossa pesquisa, das 28 cartas de alforrias concedidas, 9 foram condicionais e onerosas. Quinze beneficiaram mulheres, das quais 5 eram pardas e 8 crioulas.
CONCLUSÕES:
Os resultados da pesquisa sobre as concessões de alforrias no Arraial de Paulo Moreira reforçam as conclusões de Peter Eisenberg e Tarcísio R. Botelho no que se refere à impossibilidade de estabelecermos um padrão único para o perfil do escravo alforriado. Eles indicam, ainda, um equilíbrio quanto ao sexo e predomínio das concessões para os escravos crioulos. Entretanto, os dados contidos nas cartas de alforria são insuficientes para conhecermos as características do sistema escravista local. Faz-se necessário, portanto, o cruzamento destes dados com aqueles contidos em outras fontes. Alguns autores utilizam também dados provenientes das ações de liberdade, testamentos, inventários e registros de batismo, entre outras fontes. Poucos têm sido, no entanto, os trabalhos realizados com escrituras de compra e venda, que nos permitem fazer comparações entre o perfil do libertando e o perfil do escravo negociado.
Palavras-chave:  História Social da Escravidão; Cartas de Alforria; Minas Gerais - Século XIX.

Anais da 56ª Reunião Anual da SBPC - Cuiabá, MT - Julho/2004