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C. Ciências Biológicas - 5. Ecologia - 1. Ecologia Aplicada
GESTÃO AMBIENTAL: AS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO E AS POPULAÇÕES TRADICIONAIS
Magda Beatriz de Almeida Matteucci 1   (autor)   mbeatriz@agro.ufg.br
Noga Neve Ribeiro Guimarães 1   (colaborador)   
1. Escola de Agronomia e Engenharia de Alimentos da Universidade Federal de Goiás
INTRODUÇÃO:
É inquestionável a necessidade de se restringir a pressão antrópica sobre os recursos naturais e, neste sentido, um instrumento adequado da gestão ambiental são as unidades de conservação (UC). Todavia, é necessário que para cumprir seu papel, este instrumento não estabeleça contradições associadas à mudanças da estrutura sociocultural da comunidade residente nos espaços que se transformam em áreas protegidas. Das modalidades de UC os parques são restritivos, não permitindo a presença do homem com ser ecológico/social. O mito da natureza intocada prevalece nestes espaços e, em muitas das circunstâncias, deslocando populações tradicionais e permitindo o acesso de turista, um procedimento no mínimo contraditório.
O Parque Estadual de Terra Ronca foi criado para preservar um complexo de cavernas. Com área de 56.912,9923 hectares ocupa 16,31% do município de São Domingos-GO, pertencente a microrregião do Vão do Paranã, considerada o corredor da fome goiano, por deter os menores IDH. O parque foi criado em uma área muito povoada, sendo constituída em maior parte por pequenas unidades rurais, oriundas de terras fracionadas por heranças sem inventários, pequenas cessões, invasões e sobreposições de propriedades através de demarcações acima da correta.
O presente trabalho discute o impacto da criação e implantação do Parque Estadual de Terra Ronca-GO, no que se refere a modificações na estrutura sociocultural da população tradicional dominicana na área de domínio da UC.
METODOLOGIA:
Como recurso metodológico para a realização deste estudo foi adotada uma combinação observação participante, entrevistas, aplicação de questionários e mapas temáticos da ocupação e uso da terra, do município e do Parque. Como base de dados cartográficos foram utilizadas as cartas topográficas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, folhas SD-23-V-D-I e SD-23-V-D-IV na escala de 1:100.000, uma imagem digital do satélite Landsat 7, os dados contidos no Diário Oficial do Estado de Goiás, de 27 de agosto de 1996, no qual encontra-se publicado o Decreto n 4.700 de 21 de agosto de 1996, que regulamenta o PETeR, o software SPRING 3.4 (INPE); uma mesa digitalizadora A-0 (Digigraf) e para os levantamentos em campo, um GPS de navegação Garmin 12XL.
Num universo de aproximadamente 150 propriedades, número impreciso em função do mosaico de propriedades dentro do parque, foram aplicados 50 questionários. A análise estatística foi realizada utilizando-se o procedimento CORMU (análise de correspondências múltiplas e de classificação) do Système Portable d`Analyse des Données bNumériques (SPAD.N Integrado, versão 2.5 PC/94) do Centre International de Statistique d’informatique Appliquées (CISIA), Saint-Mandé/ França.
RESULTADOS:
Dos entrevistados, 60% residem naquele território por mais de 40 anos, 52% declararam ser agricultores, 63% não possuírem renda fixa e 88% não ter nenhum ou pouco estudo formal. O maior anseio é a regularização fundiária, 80%. Para 66% nada havia mudado para melhor e que a criação do parque não melhorou nem piorou o estado de conservação da natureza. Muitos não regularizaram as propriedades por ser oneroso e acreditar desnecessário. E assim, as terras passaram de geração à geração sem a devida legalização dos direitos sobre elas. De uma primeira indenização, 18 propriedades foram indenizados, 15,50% do parque. Destas, 15 pertencentes a grandes proprietários. As demais estão comprometidas por questões relativas à documentação legal ou por usos dos recursos indenizatórios para outros fins.
Os pequenos proprietários têm receios de trabalhar a terra, mergulhados na expectativa de que a qualquer momento serão desapropriados. Expectativa responsável por conflitos psicológicos em muitos moradores, idosos, que adoeceram sob a pressão de promessas de pagamentos, ameaças imaginárias e a ansiedade gerada em todo início do ano agrícola: plantar ou não plantar? Convivem com indecisões: não têm como sair de suas terras, não foram indenizados, temem plantar e terem que sair, não têm acesso a financiamento bancário, terras desapropriadas não são garantia. Também perderam as possibilidades de emprego, os fazendeiros indenizados deixaram as terras.
CONCLUSÕES:
A modificação no regime de posse e uso da terra, alterou o modo de vida da comunidade dominicana. A criação de uma UC também deveria exercer o papel de viabilizar o modo de vida da população tradicional, evitando a deterioração social desta comunidade e a degradação do patrimônio cultural, expresso no modo de vida da população tradicional que habita naquele espaço transformado em parque, seu povo. O que não ocorreu. O parque veio transformá-los em hóspedes de si mesmos.
As modalidades de UC são amplas, existindo as que podem ser adotadas sem ferir o princípio da preservação, sem custos sociais, havendo modelos que possibilitam agregar as populações tradicionais residentes. O que ocorre é que os interesses dos que são gestores dos espaços naturais são distintos e distantes e, por vezes, excludentes destes últimos que, historicamente, possuem a arte de habitar em ambiente natural.
A questão no Brasil recai sobre a escolha da modalidade de UC que, via de regra, é um modelo que exclui o homem, como um parque, gerando problemas sociais, penalizando as populações tradicionais, especialmente por não concretizar a implantação da UC no que diz respeito à regularização fundiária. As questões fundiárias das UCs no Brasil arrastam-se ao longo dos anos, sem serem solucionadas. Alega-se a falta de recursos para indenizações e, ou não pagam ou, quando o fazem geram-se controvérsias quanto aos valores pagos (Drummond, 1997 & Bursztyn, 1997).
Esse quadro se repete no PETeR.
Palavras-chave:  Gestão Ambiental; Unidade de Conservação; PETeR.

Anais da 56ª Reunião Anual da SBPC - Cuiabá, MT - Julho/2004