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F. Ciências Sociais Aplicadas - 12. Serviço Social - 2. Serviço Social da Criança e do Adolescente
MÃES DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES VÍTIMAS DE ABUSO SEXUAL INTRAFAMILIAR: CAMINHOS TORTUOSOS PARA A DENÚNCIA
Catarina Maria Schmickler 1   (orientador)   catarina@mbox1.ufsc.br
Cláudia Priscila Chupel 2   (autor)   claudia-priscila@ibest.com.br
Fernanda Ely Borba 2   (autor)   fernandaely_borba@hotmail.com
1. Profa. Dra. do Depto. de Serviço Social, Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC
2. Acadêmica do Depto. de Serviço Social, Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC
INTRODUÇÃO:
A pesquisa Mães de crianças e adolescentes vítimas de abuso sexual intrafamiliar: caminhos tortuosos para a denúncia foi desenvolvida no âmbito do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Violência-NEPEV do Departamento de Serviço Social da Universidade Federal de Santa Catarina e procurou investigar uma face ainda pouco estudada do abuso sexual intrafamiliar. O enfoque da investigação incidiu sobre um dos agentes da relação familiar, a mãe. Investigar a mãe significou enfrentar o fenômeno da violência contra a criança e o adolescente por um prisma contundente: o do adulto não-abusivo que se mostra incapaz de proteger a filha. Intentou-se aqui, uma maior aproximação do fenômeno, procurando investigar os nexos que permitem a sua ocorrência. Partiu-se da seguinte questão norteadora: A mãe não-protetora tem uma história de abuso-vitimização vivida na infância? Para responder a questão foi testada a hipótese de que uma mãe que se mostra não-protetora possa ter sido vítima de abuso sexual na infância. Procurou-se investigar, mais especificamente, as mães de crianças e adolescentes do sexo feminino que, não sem freqüência, se revelaram progenitoras incapazes de proteger suas filhas do abuso protagonizado por seus companheiros. Com esta pesquisa pretendeu-se contribuir para a reflexão sobre o fenômeno, buscando oferecer subsídios para amparar possíveis programas junto a famílias incestuosas, ou àquelas com potencial para a ocorrência do abuso sexual incestuoso.
METODOLOGIA:
A pesquisa caracterizou-se por ser de natureza qualitativa, a qual segundo Camargo (1987, p. 22) “revela-se particularmente eficaz em áreas exploratórias, especialmente em campos temáticos onde inexistem fontes de informação acessíveis e organizadas”. É apropriada, diz a autora, para “zonas” de grande opacidade onde predominam segredos, fenômenos ligados ao comportamento desviante e à criminalidade e onde grupos de difícil acesso exigem do pesquisador especial habilidade em penetrar no universo estudado, o que pode ser feito “a partir de procedimentos bem mais delicados e mais sutis do que o questionário padronizado” (Idem). Inicialmente foi realizado o levantamento do estado da arte sobre o assunto em tela com extensa pesquisa bibliográfica. A História de Vida foi a modalidade de investigação escolhida como caminho privilegiado para conhecer o objeto de pesquisa. Foram realizadas entrevistas gravadas com três mães atendidas no Programa Sentinela do município de Florianópolis/SC. Os depoimentos foram gravados em fitas magnéticas e transcritos de acordo com Corrêa (1978) e Alberti (1989). A partir do material transcrito foi feito o ordenamento das histórias de vida e escolhidas as categorias que subsidiaram a análise e interpretação das informações.
RESULTADOS:
As mães pesquisadas revelaram história de abuso sexual na infância; dão grande importância ao modelo de família tradicional evitando romper os laços familiares, ainda que conflituosos; são membros de famílias em que valores e princípios religiosos são freqüentemente apontados e defendidos; acreditam que a conduta exemplar dos companheiros em relação às suas filhas é revelador de afeto e amor; não dão crédito aos relatos de abuso sexual sofridos pela filha, tendo silenciado sobre a história de violação por longo tempo. As mães não são conhecedoras da lógica, das estratégias e do perfil de um abusador sexual intrafamiliar.
CONCLUSÕES:
O discurso das mães não-protetoras de crianças e adolescentes abusadas sexualmente pelo pai foi permeado por ambigüidades e contradições em que se mesclaram indícios de culpa e justificativas para a ocorrência do abuso. A responsabilidade pelo abuso é projetada para outras pessoas e também para as circunstâncias que favoreceram a sua ocorrência. O uso de substâncias lícitas e ilícitas pelo abusador foi apontado como causador da transgressão do tabu do incesto. O oferecimento de recompensas em dinheiro e guloseimas para a criança, que costuma fazer parte integrante das estratégias de sedução do abusador, é interpretado pela mãe como revelador de boas relações pai-filha e de amor filial. Prováveis vestígios ou indícios de abuso são, assim, escamoteados pelo pai e confundem a mãe levando ao descrédito da criança quando esta, encontrando coragem para romper o silêncio, revela ser vítima do pai. A ambivalência da mãe gerada pela peculiar comunicação no seio familiar que, por um lado, aponta para o abuso relatado pela criança e, por outro lado, pelos gestos amorosos do companheiro, dificulta uma eventual denúncia. É possível concluir que uma mãe reproduz na vida adulta a qualidade dos cuidados recebidos na sua infância, quer seja de proteção ou não. Uma criança que não encontre acolhimento na figura materna corre risco de revitimização por meses ou até anos sem que o abuso se torne um fato concreto para a mãe.
Instituição de fomento: CNPq
Trabalho de Iniciação Científica
Palavras-chave:  criança e adolescente; abuso sexual intrafamiliar; conivência materna.

Anais da 56ª Reunião Anual da SBPC - Cuiabá, MT - Julho/2004