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G. Ciências Humanas - 7. Educação - 9. Educação Permanente
VELHICE E CIDADANIA: POLÍTICAS PÚBLICAS, AÇÕES COLETIVAS E PRÁTICAS DE AUTONOMIA NA TERCEIRA IDADE
Evaldo Amaro Vieira 1   (orientador)   Prof. Dr. / amarovieira@uol.com.br
Marcos Augusto de Castro Peres 1   (autor)   mperes@usp.br
1. Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo - USP
INTRODUÇÃO:
Este trabalho trata da intrincada relação entre velhice e cidadania, considerando a situação de exclusão social vivida pelos que envelhecem. Como referência de análise, utiliza-se o acesso à educação, ao trabalho e a uma aposentadoria digna e justa, direitos sociais que, se efetivamente respeitados, permitiriam ao idoso viver com dignidade e autonomia. No entanto, a lógica do nosso sistema educativo concentra nas fases iniciais da vida humana a experiência educacional, excluindo desse processo os adultos mais velhos e os idosos. Estes, da mesma forma, também são excluídos pela lógica do mercado de trabalho, que os condena a uma aposentadoria precoce e miserável ou a condições precárias e instáveis de trabalho. É devido essencialmente à exclusão dos velhos das esferas da educação e do trabalho que velhice, aposentadoria e pobreza têm sido sinônimos na sociedade capitalista industrial, desde os seus primórdios. Assim, só uma educação permanente ocorrida ao longo da vida e o acesso a uma renda digna poderiam promover a emancipação real dos que vivem o drama da velhice. Analisamos, portanto, como as atuais políticas públicas de atenção à velhice e as ações da sociedade civil organizada têm contemplado os direitos dos que envelhecem com relação à educação, ao trabalho e a uma aposentadoria digna. Por fim, investigamos como alguns idosos têm exercido sua autonomia por meio do trabalho e da participação em atividades educativas.
METODOLOGIA:
A metodologia consistiu, de início, na análise bibliográfica acerca: 1) da situação sócio-demográfica do idoso no atual contexto das sociedades capitalistas em geral, e na sociedade brasileira em particular, marcadas pelo envelhecimento populacional, atentando para as condições de trabalho, renda e nível educacional; 2) do Estado democrático, de bem-estar social, e as políticas públicas voltadas à velhice no Brasil; 3) da emergência do chamado terceiro setor, ou seja, um conjunto de organizações da sociedade civil destinadas a práticas solidárias, assistencialistas e de cidadania, com destaque para as envolvidas com a questão da velhice; 4) da prática da autonomia por meio do trabalho e da educação, opondo cidadania assistida à cidadania emancipada. Num segundo momento, dando início à parte empírica da pesquisa, analisamos as políticas públicas e ações coletivas relacionadas à velhice, investigando de que forma contemplam o acesso à educação, ao trabalho e a uma aposentadoria digna. Para tanto, foram analisados documentos formais da Política Nacional do Idoso (PNI), do Estatuto do Idoso (EI) e das organizações da sociedade civil especializadas na velhice. Além disso, entrevistamos alguns membros dessas entidades e também do governo, envolvidos com a formulação das respectivas políticas públicas. Num terceiro momento, entrevistamos idosos aposentados que trabalham e participam de programas educativos, questionando-lhes acerca de cidadania e autonomia.
RESULTADOS:
Podemos enumerar os seguintes resultados: 1) tem sido bastante expressiva a participação do idoso no mercado de trabalho e, dentre esses, a dos aposentados que integram a PEA idosa; 2) são os idosos de menor poder aquisitivo que prevalecem no mercado de trabalho, necessitando desenvolver atividades remuneradas para garantir a sobrevivência, mesmo depois de aposentados; 3) contudo, as melhores chances de permanecer ativos pertencem aos idosos mais bem qualificados, aos de melhor escolaridade; 4) a imagem de dependência econômica e social tradicionalmente associada à velhice não é verdadeira, uma vez que o idoso tem assumido hoje um importante papel como provedor principal de suas respectivas famílias, em virtude do desemprego; 5) nas políticas públicas de atenção à velhice promovidas pelo Estado a população idosa não é consultada sobre as suas reais necessidades e nem participa dos movimentos de reivindicação que teriam levado à PNI e ao EI ; 6) emerge no Brasil um suposto movimento social do idoso, sem a participação do idoso, protagonizado por um conjunto de instituições da sociedade civil, destacando-se a SBGG, ANG, CNBB, COBAP e o SESC , integrantes do CNDI , e cuja mobilização resultaria na PNI e no EI; 7) para os idosos entrevistados, não existe cidadania sem autonomia, ou seja, sem uma renda previdenciária digna, acesso a oportunidades educacionais e de trabalho, direitos constitucionais que, apesar de estarem na pauta das atuais políticas públicas, ainda não passam de letra morta.
CONCLUSÕES:
O fenômeno do envelhecimento populacional tem criado a necessidade de repensar diversas esferas da sociedade, principalmente da educação, do mercado de trabalho e da previdência, fundamentais para a autonomia do idoso. Isso tem exigido do Estado a formulação de políticas públicas que visem adequar a sociedade brasileira ao seu novo perfil etário. É resultante desse processo a PNI e o EI, bem como a proliferação de organizações da sociedade civil voltadas para a questão da velhice, que atuam na representação e na defesa de direitos da população idosa. Tais organizações protagonizam um pretenso movimento social do idoso, que, contudo, não conta com a presença do próprio idoso. Essa ambigüidade revela o caráter assistencialista das políticas estatais e das ações das ONGs em prol da população idosa, mascarando a tutela política e os interesses comerciais. Em tese, o processo de mercantilização e reprivatização da velhice que acompanha a noção de terceira idade é reveladora de tal realidade, pois o aumento do número de idosos cria um importante mercado consumidor e uma significativa massa eleitoral, além de incitar o Estado a se eximir estrategicamente dos custos e da responsabilidade sobre a velhice. Apesar de constarem na PNI e no EI planos de ação nas áreas de educação, trabalho e previdência, muito pouco até agora foi feito nesse sentido, obrigando os idosos a praticarem sua autonomia tendo que buscar por si próprios melhorias de renda e nível educacional.
Palavras-chave:  Políticas públicas de atenção à velhice; Ações coletivas referentes à velhice; Práticas de autonomia na velhice.

Anais da 56ª Reunião Anual da SBPC - Cuiabá, MT - Julho/2004