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G. Ciências Humanas - 7. Educação - 3. Educação Ambiental
NATUREZA DA RELAÇÃO HOMEM/MORCEGO E QUESTÕES MÉDICO-SANITÁRIAS EM POVOADOS DA REGIÃO NORTE DO BRASIL
Lucia Maria Paleari 1   (autor)   lpaleari@ibb.unesp.br
1. Depto. de Educação, Instituto de Biociências, Universidade Estadual Paulista - UNESP
INTRODUÇÃO:
Relatos de ataques do morcego Desmodus rotundus a pessoas de diversos povoados da região norte do Brasil, têm crescido muito e teme-se pela possibilidade de disseminação do vírus da raiva e crescimento da mortalidade entre humanos. No entanto, a ausência de dados representativos da interação Homem-morcego-ambiente, inviabiliza a compreensão do problema e a tomada de medidas profiláticas efetivas, que são de suma importância em razão das apreciáveis perdas de sangue que as mordidas D. rotundus provocam, e das dificuldades para a conservação e transporte por longas distâncias de vacina e soro anti-raiva, requeridos em tratamentos pré e pós-exposição. Dada a importância de propostas educativas e de manejo ambiental bem fundamentadas para aquelas áreas, visando estimular, em adultos e crianças, atitudes conscientes e adequadas à prevenção dos ataques de D. rotundus, foi desenvolvido este estudo por meio do qual buscou-se avaliar o problema da raiva e conhecer as características das interações ecológicas e sócio-culturais entre Homem-morcego-ambiente.
METODOLOGIA:
Os dados foram coletados em 14 localidades do Pará, e em 4 do Amapá e centrados nas condições de vida das populações e ambiente, seus hábitos, conhecimentos de História Natural e concepções fantasiosas acerca dos morcegos, e experiências pessoais com ataques desse mamífero. Nas escolas, a principal atividade foi o desenho, com solicitação para que crianças representassem o que conheciam sobre morcegos, sempre seguida da apresentação dos trabalhos e de respostas a questionamentos. Entre os moradores os dados foram coletados por meio de conversas informais. Os registros foram feitos em fita de vídeo, fita cassete, fotografias e por escrito.
RESULTADOS:
Os povoados visitados possuem, em geral, condições precárias de acesso, moradia, saneamento básico, mas agentes de saúde desempenhando papel relevante. A maioria das casas são de madeira e pau-a-pique, com inúmeras aberturas que possibilitam entrada a morcegos. Entre as pessoas verificou-se que: a) os problemas da raiva e de sua transmissão são desconhecidos na maioria dos povoados; b) locais do corpo humano usados para as mordidas e outras espécies de animais também atacadas pelo D. rotundus são de conhecimento geral; c) inúmeras marcas de mordidas são comuns no rosto e constrangem adolescentes; d) pessoas nativas reconhecem características morfológicas de espécies distintas de morcegos e estabelecem as respectivas relações com hábitos alimentares, aspectos comportamentais e locais de abrigo; e) migrantes de outros estados desconhecem muitos dos aspectos de história natural dos morcegos, acreditam que se originam de ratos e fazem referência à lenda do vampiro; f) a medida preventiva de uso comum aos ataques é a lamparina acesa à noite; g) nativos acreditam que os morcegos apagam propositadamente as lamparinas com o bater das asas e hipnotizam as vítimas para atacá-las; h) há medo generalizado de receber aplicação de vacinas, sentimento que sustenta e é sustentado por ameaças de adultos a crianças com o intento de coibir suas traquinagens. Com base nesses dados foram elaboradas propostas educativas e produzidos dois jogos voltados à população infanto-juvenil.
CONCLUSÕES:
Longas distâncias, precariedade de condições, empecilhos a tratamentos pré e pós-exposição ao vírus da raiva, exigem e não inviabilizam o desenvolvimento de programas educativos, que o estudo demonstrou serem de necessidade premente. O quadro de ataques por D. rotundus, que em só uma localidade não encontrou condições favoráveis para chegar às pessoas, pode ser alterado pela população, por meio de medidas preventivas simples, que vão do uso de malhadeiras ou tiririca para vedar janelas e vãos entre paredes e telhados, até redução de áreas desmatadas, confinamento de animais de criação de pequeno porte ao entardecer, ficando ao encargo de técnicos especializados o manejo de populações de D. rotundus. A grande quantidade de relatos de mortalidade de animais de criação em determinado período, sem correspondência com casos de mortalidade de pessoas com sintomas da raiva e também atacadas, chegou a sugerir baixa carga viral inoculada, capaz apenas de estimular reação imunológica protetora, aspecto que merece consideração em investigações futuras. Propõe-se programas específicos direcionados a professores, para tratamento interdisciplinar da questão junto aos alunos, e capacitação específica dos agentes de saúde, bem como o aproveitamento de um programa especial de rádio já existente na região de Santarém, para desenvolvimento de amplo trabalho de esclarecimento e orientação à população, considerando seus conhecimentos e características sócio-culturais.
Instituição de fomento: FAPESP, NUEPI/SESPA, SESAP
Palavras-chave:  Interação Homem-Ambiente; Educação em Ecologia; Educação e Saúde.

Anais da 56ª Reunião Anual da SBPC - Cuiabá, MT - Julho/2004