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H. Artes, Letras e Lingüística - 2. Letras - 1. Língua Portuguesa
RETEXTUALIZAÇÃO - DO ORAL AO ESCRITO: A INFLUÊNCIA DA ESCOLARIDADE
Amélia Maria Jarmendia 1   (orientador)   amelia.soares@unicsul.br
Valquíria da Silva Rodrigues 1   (autor)   valkika@hotmail.com
1. Centro de Ciências Humanas e Sociais, Artes e Educação, Universidade Cruzeiro do Sul - UNICSUL
INTRODUÇÃO:
A língua é uma atividade socio-interativa, histórica e cognitiva, não apenas um sistema de regras ou instrumento de informação. São os usos que fundam a língua e não o contrário; por isso, falar ou escrever bem não é ser capaz de adequar-se a regras da língua, mas usá-la de forma a produzir um efeito de sentido pretendido, numa dada situação comunicativa.
Ao ingressar na escola, o aluno dispõe de uma competência lingüística, adquirida em seu grupo de interação, que lhe permite participar das relações sociais de seu cotidiano, incluindo as escolares. Em razão disto, embora seu uso contínuo, a linguagem oral, raras vezes, tem sido conteúdo específico do processo de ensino e aprendizagem de Língua Portuguesa. Este quadro tende a ser modificado em função de estudos recentes que se afastam da forma estanque e dicotômica de entender as relações entre oralidade e escrita, buscando inseri-las no quadro mais amplo das práticas comunicativas e dos gêneros textuais.
É segundo este enfoque conceitual que se desenvolveu este projeto de iniciação científica, que visa fundamentalmente a identificar as operações textuais-discursivas, conforme modelo proposto por Marcuschi, que os alunos de diferentes séries põem em jogo na passagem do texto falado para o escrito (retextualização), bem como avaliar em que medida a experiência escolar influência este processo, o que é relevante considerando-se que a escola vem sendo acusada de não cumprir sua função em relação ao ensino da leitura e escrita.
METODOLOGIA:
A pesquisa compreendeu o desenvolvimento de 05 (cinco) etapas, em que é possível identificar a metodologia usada. A primeira etapa consistiu no levantamento de bibliografia pertinente à área e seu estudo, bem como na definição da proposta da produção do texto oral e seleção dos textos-pretexto: a crônica Da utilidade dos Animais, de Carlos Drummond de Andrade, para a 4ª série, e o filme Romeu e Julieta, para a 6ª série.
Quanto aos participantes da pesquisa, foram selecionados, em média, 8 alunos em cada série (4ª e 6ª), cujo desempenho em Língua Portuguesa era considerado satisfatório, para a produção dos textos orais a partir dos textos-pretexto. Na segunda etapa, deu-se ensejo à gravação da situação de produção de texto oral e transcrição das gravações. Oito alunos da 4ª série e igual número da 6ª série ouviram a leitura da crônica e assistiram ao filme, respectivamente. Esta atividade foi seguida de um debate, que possibilitou identificar os alunos que reproduziriam os textos oralmente. Transcritas as produções orais, foi convidado um aluno de cada série (4ª, 6ª e 8ª) que não havia participado da etapa anterior, para a audição da fita e produção do texto escrito.
Na seqüência, realizou-se análise comparativa dos textos orais e escritos, para identificar as operações textuais-discursivas postas em prática por alunos de diferentes séries, o que possibilitou avaliar em que medida a experiência escolar influencia o processo de retextualização.
RESULTADOS:
No processo de retextualização, a aluna da 4ª série realizou as quatro primeiras operações, segundo o diagrama das operações textuais-discursivas proposto por Marcuschi, que se referem às operações de regularização e idealização e fundam-se nas estratégias de eliminação e inserção, não se introduzindo, ainda, uma transformação rigorosa.
Na texto da aluna da 6ª série, observa-se a eliminação de marcas estritamente interacionais, hesitações e a introdução da pontuação baseada na entoação das falas. Ainda que mantenha um ou outro termo próprio da oralidade, há um avanço que se caracteriza pela introdução da paragrafação e pontuação detalhada. Ainda, observa-se preocupação com a organização sintática, que se evidencia por meio das noções de completude, regência e concordância.
Na produção da aluna da 8ª série, identificam-se todas as operações elencadas no diagrama de Marcuschi: regularização, idealização e transformação. Observa-se um avanço em relação às operações especiais no que diz respeito, sobretudo, à redução das informações na produção escrita em relação ao texto oral, sem a perda efetiva dos elementos fundamentais que garantem a coesão e coerência. Trata-se de um procedimento de resumo, presente no quadro de operações especiais (2000: 89-91), em que se neutralizam, por completo, as falas e se detém na essência dos fatos. Observa-se, ainda, um maior número de reformulações e substituições lexicais bem como inserções.
CONCLUSÕES:
Comparando-se os textos orais e escritos, é possível afirmar que as alunas conhecem os recursos próprios da linguagem oral, lançando mão deles na produção de seus textos escritos. Embora ainda ocorram, em um ou outro texto, termos próprios da oralidade, nenhuma produção se caracteriza pela transcrição do oral.
Cotejando todas as versões dos textos escritos, observamos que, à medida que há um avanço no processo de escolaridade, as operações textuais-discursivas são utilizadas numa gradação que permite detectar maior uso dos recursos da linguagem escrita. Verifica-se isto, sobretudo, nas retextualizações das alunas da 8ª série, em que realizam todas as operações, inclusive as denominadas especiais, ou seja, ocorre a recriação do texto.
Importa observar que os alunos somente avançam no processo de retextualização, se o professor, em sua prática, tiver clareza de que o conteúdo de Língua Portuguesa é a linguagem (oral e escrita) e a unidade básica para trabalhá-la é o texto do próprio aluno (produção oral e escrita) e textos modelares, de gêneros e tipos diversificados. Ainda, o conhecimento pelo professor das operações textuais-discursivas postas em jogo pelos alunos no processo de retextualização é de fundamental importância, tanto na valorização dos saberes discentes, quanto na orientação da prática docente na direção de procedimentos mais avançados, próprios da linguagem escrita.
Trabalho de Iniciação Científica
Palavras-chave:  retextualização; oralidade; escrita.

Anais da 56ª Reunião Anual da SBPC - Cuiabá, MT - Julho/2004