IMPRIMIRVOLTAR
G. Ciências Humanas - 1. Antropologia - 3. Antropologia das Populações Afro-Brasileiras
O DESPREPARO DO SISTEMA DE SAÚDE DA GRANDE CUIABÁ - MT E A LUTA DOS FALCÊMICOS POR SOBREVIVÊNCIA.
Reginaldo Silva de Araújo 1   (autor)   reginaldonilza@uol.com.br
Maria Inês da Silva Barbosa 2   (orientador)   Drª / professor.maria.barbosa@gmx.net
1. Depto de Antropologia - ICHS, Universidade Federal de Mato Grosso - UFMT
2. Saúde Coletiva - Universidade Federal de Mato Grosso - UFMT
INTRODUÇÃO:
Sendo considerada a doença genética mais comum no Brasil, a anemia falciforme, originária da África, teria se estendido para a península Arábica e Índia, e vindo para a América através do comércio de escravos negros trazidos do continente africano, distribuindo-se heterogeneamente pelo o Brasil. Em 1997, estimou-se que, para cada mil crianças nascidas vivas, uma teria anemia falciforme; dessas, 25% morreriam por falta de assistência médica antes de completar cinco anos de idade. Estudos mais detalhados sobre essa doença demonstram aspectos dramáticos, sob o ponto de vista social e humanístico, pois pesquisas revelam que quase 80% dos portadores da anemia falciforme não completam 30 anos de idade, enquanto que 88% das pessoas que morreram em decorrência da doença não tiveram o registro correto de sua causa de morte. A anemia falciforme é identificada principalmente em grupos pardos e pretos, ou seja, os afro-descendentes, também ocorrendo entre brancos, mas em números bem mais reduzido. A pesquisa aqui apresentada buscou levantar e entender como o sistema de saúde da Grande Cuiabá vem atendendo os portadores da anemia falciforme. Objetivou-se ainda, a conhecer como estes portadores falcêmicos estão se organizando e construindo reivindicações junto aos órgãos governamentais para o atendimento de demandas de saúde consideradas próprias a determinados grupos populacionais como é o caso dos cuidados preventivos e de atenção a saúde dos pacientes portadores da anemia falciforme.
METODOLOGIA:
Este trabalho teve como campo de pesquisa a região da Grande Cuiabá-MT., que compreende as cidades de Várzea Grande e a Capital Cuiabá. Juntas estas duas cidades aglutinam aproximadamente 800 mil habitantes. Tal pesquisa teve um cunho eminentemente qualitativo, onde os dados foram levantados a partir de depoimentos e entrevistas temáticas, estruturadas ou não, da observação de comportamentos, de discursos e conversas informais com os portadores da anemia falciforme e com os participantes e ativistas da ASFAMT - Associação dos Falcêmicos e Talassêmicos do Estado de Mato Grosso, presentes nos eventos e reuniões realizadas por esta organização. Buscou-se também examinar os documentos produzidos pelos membros da ASFAMT em suas reuniões internas (entre seus dirigentes e filiados) e nas reuniões externas com outras entidades representativas (movimento negro, sindicato, associação de bairros), ou com os representantes das instituições governamentais.
RESULTADOS:
Como resultados principais constatou-se, por um lado, um total despreparo de todo o sistema de saúde de Cuiabá e Várzea Grande para lidar com os portadores da anemia falciforme. Tal despreparo é percebido a partir dos depoimentos dos pais das crianças falcêmicas. Segundo eles, a maioria dos profissionais de saúde que atendem nos hospitais desta região desconhecem a doença e conseqüentemente receitam medicamentos e tratamentos que não resolvem e às vezes provocam maiores danos aos portadores da doença anemia falciforme. Observou-se, por outro lado, que através da organização dos portadores da anemia falciforme em uma associação, vem-se conseguindo importantes avanços para a assistência aos pacientes com essa forma de hemoglonopatia, através de palestras e debates com os órgãos governamentais responsáveis pelo gerenciamento dos setores de saúde que estariam encarregados dessa assistência para que o atendimento ocorresse pelo menos minimamente nos centros de saúde.
CONCLUSÕES:
Ressalta-se que, a pesquisa privilegiou metodologicamente a investigação etnográfica, visto que as categorias de doença encontram-se vinculadas às estruturas de significados histórica e culturalmente constituídas. Culturas diferentes, historicidades diferentes, como postulou Sahlins (1990), a história é ordenada culturalmente na prática, de acordo com esquemas de significado das coisas, sendo o inverso igualmente verdadeiro, pois os esquemas culturais são ordenados historicamente porque, em maior ou menor grau, os significados são reavaliados quando realizados na prática. Entendendo-se, assim como Minayo (1996), que o caminho para capturar a singularidade do adoecer humano seria, pois o de buscar apreender através do discurso histórico e cultural, as representações sociais da população em estudo, e que, as representações são como categorias do pensamento, da ação e do sentimento que expressam a realidade, explicam-na, justificando-a ou questionando-a. Expressam, desse modo, formas de conhecimentos elaborados e partilhados por grupos sociais. Com esta perspectiva foi possível, observar e conhecer as representações presentes nos discursos dos falcêmicos sobre o atendimento no sistema de saúde desta região. Pude perceber ainda, que a partir das reuniões e eventos promovidos pela a ASFAMT, os falcêmicos construíram uma forte identidade entre eles, e conseqüentemente através de mobilizações e pressões este grupo tem conseguido melhorias significativas no atendimento de saúde.
Palavras-chave:  Anemia Falciforme; Afro-Descendentes; Movimento Social.

Anais da 56ª Reunião Anual da SBPC - Cuiabá, MT - Julho/2004