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G. Ciências Humanas - 5. História - 9. História Social
FORMAÇÃO E REPRODUÇÃO DA RURALIDADE NA TERRA DA CONQUISTA: OS SUJEITOS E SEUS ESPAÇOS NA COMPOSIÇÃO DO AMBIENTE PANTANEIRO
Tiago Kramer de Oliveria 1   (autor)   kramerhis@ig.com.br
1. NERU/SOC/ICHS/UFMT
INTRODUÇÃO:
O Pantanal tem sido alvo de diversos olhares que vêm construindo sua imagem, dando destaque, sobretudo à "beleza natural", à diversidade biológica e à necessidade de políticas de proteção ao meio ambiente. Este estudo, desenvolvido no Núcleo de Estudos Rurais e Urbanos, vinculado ao PELD/UFMT, site 12: "Pantanal Norte: estudos integrados com vista à conservação da biodiversidade", pretende inserir o "ser humano" na discussão a respeito desta espacialidade, através de uma pesquisa histórica, reconstruindo elementos da ruralidade do Pantanal Norte. A colonização de Mato-Grosso deu-se no contexto da expansão da modernidade. Não de uma modernidade tendo como espelho a Inglaterra, o desenvolvimento industrial, o protestantismo ou qualquer idéia de modernidade abstrata, caricata. Fez parte do contexto real da modernidade, na opção Ibérica, hegemônica até o séc. XVII. Espaço conquistado e colonizado, o pantanal é um ambiente historicamente constituído na relação dialética dos homens entre si e com a natureza. Dos homens entre si pois envolvia diferentes sujeitos: portugueses, nobres ou não, paulistas com trajetórias e objetivos diversos, e várias nações ameríndias. Com a natureza pois a transformou, não só com a edificação de vilas e arraiais, mas também no campo, com casarões e palhoças, mangueiras, gado vacum e cavalar, agricultura, engenhos, na recomposição do meio rural através da luta diária pela satisfação das necessidades sociais e das ambições pessoais e da coroa, em uma região de fronteira do Império português.
METODOLOGIA:
Em dois anos que desenvolvemos esta pesquisa sempre primamos por um trabalho interdisciplinar envolvendo a história, a sociologia, a antropologia, a economia e também buscando dialogar com as ciências da natureza. O trabalho etnográfico, em comunidades de camponeses e ribeirinhos no Pantanal Norte, com pesquisa de campo, realização de entrevistas, elaboração de croquis, participação em eventos significativos para estas comunidades, por um lado, e por outro uma pesquisa bibliográfica e documental, permitem-nos avançar cada vez mais na compreensão deste modo de vida, assim como perceber os elementos constitutivos, as continuidades e descontinuidades da reprodução histórica destes sujeitos. Continuidades de práticas sociais são importantes indícios para a reconstrução do modo de vida desta população e no entendimento e preenchimento das lacunas da documentação.
RESULTADOS:
Domínio espanhol desde os XVI, só com as descobertas das minas do Cuiabá pelos paulistas nos XVIII que se efetivara a colonização portuguesa na região. Quando são descobertas as minas do Cuiabá, em 1719, o regime ibérico enfrentava uma crise delicada que ameaçava profundamente seus domínios. Já na primeira metade do séc. XVIII o meio rural de Mato-Grosso tinha uma população bastante diversa, se territorializando principalmente as margens dos rios. A criação de gado e a roça tinham como objetivo, além de garantir a subsistência, prover um mercado interno bastante modesto, tendo como referência a demografia de Mato Grosso. Se no rio Cuiabá-Abaixo a população ribeirinha no final do século XVIII era relativamente densa, no entanto, o adentramento aos "sertões", entre o Rio Cuiabá e São Lourenço, teve na segunda metade do séc. XVIII até meados do XIX o período de aceleração da conquista, invadindo o território dos bororos, índios caçadores e coletores que só foram "pacificados" na segunda metade do séc. XIX. A concessão das sesmarias e a ocupação do espaço garantiram o alargamento das fronteiras do Império luso. As grandes quantidades de terras concedidas na região pantaneira tinham sua extensão relativamente diminuída pelo alagamento periódico de grande parte da posse. Ao contrário do que estabelece grande parte da historiografia, as terras de sesmarias não deram origem somente a latifúndios, mas também se constituíram em terras de usufruto comum, com regras de acesso ligado a relações de parentesco, inseridas em uma lógica econômica com códigos costumeiros bem definidos.
CONCLUSÕES:
Nesta "economia moral", religião, política, economia se interligam nos caminhos da legitimidade das práticas sociais. A relação deste homem com o meio ambiente se modificou, não só nas últimas décadas, mas também antes, pois houve importantes descontinuidades ainda no séc. XIX e nas primeiras décadas do séc. XX, no entanto permanece uma relação bastante estreita com a natureza, seus ritmos, as luas, os ventos e etc. O significado de termos como "muxirum", "condomínios", "sesmaria", "patrimônio", tão presentes nos relatos dos moradores, principalmente os mais idosos, nos permitem perceber, juntamente com as evidências documentais elementos do modus operandi da formação do meio agrário em Mato-Grosso, desnaturalizando visões pré-concebidas e dando luz à diversidade desta sociedade. A região denominada hoje de pantanal não é de forma alguma homogenia socialmente, mas sim plural, desigual. Fazendeiros, agregados, vaqueiros, camaradas, ribeirinhos, camponeses, ameríndios, negros, "brancos", mestiços, homens e mulheres, diferentes culturas e trajetórias. No entanto não podemos ver a ruralidade pantaneira apenas como uma realidade completamente sui generis, mas sim uma combinação sui generis de elementos de uma sociedade rural brasileira. Características que compõe o modo de vida dos sertanejos, nos "interiores" de estados como São Paulo, Minas Gerais e Goiás.
Instituição de fomento: CNPQ
Trabalho de Iniciação Científica
Palavras-chave:  pantanal; colonização portuguesa; economia moral.

Anais da 56ª Reunião Anual da SBPC - Cuiabá, MT - Julho/2004