IMPRIMIRVOLTAR
G. Ciências Humanas - 5. História - 8. História Regional do Brasil
O MARANHENSE ENTRE PRETO VELHO & GONÇALVES DIAS
Antonio Evaldo Almeida Barros 2   (autor)   eusouevaldo@yahoo.com.br
Sérgio Figueiredo Ferretti 1   (orientador)   Prof. Dr. / ferretti@elo.com.br
Viviane de Oliveira Barbosa 2   (colaborador)   
1. Depto. de Antropologia e Sociologia, Universidade Federal do Maranhão - UFMA
2. Depto. de História, Universidade Federal do Maranhão - UFMA
INTRODUÇÃO:
Cultura popular, festas e mitos são elementos constantemente presentes na história das sociedades humanas. A reatualização do mito da Atenas Brasileira e perseguições a terreiros e outras manifestações da cultura popular são dois fenômenos presentes na História do Maranhão. É fato que tais fenômenos podem constituir capítulos à parte na história do Estado. Contudo, temos notado que ambos ocorrem concomitantemente em meados do século XX (1945-1965). Nesse sentido, tentar perceber suas formas de contato faz-se necessário, o que torna tal período, em particular, carecedor de uma análise mais aprofundada. Diante disso, partimos da hipótese de que a tentativa de compreensão das relações - embates, (des)encontros, conflitos, contatos - entre a reatualização da Atenas Brasileira (mito) e perseguições a terreiros e suas festas (manifestações da cultura popular), nos possibilitará representar aquele universo significacional em relação ao conjunto de representações identitárias do maranhense, notando como interagem com os supostos legados de "negros", "brancos" e "índios" à sua sociedade. As festas e os mitos constituem elemento basilar para se compreender o simbolismo e a mentalidade popular. Ora, se tudo é histórico, o próprio modo de festejar, as atualizações dos mitos e as manifestações de cultura popular têm História, sendo assim, merecem a nossa atenção.
METODOLOGIA:
Nossa abordagem tem se pretendido realizar a partir de diálogos e análises interdisciplinares, trabalhando com bibliografia da antropologia, da história e da sociologia, bem como da filosofia e da psicologia. Aplicamos o método de coleta de histórias de vida, conversando e entrevistando (entrevistas semi-estruturadas) pessoas remanescentes do período em foco, registrando tais diálogos em diário de campo e/ou gravador, fazendo uso, assim, da pesquisa oral, escutando a tradição viva, uma vez que entendemos que cada pessoa é como uma maquete de sua sociedade e de seu tempo. Também procuramos entrevistar e conversar com alguns historiadores e com antropólogos que desenvolveram trabalhos em relação direta ou indireta com o tema de nossa pesquisa. A pesquisa arquivística levada a efeito na cidade de São Luís foi essencial: pesquisa em arquivos públicos (Biblioteca Pública Benedito Leite e Arquivo Público do Estado do Maranhão), bem como na biblioteca da Academia Maranhense de Letras e do Seminário Santo Antonio. Foram, também, basilares as reuniões do grupo de pesquisa (GPMINA - www.ufma.br/canais/gpmina/index.hpm), bem como as conversas e discussões com o professor orientador a partir das quais o (re)direcionamento da pesquisa foi constantemente realizado. Buscamos não esquecer que toda fonte de pesquisa é produto social, refletindo posição de grupo/classe social, mostrando uma visão de mundo específica, muito longe de definir uma última palavra sobre dada questão.
RESULTADOS:
As fontes escritas denunciam que o Maranhão vivia um momento de "Decadência" de seu passado de "glórias imortais" (ideologia da decadência do Maranhão). Membros da imprensa escrita, do clero e do meio intelectual "convocaram" o Estado para "Ressurgir" resgatando suas "verdadeiras tradições". A nosso ver, tal combate à decadência maranhense encena pelo menos dois contextos interdependentes: a reatulização da Atenas Brasileira e perseguições a terreiros onde eram praticadas "macumba", "pajelança" e "feitiçaria". A Academia Maranhense de Letras e os terreiros cristalizam dois pólos representativos daquele contexto sendo (aparentemente) antitéticos. A Academia: espaço da Civilização, da Cultura, da herança européia, que seria o "legado branco" daquela sociedade. Os terreiros: espaços da Ignorância, o "legado negro", devendo ser extirpados, daí, as perseguições. Adeptos da religião afro, remanescentes daquele período, o classificam como no tempo em que a "brincadeira" era feita no "oculto", "era tudo só nas palmas e nos maracás", sem zoada. Contudo, ambiguamente, aqueles dois espaços se aproximavam enquanto locais de festas. Nos terreiros realizavam-se festas populares, que não somente se diferenciavam da proposta da cultura oficial como dela se distanciavam, sendo "festas subversivas". Na Academia "festas brancas", "alucinações simbólicas": momentos em que o sonho da Atenas Brasileira (re)significado pelos contemporâneos ganhava naquelas celebrações contornos simbólicos nítidos.
CONCLUSÕES:
A sociedade maranhense em meados do século XX nas suas festas, mitos e manifestações da cultura popular encena processos de (re)construção de sua(s) identidade(s), destacando-se uma visão de mundo extremamente ambígua. As fontes escritas e orais constantemente entram em desacordo. Se de um lado, as fontes escritas tratam as manifestações dos terreiros como espaços de Ignorância e, mesmo, Diabolicidade, a tradição viva a elas se refere como espaços de Sabedoria e Divindade. Certamente, configura-se ainda algo fundamental: a Academia como "lócus" privilegiado das letras, da tradição escrita e os Terreiros da Oralidade, numa direção em que a legitimação das letras implica a negação das palavras, relegando-as a um plano inferior, do esquecido, que não pode atualizar uma tradição verdadeira. Sendo assim, a extinção dos terreiros (ou ao menos seu afastamento da dita Civilização) e a revificação da Atenas Brasileira retirariam o Maranhão de "uma escala descendente de progresso e ascendente de barbaria" evitando que o mesmo viesse a "sumir na História". Enfim, os projetos configurados nas imagens da Academia e dos Terreiros conflitavam. Se, de um lado, apresentavam-se como espaços antitéticos que se negavam mutuamente, em alguns aspectos constituiam-se como o avesso e o direito da mesma realidade. Gonçalves Dias (um imortal das letras) e Preto Velho (um imortal da oralidade) em terras do Maranhão, em meados do século XX, dialogavam na construção da identidade do maranhense.
Instituição de fomento: PIBIC/CNPQ
Trabalho de Iniciação Científica
Palavras-chave:  História do Maranhão (1945-1965); Festas; Mitos.

Anais da 56ª Reunião Anual da SBPC - Cuiabá, MT - Julho/2004