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G. Ciências Humanas - 7. Educação - 5. Educação de Adultos | ||
GÊNERO E EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: TRAJETÓRIA ESCOLAR DE MULHERES DE CLASSES POPULARES | ||
Cristiane Souza de Menezes 1, 2 (crisme@terra.com.br) e José Batista Neto 3, 4 | ||
(1. Profa. da Pref. Municipal de Olinda e da Rede Estadual de Pernambuco; 2. Especialista em Fundamentos da EJA pela UFPE; 3. Depto. de Métodos e Técnicas de Ensino; 4. Prof. Dr. da Pós-Grad. em Educação da Universidade Federal de Pernambuco/UFPE-Orientador) | ||
INTRODUÇÃO:
Muitas foram as barreiras que as mulheres enfrentaram ao longo da história para conquistar o acesso à educação escolar. No entanto, mesmo com os diversos e significativos avanços nessa direção e dos novos papéis por elas assumidos nas últimas décadas, uma significativa parcela da população feminina, principalmente aquela proveniente das classes populares, ainda não tem acesso ou é obrigada a precocemente se evadir da escola. Partindo da hipótese que o gênero (aqui entendido como as representações de feminilidade e masculinidade social e culturalmente construídas) tem contribuído para o afastamento das mulheres do ensino regular e posterior ingresso destas na Educação de Jovens e Adultos (EJA), o presente trabalho teve por objetivo central compreender como as relações de gênero têm interferido no processo de escolarização de alunas das turmas da EJA, modalidade de ensino oferecida aos que não tiveram acesso ou não concluíram seus estudos na idade própria. |
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METODOLOGIA:
O universo da pesquisa foi constituído por dezesseis mulheres, com faixa etária entre os 16 e os 51 anos, que freqüentaram no ano letivo 2003 duas turmas da 3ª fase da EJA de uma escola da rede estadual de ensino, situada na região metropolitana do Recife, Pernambuco. Os instrumentos metodológicos utilizados foram: a entrevista semi-estruturada e a análise documental, complementadas pelo questionário e a observação. Nas entrevistas, reconstituímos a história de vida de seis das mulheres participantes. A escolha dos sujeitos foi aleatória, dependendo da disponibilidade de tempo e do interesse das alunas em contribuir com a investigação. Os depoimentos foram gravados e transcritos logo após a realização dos mesmos para garantir maior fidelidade. Procuramos também registrar mensagens não-verbais e as condições nas quais as entrevistas ocorreram. Na análise documental, realizamos o estudo das Atas do Conselho de Classe do turno noturno dos anos 1999 a 2003 da escola onde se realizou a pesquisa. Para dar maior consistência aos dados obtidos, coletamos informações do Censo Escolar do período supracitado sobre matrícula e evasão na EJA junto à Secretaria de Educação do Estado e à GERE Metropolitana Norte. O questionário foi utilizado para nos auxiliar a traçar o perfil do universo estudado. Quanto à observação, esta se deu no cotidiano do nosso exercício docente junto às turmas as quais nos referimos. |
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RESULTADOS:
Constatamos que o cotidiano das famílias de origem das alunas era marcado pela subordinação das mulheres aos homens e pela cristalização dos papéis tradicionalmente previstos para cada gênero. Esse aspecto é bastante significativo quando verificamos que o início da vida escolar só ocorreu entre os 9 e os 13 anos de idade (66,6%), e que os motivos alegados para isso foram: a necessidade de ajudar a mãe na criação dos irmãos e nos cuidados com a casa; os preconceitos paternos sobre a capacidade intelectual feminina; a pouca importância que os genitores atribuíam à educação, e a necessidade de trabalhar durante a infância. Além disso, para 50% dos sujeitos, a trajetória escolar foi marcada por interrupções provocadas por problemas familiares, pelo trabalho infantil como empregada doméstica e pelo casamento na adolescência. Este é ainda apontado como motivo para o afastamento do trabalho (por imposição do marido ou pelas atribuições da maternidade) de 66,6% das alunas que exerciam atividade remunerada. Para metade das entrevistadas, sua atual participação na EJA não é a primeira tentativa de retomar os estudos na idade adulta. Contudo também essa experiência foi interrompida por causa do cônjuge e os cuidados com os filhos. Hoje essas mulheres voltam a buscar a escola motivadas pela necessidade de capacitar-se para o mercado de trabalho, atualizar-se para ensinar as tarefas escolares aos filhos e pelo desejo de romper com o isolamento e a monotonia doméstica. |
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CONCLUSÕES:
A análise dos dados nos permite concluir que as relações de gênero têm interferido na trajetória escolar de alunas da EJA. Neste sentido, observamos que elementos ligados ao gênero contribuíram para a escolarização tardia e conturbada desses sujeitos. Além disso, acreditamos que a posição secundária que essas mulheres viveram na família desde a infância e os preconceitos sobre sua inteligência contribuíram para limitar suas aspirações. Assim, o casamento passa a ser o seu projeto de vida. Isso se confirma quando as alunas abandonam a escola para casar-se. Quando anos depois decidem retomar os estudos são frustradas pelas cobranças da vida conjugal. No entanto, cremos que essa situação só é possível na medida em que as mesmas sentem-se razoavelmente confortáveis em seus papéis, visto que os gêneros definem-se mutuamente através da assunção, rejeição ou transformação do lugar que lhe é proposto. Assim é que, quando não mais satisfeitas com a ordem familiar a que estavam submetidas, essas alunas decidem, no presente, voltar à escola desafiando, inclusive, a resistência de alguns maridos. A conquista desse novo espaço de socialização, a aquisição de novas competências e a preparação para trabalhar fora do lar, aliadas a outros fatores, como a percepção positiva do seu grupo de pertença, têm contribuído para elevar a auto-estima dessas mulheres e para o seu empoderamento, favorecendo, assim a sua permanência na escola. |
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Palavras-chave: Gênero; Educação de Jovens e Adultos; Escolarização de Mulheres. | ||
Anais da 57ª Reunião Anual da SBPC - Fortaleza, CE - Julho/2005 |