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G. Ciências Humanas - 7. Educação - 14. Ensino Superior
A RELAÇÃO ENTRE A CONCEPÇÃO EPISTEMOLÓGICA DOCENTE E A PRÁTICA PEDAGÓGICA NO ENSINO SUPERIOR
Lígia Pacheco Lins dos Santos 1 (ligiap@uol.com.br)
(1. Depto de Educação, Faculdade Frassinete do Recife - FAFIRE)
INTRODUÇÃO:
Nos dias atuais, a investigação sobre a didática do ensino superior tem na relação ciência/prática pedagógica um de seus mais significativos objetos. Neste sentido, a finalidade maior deste trabalho foi verificar como os professores se situam epistemologicamente na relação entre o Paradigma Dominante, subsidiado pela ciência moderna que reduz a totalidade de um fenômeno complexo em suas partes constituintes, observáveis e mensuráveis sem a interferência de valores (Capra 2002), e o Paradigma Emergente fundamentado na ciência pós-moderna que admite a não neutralidade, reconhece a intencionalidade e concebe a ciência como um ato humano, historicamente situado (Santos, 1997). Assim, objetiva-se detectar o confronto entre o discurso docente e os pressupostos epistemológicos que orientam a sua prática e situar tal confronto, subsidiados pela pesquisa de Cunha (1998), em uma didática mais conservadora pautada pelo paradigma dominante, onde o professor é visto como a principal fonte de informação, de um conhecimento descontextualizado, pronto, fragmentado e disciplinado, ou em uma didática inovadora, emergente, que valoriza o conhecimento que o aluno traz para a re-significação de conceitos de uma realidade complexa e vária. Conhecimento visto como produção social, inacabado, contextualizado, construído em relação dialógica. E por fim, tem-se como objetivo a reflexão sobre a práxis, a fim de que possamos re-significar a ação didática em prol de uma educação de maior qualidade.
METODOLOGIA:
Nossa investigação iniciou-se com um levantamento bibliográfico sobre os fundamentos da ciência moderna e pós-moderna (Santos, 1997; Morin, 2001; Capra, 2002) e sua relação com os pressupostos epistemológicos que fundamentam a ação didática do Paradigma Dominante e do Paradigma Emergente (Cunha, 1998; Pimenta & Anastasiou, 2002). Buscou-se, então, a relação entre a ciência e a fundamentação da ação didática, traçando categorias para serem observadas em campo: concepção de ensino, aprendizagem e conhecimento; o diálogo entre as áreas de saber (interdisciplinaridade); relação teoria e prática; relação professor-aluno. Foram observados seis professores de duas instituições de Ensino Superior da cidade do Recife por 8 horas/aula cada, subsidiados de uma metodologia teórico-empírica pautada por uma abordagem qualitativa de pesquisa. Como instrumento para a observação utilizou-se uma ficha contendo as categorias definidas anteriormente como pontos norteadores. Além disso, foram realizadas entrevistas individuais e a análise do plano de ensino de cada docente, a fim de contrapor o discurso com a prática pedagógica observada. E, por fim, partiu-se para a análise dos dados, com o intuito de melhor compreender a relação entre concepção epistemológica docente e a sua prática pedagógica, situando os docentes nos paradigmas apresentados.
RESULTADOS:
A partir da análise dos dados percebeu-se que no discurso os professores aproximam-se mais do paradigma emergente, enquanto que na prática há ainda muitos resquícios do paradigma dominante. 92% dos docentes entrevistados enfocam o conhecimento a partir da localização histórica de sua produção e o percebem como provisório e relativo. Porém, na prática, 45% deles não contextualizaram o conhecimento, e nem deixaram clara a relatividade do mesmo. 98% dos docentes dizem valorizar a construção do conhecimento, porém em sala de aula 32% utilizaram-se sempre da mesma prática, aula expositiva, sem a interferência do aluno, 47% transitaram entre aulas expositivas e aulas com atividades interativas e 21% utilizaram-se da problematização como recurso didático valorizando a construção do conhecimento discente, bem como a curiosidade, a dúvida e a incerteza. 88% concebem o conhecimento de forma interdisciplinar, sendo que na prática apenas 41% fizeram relação de sua área de saber com outras áreas. 75% valorizam a relação teoria e prática, porém na ação didática apenas 33% confrontaram com a realidade do aluno e com a prática, e apenas 15% utilizaram a pesquisa como instrumento de ensino. E por fim, observou-se que a maioria dos docentes entrevistados valorizava uma relação dialógica com o docente, porém, na prática encontramos ainda relações de autoritarismo, de ameaças de poder, de valorização da reprodução do conhecimento.
CONCLUSÕES:
Percebeu-se um discurso inovador e uma prática ainda conservadora entre os docentes participantes. Vale ressaltar que “a maioria dos professores da educação superior teve nos seus cursos de graduação uma formação pautada pela visão moderna do conhecimento. (...) Nosso modo de ver o mundo está impregnado dessa visão da ciência, assim como nossas salas de aula, marcando nossas relações com o conhecimento e com os alunos” (Pimenta & Anastasiou, 2002, p. 219). Porém, tal pesquisa nos remete a algumas reflexões: Vivemos em crise de percepção que deriva do fato de estarmos tentando aplicar os conceitos de uma visão mecanicista a uma realidade que já não pode mais ser entendida em função desses conceitos (Capra, 2002). Existe uma inadequação cada vez maior entre os nossos conhecimentos partidos e compartimentalizados das disciplinas e as realidades ou problemas cada vez mais polidisciplinares, transversais, multidimensionais, globais (Morin, 2001). Assim, pensar a realidade e agir sobre ela sob uma nova perspectiva tornam-se urgentes. Repensemos, pois, o diálogo entre o discurso e a prática, se quisermos “contribuir com o processo de humanização de docentes e discentes numa perspectiva de inserção social crítica e transformadora” (Pimenta & Anastasiou, 2002, p. 81) e se acreditamos que a ciência e o conhecimento, enquanto síntese provisória sobre o mundo, só terão sentido na medida que possibilitarem a compreensão e a transformação desse mesmo mundo e de nós mesmos (Morin, 2001).
Palavras-chave:  Concepção Epistemológica; Prática Pedagógica no Ensino Superior; Paradigma Dominante e Emergente.
Anais da 57ª Reunião Anual da SBPC - Fortaleza, CE - Julho/2005