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G. Ciências Humanas - 7. Educação - 15. Formação de Professores (Inicial e Contínua)
PARA SER PROFESSOR: DOCÊNCIA, MEMÓRIA E PSICANÁLISE
Maria Augusta Rondas Speller 1 (gurondas@uol.com.br) e Daniele Fátima de Figueiredo 2
(1. Departamento de Psicologia, Instituto de Educação, Universidade Federal de Mato Grosso - UFMT; 2. Instituto de Educação, Universidade Federal de Mato Grosso - UFMT)
INTRODUÇÃO:
O trabalho insere-se no campo da formação de professores que tem papel de extrema relevância na melhoria da educação fundamental, indispensável para o desenvolvimento social. As mudanças sociais trazem novas exigências dos profissionais da educação e, portanto, de sua formação que tem sido questionada em vários âmbitos. Nos últimos anos, têm emergido propostas de utilização de histórias de vida, relatos autobiográficos e literatura como estratégias de investigação e de formação de professores. Considera-se a leitura de obras literárias como o que também nos forma, constitui, coloca em questão, experiência pela qual somos afetados, produzindo efeitos na subjetividade. A teoria psicanalítica contribui para se pensar o alcance desse tipo de trabalho que possibilita a criação de novos sentidos para o que está cristalizado por falta de elaboração psíquica das experiências de vida. O trabalho objetivou que, com o apoio da teoria psicanalítica e leituras de obras literárias relevantes estudadas em um módulo do curso de Pedagogia, os sujeitos recordassem e elaborassem suas histórias de vida, escolar ou não, para que percebessem as possíveis ressonâncias, na prática profissional, das experiências vividas, problematizando e dando novos sentidos a vivências e considerações subjetivas sobre eles mesmos, a profissão, a escola, a família, conscientizando-se de como o professor, a partir de sua própria subjetividade, pode colaborar ou não com a inserção da criança na escola.
METODOLOGIA:
A pesquisa, qualitativa, trabalhou com fragmentos de histórias de vida e escolar e textos literários para incentivar a escrita autobiográfica, tendo como sujeitos, todos mulheres, alunas de duas turmas da disciplina Psicologia da Educação de um curso de Pedagogia. Na primeira turma havia 35 alunas, na segunda 39, nem todas professoras. Além da leitura de um texto, elaborado pela professora-pesquisadora, sobre psicanálise e suas contribuições para se pensar a educação e a subjetividade, os outros textos, literários, trabalhados foram: “Infância”, de Ramos, “Piá não sofre? Sofre!”, de Andrade, “Memórias de menina”, de Sieiro Fernandes, “Mulheres na sala de aula”, de Lopes Louro, “Infância de papel e tinta”, de Lajolo, “A cidade de menores: uma utopia dos anos 30”, de Corrêa, além de vários artigos de jornais problematizando a educação e a subjetividade, através de temas contemporâneos de relevância social. Várias questões foram trabalhadas, de acordo com o conteúdo que as oportunizasse. Incentivou-se que fizessem associações entre suas experiências na infância e na escola e o que fazem e pensam como professoras ou alunas de Pedagogia, como mulheres e mães, suas escolhas e concepções de infância. A pesquisa teve continuidade com 9 professoras, tomando-se depoimentos mais prolongados. Recolhidos e transcritos os depoimentos, analisou-se, no material, o recorrente na produção das professoras para posterior aprofundamento em entrevistas abertas ou semi-estruturadas.
RESULTADOS:
Os resultados indicam que este tipo de trabalho afeta-as, ajudando-as a vislumbrarem novas perspectivas mais criativas e menos queixosas, uma vez que se impliquem com o que lhes ocorre. Afirmaram que o conteúdo e as atividades alteraram a maneira como consideravam a si e aos outros, impressionando-as o recordar coisas esquecidas do passado, associando-as com o que pensam e fazem, questionando suas posições subjetivas profissionais ou pessoais. A pesquisa permitiu traçar o perfil das alunas: muitas escolheram o curso por ser o de mais fácil ingresso à universidade e como possibilidade de identidade e até mesmo ascensão social; relacionam docência com maternidade, idealizando-as. Algumas sempre quiseram ser professoras, pelo exemplo de professoras queridas, de alguns familiares ou pelo desejo dos pais. Há indecisas em seguir a carreira pela desvalorização da profissão, por não se acharem com talento ou por implicar demasiada responsabilidade. Muitas são filhas de migrantes, de poucos recursos econômicos. O incentivo para o estudo muitas vezes veio por parte de pais que não tiveram esta oportunidade. Algumas foram criadas só pelas mães, situação que reproduzem. As que já trabalham queixam-se de cursos de capacitação que de nada servem para apoiá-las na escola, da falta de preparo para a profissão, de diretores onipotentes e narcisistas. Há muito moralismo e psicologismo nos julgamentos das famílias dos alunos, não estando claras a função educativa da escola e a da família.
CONCLUSÕES:
O objetivo principal do trabalho foi alcançado, reforçando a necessidade e pertinência de trabalhos como este em disciplinas de Psicologia em cursos de Pedagogia. Dentro da educação, a formação de professores é prioritária. Tal formação passa por diversas áreas das Ciências Humanas, mas acreditamos, e os resultados do trabalho demonstram, que é de suma importância a contribuição que a psicanálise pode oferecer aos professores e aspirantes a sê-lo para pensarem a profissão, o fracasso escolar, o papel do professor na exclusão do aluno, a subjetividade contemporânea. A pesquisa indica a necessidade de investigar, junto aos alunos, as motivações, as expectativas, os determinantes da escolha profissional. No caso de ainda não exercerem a profissão, se pretendem exercê-la ou não e por que, e, no caso das já professoras, se exercitam a profissão ou não e por quais motivos. Espera-se que trabalhos como este incentivem nos professores o desejo de criar, na escola, espaço e tempo para experiências similares. O professor aí pesquisaria, escutando, escrevendo e dando um lugar na História para as histórias próprias, as da escola, as de seus alunos e pais. A experiência de anos da psicanálise confirma que, sendo o humano ser da linguagem, o narrar-se a si mesmo e o reconhecimento e valorização da filiação, das raízes, enfim, da história de cada um, é de fundamental relevância para o psiquismo humano, para o autorizar-se transmitir, para a estruturação da identidade, para a subjetivação.
Instituição de fomento: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
Trabalho de Iniciação Científica
Palavras-chave:  educação; psicanálise; história de vida.
Anais da 57ª Reunião Anual da SBPC - Fortaleza, CE - Julho/2005