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G. Ciências Humanas - 8. Psicologia - 6. Psicologia do Desenvolvimento Humano | ||
CONTAR HISTÓRIAS: UMA PROPOSTA DE AVALIAÇÃO ASSISTIDA DA NARRATIVA EM CRIANÇAS COM CÂNCER | ||
Alessandra Brunoro Motta 2 (abmotta.vix@terra.com.br), Sônia Regina Fiorim Enumo 1, 2, Maria Margarida Pereira Rodrigues 1, 2, Lidiane Leite 3, Elissa Orlandi 2, Camila Carlos Maia 3 e Camila Gimenez Rodrigues 3 | ||
(1. Depto. de Psicologia Social e do Desenvolvimento, Universidade Federal do Espírito Santo - UFES; 2. Programa de Pós-Graduação em Psicologia, Universidade Federal do Espírito Santo; 3. Curso de Psicologia, Universidade Federal do Espírito Santo - UFES) | ||
INTRODUÇÃO:
Os aspectos psicossociais do câncer infantil têm recebido ênfase nos estudos da área, principalmente pela constatação do aumento da sobrevida e da possibilidade de cura. Entre as necessidades que demandam atenção, destaca-se o desenvolvimento de habilidades cognitivas. Neste caso, aspectos como baixo desempenho escolar, dificuldades de aprendizagem e baixa freqüência às aulas justificam a necessidade de intervenção visando à prevenção primária desses problemas. Tal intervenção deve ser precedida de uma avaliação psicológica de aspectos cognitivos e emocionais de crianças com doenças crônicas, como o câncer. Diante do papel central da linguagem no desenvolvimento de habilidades cognitivas e sociais da criança, é relevante que ela seja inserida nesse processo de avaliação. Como forma de acessar o comportamento lingüístico infantil, as narrativas têm sido empregadas em processos de avaliação da linguagem, classificadas no conjunto dos testes não padronizados. Nesse sentido, a avaliação com procedimento assistido, em que o avaliador auxilia a criança após uma fase sem ajuda, testando sem auxílio novamente ao final, tem se mostrado apropriada. Assim, esta pesquisa teve como objetivo geral investigar as possibilidades do uso do modelo de avaliação assistida de habilidades lingüísticas em crianças com câncer, em idade pré-escolar. Especificamente, pretendeu-se comparar o desempenho na narrativa de crianças com câncer e crianças sem câncer, segundo a avaliação assistida da narrativa. |
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METODOLOGIA:
Participaram 18 crianças (5 a 7 anos, média de 5 anos e 9 meses), de ambos os sexos, 8 com câncer (Grupo 1-G1: 5 meninas e 3 meninos), inscritas no Serviço de Onco-hematologia de um Hospital Infantil, em Vitória/ES e 10 sem câncer (Grupo 2-G2: metade de cada sexo). Ambos os grupos foram submetidos à aplicação individualizada e gravada do Instrumento de Avaliação e Intervenção Assistida da Narrativa, traduzido do inglês. Este instrumento permite avaliar, antes e após a mediação do examinador, os principais aspectos da narração de histórias: seus componentes (cenário, personagens, ordem temporal e relações causais); idéias e linguagem (complexidade de idéias, de vocabulário, gramatical, diálogo e criatividade) e estrutura do episódio (básico, completo e múltiplo). O instrumento avalia também a “produtividade” da história: quantidade de palavras; quantidade de unidade-C (Clause-unit , oração principal e suas modificações); unidade-MLC (Mean Length Clause-unit, quantidade de informação léxica e gramatical); Orações e; Orações/unidade-C (complexidade da sentença). Este instrumento inclui um manual de aplicação, 2 livros de história sem palavras, com desenhos coloridos: “Dois amigos” e “O pássaro e seu anel”, e um protocolo de registro das histórias contadas. Utilizou-se também um roteiro de entrevista com 6 questões abertas sobre a adequação gráfica do desenho e a capacidade de gerar interesse na criança, aplicado após a narrativa de cada história. |
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RESULTADOS:
Os dados sobre a “produtividade” da narrativa indicam que, no geral, os dois grupos apresentaram uma melhora na história 2. A análise comparativa da produtividade das narrativas dos grupos, por meio de estatística não-paramétrica (Teste de Mann-Whitney), demonstrou que G1 (câncer) foi significativamente superior (p ≤0,05) na quantidade de Unidades-C (oração principal e suas modificações). Embora esse índice de significância indique uma melhora na produção de orações principais da narrativa, não é possível afirmar que G1 foi mais eficiente, pois essa mudança não foi acompanhada por uma melhora significativa nos demais indicadores da produtividade (quantidade de palavras, de informação léxica e gramatical, orações e complexidade da sentença). Na comparação intragrupo das narrativas das histórias 1 e 2, por meio de estatística não-paramétrica (Teste de Wilcoxon), verificou-se uma melhora significativa da produtividade (p ≤0,05) apenas para G2 (sem câncer), em todos os aspectos avaliados. Este dado indica a melhora da eficiência lingüística das crianças sem câncer, a qual pode ser atribuída ao processo de mediação. Analisando os componentes/processos da narrativa das histórias 1 e 2, verificou-se, para ambos os grupos, uma melhora (G1: 37,5%; G2: 65,5%) ou ausência de alteração (G1: 43%; G2: 23,3%). Todas as crianças relataram gostar das histórias e consideraram os desenhos bonitos, principalmente por serem coloridos (G1: 55,5%; G2: 66,7%). |
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CONCLUSÕES:
Frente à melhora dos componentes da narrativa ocorrida em ambos os grupos, pode-se considerar que o suporte ao desenvolvimento de habilidades lingüísticas oferecido pelo instrumento mostrou-se útil, explicitando as possibilidades do uso da avaliação assistida na área da linguagem. Comparando os grupos, levanta-se a questão sobre o alto percentual de componentes da narrativa que não se alteraram da história 1 para a 2 entre as crianças do G1 (com câncer). O contexto da doença crônica, exigindo, entre outras coisas, o afastamento escolar, explicaria em parte esse dado, na medida em que é no cotidiano escolar que a criança lida com conteúdos relativos à compreensão e produção de narrativas, participando de atividades com este fim. Destaca-se que a origem norte-americana do instrumento pareceu não comprometer a aplicação e análise do teste, uma vez que, após a tradução e adaptação às estruturas gramaticais da língua portuguesa, foi possível efetivar a sua aplicação. O caráter lúdico do material - livros para contar histórias - mostrou ser capaz de envolver e motivar a participação da criança na pesquisa. De um modo geral, o instrumento mostrou-se adequado para a identificação do processo de mudança na construção de narrativas, possibilitando verificar mudanças na produção de histórias pelas crianças pré-escolares sem doença crônica, assim como para crianças com câncer, cujo processo de tratamento pode trazer efeitos relativos ao desenvolvimento cognitivo e desempenho escolar. |
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Instituição de fomento: CNPq | ||
Trabalho de Iniciação Científica | ||
Palavras-chave: Avaliação assistida; Narrativa Infantil; Câncer Infantil. | ||
Anais da 57ª Reunião Anual da SBPC - Fortaleza, CE - Julho/2005 |