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F. Ciências Sociais Aplicadas - 4. Direito - 9. Direito Penal | ||
A TUTELA PENAL DAQUELE QUE ESTÁ NASCENDO | ||
Vanessa Elisa Jacob Ferreira 1 (vanessa@htj.adv.br), Suzana Santi Cremasco 1, Carolina Brognaro Poni Drummond de Alvarenga 1 e Carlos Augusto Canêdo Gonçalves da Silva 1 | ||
(1. Departamento de Direito Penal, Faculdade de Direito, UFMG) | ||
INTRODUÇÃO:
O ordenamento jurídico brasileiro tutela a vida humana desde a sua origem. No Direito Penal, a proteção da vida abrange dois tipos fundamentais de delito: o aborto e o homicídio. Não há, porém, qualquer dispositivo, no estatuto penal em vigor, que preveja expressamente a tutela da vida humana nascente. Nesse contexto, o presente trabalho teve por escopo a análise e discussão da seguinte proposição: é ou não típica a conduta que atenta contra a vida humana no lapso temporal compreendido entre o início do procedimento de trabalho de parto da mãe, com o rompimento da bolsa amniótica, e o total desprendimento do ser do álveo materno, com o início da respiração autônoma? A legislação em vigor é vaga e imprecisa; a matéria é controvertida na doutrina e na jurisprudência; a questão é tormentosa e são inúmeras as indagações que ela desperta, sobretudo na seara da responsabilidade penal. A realização de um estudo que abordasse os principais aspectos relacionados à questão, ainda que não a esgotasse, era indispensável para, ao menos, suscitar a sua discussão e despertar a atenção da comunidade para um problema cuja repercussão social é inegável num país em que o atendimento à parturiente é notadamente precário e que, até então, permanecia quase inexplorado. |
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METODOLOGIA:
O ponto de partida para a realização do trabalho foi a definição das três hipóteses que, inicialmente, poderiam ser apontadas como respostas para a proposição formulada: a) a conduta é típica e caracteriza-se como aborto, visto que aquele que está nascendo não possui vida extra-uterina, requisito indispensável para qualificá-lo como alguém e que se manifesta apenas a partir do instante em que o ser desprende-se do álveo materno e passa a respirar autonomamente; b) a conduta é típica, mas caracteriza-se como homicídio, porque a noção de alguém inserta no caput do art. 121 do Código Penal não se prende ao critério respiração, há muito superado como fator determinante da vida; c) a conduta é atípica, porquanto o ordenamento jurídico pátrio não contém norma expressa que tipifique como crime a destruição da vida daquele que está nascendo, sendo vendado ao intérprete fazê-lo, em razão do princípio da reserva legal, garantia fundamental prevista no art. 5º, XXXIX, da Constituição Federal. Em seguida, valendo-se do método hipotético-dedutivo, os pesquisadores procuraram analisar e sistematizar os fundamentos que inspiram cada uma dessas hipóteses, de forma a aferir os seus aspectos fundamentais, as possíveis incongruências que eventualmente poderiam advir da adoção de cada uma delas em face do ordenamento legal existente e, por conseguinte, qual delas melhor se coaduna com a sistemática jurídica em vigor. |
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RESULTADOS:
A eventual tipificação da prática delitiva como aborto (crime doloso contra a vida) foi afastada, já que uma vez iniciado o processo de parturição, com o rompimento da bolsa amniótica, não mais há que se considerar a ocorrência de aborto, visto que a vida intra-uterina (bem jurídico protegido por este tipo penal) já findou. Também não há de se cogitar classificá-la como atípica. Com efeito, não é possível haver um intervalo na vida do ser humano em que ele acha-se completamente desprotegido e desprovido de tutela penal, num ordenamento jurídico que tem na vida o seu bem de maior relevância e que a tutela desde a concepção. Pensar ser atípica a prática do ato lesivo à vida humana nascente seria ir de encontro a toda a ratio do sistema legal, à mens legis que o inspirou e ao caput do art. 121 do estatuto repressivo pátrio. A prática ofensiva à vida humana nascente deve ser classificada, portanto, como homicídio. Isso porque, muito embora a vida extra-uterina não tenha ainda principiado, a vida intra-uterina já está terminada; não se tratando mais de um nascituro (aquele que está por nascer), mas de um feto nascente (aquele que está nascendo), encontra-se já no limiar da vida social. E matá-lo não pode ser considerado de outra forma, senão como homicídio. |
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CONCLUSÕES:
Ao analisar e sistematizar as três soluções propostas para a questão da tutela penal da vida humana nascente, foi possível constatar que, na sistemática jurídica vigente, não há espaço para a ausência de tipificação e tampouco para a sua qualificação como aborto. Destarte, pode-se afirmar que embora o ordenamento jurídico não preveja expressamente que a conduta apta a violar a vida humana nascente seja tipificada como homicídio, porquanto o caput do art. 121 traz apenas a expressão matar alguém, o próprio ordenamento jurídico conta com mecanismos hábeis a propiciar uma leitura unívoca do seu texto, de modo a não haver discrepância entre uma previsão legal e outra e nem tampouco permitir que um interregno da vida do ser humano fique privado de proteção, amparo e tutela penal, o que conduziria, na prática, a um verdadeiro descalabro e a uma situação esdrúxula e insustentável. |
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Instituição de fomento: CNPq | ||
Trabalho de Iniciação Científica | ||
Palavras-chave: SER HUMANO NASCENTE; CONDUTA ATENTATÓRIA TUTELA PENAL; HOMICÍDIO ABORTO ATIPICIDADE. | ||
Anais da 57ª Reunião Anual da SBPC - Fortaleza, CE - Julho/2005 |