|
||
H. Artes, Letras e Lingüística - 4. Lingüística - 5. Teoria e Análise Lingüística | ||
LINGÜÍSTICA MATEMÁTICA, CIÊNCIA PILOTO DAS CIÊNCIAS HUMANAS: ANÁLISE INICIAL DA PROPOSTA DE CRIAÇÃO DE UM GRUPO DE LINGÜÍSTICA NA UNICAMP | ||
Ana Cláudia Fernandes Ferreira 1 (hannaclau@yahoo.com.br) | ||
(1. Instituto de Estudos da Linguagem, Universidade Estadual de Campinas - Unicamp) | ||
INTRODUÇÃO:
Este trabalho realizou uma análise inicial dos processos de designação da palavra lingüística na “Proposta de Criação do Grupo de Lingüística no Instituto de Ciências Humanas”. Proposta apresentada à Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) em 1968 e aprovada por unanimidade pelo Conselho Diretor desta universidade, em outubro do mesmo ano. O objetivo desta análise é trazer uma compreensão sobre as condições materiais específicas que possibilitaram uma certa configuração de sentidos para a lingüística nesta proposta. Este trabalho, inscrito no programa interinstitucional História das Idéias Lingüísticas no Brasil - HIL (Projeto Capes/Cofecub desenvolvido no âmbito da Unicamp, USP e ENS-Lyon), faz parte de minha pesquisa de doutorado, que objetiva estudar os sentidos de lingüística no processo de institucionalização da lingüística na Unicamp. Com este trabalho pretendo trazer uma contribuição específica para a história da lingüística em instituições universitárias brasileiras. |
||
METODOLOGIA:
Os processos de designação de lingüística foram analisados pela observação dos procedimentos de reescrituração e de articulação, a partir da proposta da Semântica do Acontecimento de E. Guimarães (2002, 2004), a qual considera que os sentidos têm uma materialidade histórica. Segundo o autor, a reescrituração “é o procedimento pelo qual a enunciação de um texto rediz insistentemente o que já foi dito fazendo interpretar uma forma como diferente de si”. E a articulação diz respeito “às relações próprias das contigüidades locais. De como o funcionamento de certas formas afeta outras que elas não redizem”. Para ilustrar, suponhamos o exemplo: A lingüística moderna não é tão moderna. Esta ciência se constituiu no século passado. Podemos dizer que o adjetivo ‘moderna’, articulado à ‘lingüística’, determina o sentido de ‘lingüística’. E que ‘a lingüística moderna’ é reescrita por ‘esta ciência’, sendo que ‘esta ciência’ determina o sentido de ‘lingüística moderna’. Assim, a lingüística é designada como lingüística moderna e, enquanto tal, ela é designada como ciência. Dentro da perspectiva teórica adotada, estas análises permitem compreender que a possibilidade destas designações para a palavra lingüística se dá no plano de uma memória de sentidos que toma a lingüística saussuriana como marco que a distingue das lingüísticas que se desenvolviam antes dela, sendo que uma das diferenças que se colocam nesta distinção é o estatuto de ciência. |
||
RESULTADOS:
Na “Proposta de Criação do Grupo de Lingüística no Instituto de Ciências Humanas”, a lingüística é designada como ‘lingüística matemática’ e como ‘disciplina’, dentre outras características. A lingüística também se apresenta, por ‘sua metodologia’, como ‘padrão de referência obrigatório’ para ‘as disciplinas afins’ (as Ciências Humanas). Este estatuto da lingüística, alcançado e legitimado por ‘sua metodologia’ de ‘lingüística matemática’, apresenta-se como um dos principais argumentos para a criação do Grupo de Lingüística no Instituto de Ciências Humanas. Um ponto interessante é que o nome ‘Ciências Humanas’ comparece em várias partes do texto, sendo também reescrito por ‘disciplinas’, ao passo que a lingüística não é reescrita (diretamente) enquanto ciência. Apesar disso, há, nesta proposta, diversos momentos, sutis e indiretos, em que a lingüística é designada enquanto ciência e, além disso, enquanto ciência piloto das ciências humanas. Um destes momentos é a definição da metodologia da lingüística matemática como ‘padrão de referência obrigatório’ para ‘as disciplinas afins’. Nesta definição, ‘disciplinas afins’, enquanto uma reescritura de ‘Ciências Humanas’, significa a lingüística como uma ciência. Um outro momento interessante é uma narrativa apresentada para explicar como a lingüística tornou-se ‘padrão de referência obrigatório’ para ‘as disciplinas afins’. É uma narrativa sobre ‘a história das ciências’ em que ‘uma delas’ torna-se ‘a ciência pioneira’. |
||
CONCLUSÕES:
Uma das características fundamentais que designam a lingüística na “Proposta de Criação do Grupo de Lingüística no Instituto de Ciências Humanas” é a de ciência piloto das ciências humanas. Mesmo que a expressão ‘ciência piloto das ciências humanas’ esteja ausente nesta proposta. Isso porque há uma memória de sentidos, construída a partir das condições históricas gerais da produção de conhecimento, que faz com que esta expressão signifique, mesmo em sua ausência, sob outras formas. Ao mesmo tempo, essa ausência também significa enquanto uma impossibilidade de se designar, diretamente, a lingüística enquanto ciência. Nas condições históricas da produção de conhecimento no espaço científico brasileiro daquele momento, a lingüística ‘ciência piloto’ estava começando a ser conhecida. Na proposta, um lugar aberto para os sentidos desta lingüística ‘ciência piloto’ significarem é o funcionamento da designação de ‘lingüística matemática’, que legitima o destaque dado à lingüística em relação as outras Ciências Humanas. A realização destas análises, a partir da observação dos procedimentos de reescrituração e de articulação, na abordagem da Semântica do Acontecimento, permitiu compreender como o processo de designação de lingüística é determinado por uma materialidade de sentidos que se constroem no interior de condições históricas e institucionais específicas. |
||
Instituição de fomento: CNPq e FAPESP | ||
Palavras-chave: história das idéias lingüísticas; lingüística; Unicamp. | ||
Anais da 57ª Reunião Anual da SBPC - Fortaleza, CE - Julho/2005 |