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G. Ciências Humanas - 5. História - 8. História Regional do Brasil | ||
O PROCESSO DE DESTERRITORIALIZAÇÃO SOFRIDO PELOS ÍNDIOS GUARANI EM MUNDO NOVO/MS: VITO’I KUE - “O LUGAR DO VITO” | ||
Fábio Roberto Valente 1 (farovalente@yahoo.com.br), Beatriz dos Santos Landa 1 e Luiz Eduardo Aparecido Grassi 1 | ||
(1. Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul - UEMS) | ||
INTRODUÇÃO:
Desde o início do processo colonizatório iniciado há cinco séculos, os indígenas brasileiros têm sofrido o impacto da presença do não-índio que, quando não dizimou toda a população de uma determinada etnia, contribuiu para a descaracterização cultural e perda de seus territórios tradicionais. Em contrapartida, é possível hoje encontrar grandes ou pequenos grupos que resistiram a este processo, e que seguem lutando para promover a preservação de seu modo de vida, hábitos, costumes e tradições. No Mato Grosso do Sul encontram-se falantes da língua Guarani que pertencem aos sub-grupos Kaiowá e Ñandeva, além de outras etnias, que somam aproximadamente 55 mil pessoas. Desde o final do século XIX, com a exploração da erva-mate no sul do estado, várias aldeias tradicionais foram impactadas e vieram a deixar de existir. No início da década de 1950 houve uma intensificação das frentes de expansão sobre estas áreas de ocupação tradicionais, promovidas pelo governo estadual, que intensificou e forçou a saída das comunidades Guarani destes locais. Os indígenas da aldeia tradicional Vito’i Kue, que se localizava no município de Mundo Novo, extremo sul do estado, com a chegada de um fazendeiro que adquirira estas terras anteriormente ocupadas por eles, viram-se, inicialmente, compelidos a trabalhar para este novo “proprietário”, e posteriormente foram forçados a deixá-las para se refugiarem e/ou confinarem em outras aldeias, fazendas, ou cidades. |
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METODOLOGIA:
No município de Japorã, que até 1992 pertencia a Mundo Novo, encontra-se a Terra Indígena Porto Lindo/Jakarey. Por ocasião de outras pesquisas realizadas em anos anteriores neste local, foram encontradas pessoas que viveram na região do córrego Vito’i Kue, onde se localizava a aldeia tradicional de mesmo nome. A partir de então foram realizadas entrevistas com os indígenas nascidos no local, e/ou que viveram lá por algum período de suas vidas. O emprego da História Oral como metodologia de trabalho mostrou-se muito eficaz para atingir o objetivo principal que era reconstituir a perda deste tekoha a partir das experiências dos próprios Ñandeva/Guarani. A forma de abordagem dos temas foi a mais livre possível, deixando que o entrevistado relatasse as experiências vividas no local, interferindo em algumas situações apenas para dar o direcionamento necessário para atingir os resultados da pesquisa, sempre considerando a significação dos relatos que emergem da memória dos entrevistados, e os cuidados necessários para analisa-los. |
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RESULTADOS:
Foram contatadas na aldeia Porto Lindo/Jakarey, cinco pessoas que moraram na aldeia tradicional Vito’i kue entre 1940 e 1970, dentre os quais, três são caciques (xamãs, rezadores), e que pertencem ao sub-grupo ñandeva. Além desses cinco depoentes, foi entrevistado também o irmão de um deles que reside atualmente na cidade de Salto del Guairá, no Paraguai. Com as informações obtidas foi possível estabelecer a data de 1951 como sendo a da chegada do fazendeiro, que iniciou o processo de estabelecimento de sua fazenda e, a de 1975 como a da saída definitiva dos índios do local. Neste intervalo de tempo eles passaram a trabalhar no corte da madeira, na criação do gado e no cultivo da lavoura. Recebiam uma quantia irrisória pelos serviços prestados, e que servia para comprar utensílios na cidade de Guairá/PR, como linhas, anzóis e tecidos. Quando não estavam trabalhando para o patrão, plantavam suas pequenas roças, caçavam e pescavam no córrego Vito’i Kue e no rio Paraná. Com a derrubada da mata para a formação da pastagem e das lavouras, e a conseqüente escassez de recursos econômicos e naturais, os cerca de 150 indígenas da aldeia começaram a deixar o local. Em 1975, o proprietário da fazenda decide vendê-la, e os poucos índios que ainda se encontravam no área decidem ir para outros lugares, porque o novo proprietário não os queria lá. |
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CONCLUSÕES:
O processo de perda de território dos indígenas da aldeia tradicional Vito’i kue, apesar de várias peculiaridades, não difere do processo ocorrido em todo o estado de Mato Grosso do Sul no século passado. Apesar de não ter sido feito na base da força com o uso de armas de fogo ou intimidação física, foi igualmente cruel. Aos poucos, a aldeia foi ocupada por um não-índio que veio do Paraguai, e que se intitulou dono daquelas terras. A estratégia foi estabelecer-se próximo aos índios, e contratá-los para trabalhar na fazenda. Ao invés de expulsá-los compulsoriamente, explorou sua mão-de-obra barata , e permitiu que permanecessem em suas habitações, e executando suas atividades rotineiras. Aos poucos os ñandeva/guarani desta área tradicional, viram-se obrigados a deixar o local onde nasceram em busca de trabalho, e outras oportunidades. Hoje vivem confinados em pequenas áreas, como é o caso da aldeia Porto Lindo/Jakarey que possui 1648 hectares e uma população de 3660 pessoas, com poucos recursos naturais e econômicos, e carregam um enorme descontentamento ao saber que o lugar onde nasceram, e foram criados já não lhes pertence mais. Hoje, há cercas de arame farpado e lavoura onde era mata e vida em abundância e, as pessoas que ali viviam não podem mais entrar nem para visitar o local onde enterraram seus antepassados. |
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Instituição de fomento: PIBIC/UEMS; CNPq; FUNDECT | ||
Trabalho de Iniciação Científica | ||
Palavras-chave: Guarani-Ñandeva; Território Indígena; Mato Grosso do Sul. | ||
Anais da 57ª Reunião Anual da SBPC - Fortaleza, CE - Julho/2005 |