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H. Artes, Letras e Lingüística - 5. Semiótica - 1. Semiótica
A CONSTITUIÇÃO DISCURSIVA DA FEMINILIDADE NA REVISTA NOVA
Otávia Marques de Farias 1 (otaviamarques@hotmail.com) e Eugênio Saulo de Lima Carvalho 2
(1. Universidade Estadual do Ceará - UECE; 2. Universidade Federal do Ceará - UFC)
INTRODUÇÃO:
O presente trabalho visa a analisar semioticamente a constituição do feminino no discurso da revista Nova, cujas publicações são voltadas para o público feminino brasileiro. Para isso, adotar-se-á os recursos metodológicos da semiótica discursiva francesa, mais especificamente da semiótica desenvolvida por Julien Algirdas Greimas e seus colaboradores. Tal metodologia implica um modo particular de apreender o objeto de estudo (a revista), pois se faz necessário debruçar-se sobre a totalidade dos efeitos de sentido produzidos nele. Assim, o trabalho consiste em reconhecer como os elementos presentes nos atos de enunciação, geradores da coerência discursiva da revista, plasmam os sentidos da feminilidade. A opção pela revista Nova se deu pela hipótese de haver nela uma manifestação do discurso mais geral sobre a feminilidade na mídia brasileira, servindo tal objeto, portanto, como uma amostra da produção de sentidos do feminino. O estudo mostra-se relevante pela necessidade de reflexão crítica sobre o poder da mídia de criar, recriar ou reproduzir simulacros do que seria o feminino, produzindo sentidos para formas de subjetividade em massa, porquanto tal produção é um dos principais mecanismos de poder nas sociedades de consumo.
METODOLOGIA:
O procedimento se deu com o exame dos textos de revistas publicadas de janeiro a outubro de 2004. Os textos e suas articulações com as imagens das campanhas publicitárias, os modos de enunciação, os simulacros figurativos do feminino foram os elementos analisados através do método semiótico. Partindo da análise do texto, procurou-se chegar aos sujeitos da enunciação, para a apreensão dos sentidos ali instituídos em três diferentes níveis de profundidade: um primeiro nível mais superficial, o do discurso em ato na sua aparência; um segundo, narrativo ou de estruturas articuladas funcionais; um terceiro, fundamental, mais simples e abstrato. Destarte, esse procedimento, conhecido como percurso gerativo de sentido, é um modelo simulador da geração de sentido do conteúdo do texto que apresenta dois componentes para cada nível: o sintático e o semântico. O percurso gerativo foi feito na análise de alguns textos, sendo o componente semântico um pouco realçado. Quanto à leitura das imagens, tomou-se como modelo o trabalho feito por Eric Landowski em sua obra Presenças do Outro, sem prescindir, entretanto, dos mesmos recursos de leitura dos textos verbais. Evitou-se, enfim, tentar aplicar estruturas fixas ou acabadas para a análise do discurso da revista, entendendo ter o objeto uma ordem estrutural interna que deve ser apreendida sem amarras epistemológicas, sem prescindir, entretanto, do mínimo rigor metodológico necessário.
RESULTADOS:
Ao fim da análise dos exemplares das revistas, constataram-se alguns elementos invariantes que permeiam os diversos textos, sejam verbais ou visuais. A revista trabalha com repertório limitado de pressupostos comportamentais, condicionados pelo modus vivendi das classes média e alta brasileiras. Em contrapartida, esses pressupostos não apontam para a formação de um ideal uno de comportamento, sendo, algumas vezes, contraditórios de uma edição à outra. Num nível mais abstrato, o simulacro da feminilidade colocado como modelo a ser alcançado está inscrito no sentido comum de um ideal de “mulher moderna”. As imagens, em harmonia com as colunas, são sempre de corpos femininos com marcas de poder sexual e econômico. Necessidade de verbalizar saberes sobre o sexo, liberalidade da moral sexual, independência moral e financeira (inserção no mundo do consumo) são características gerais dessa “mulher moderna”, manifestadas tanto pelas imagens quanto pelas temáticas abordadas. A importância acentuada dada ao uso de cosméticos e outros produtos que visam à inserção na moda, juntamente com a maleabilidade comportamental delimitada pelas possibilidades de existência da vida urbana das classes “incluídas”, ocasionaram uma mudança no olhar sobre os sentidos fundamentais do discurso sobre a feminilidade da revista Nova.
CONCLUSÕES:
Durante o exame das estruturas internas do Discurso da revista Nova, em busca de um simulacro semiotizado do feminino, percebeu-se a ausência de um simulacro uno e coerente no que se refere a comportamentos. O que se viu foi um discurso que cria a identidade da feminilidade menos a partir de padrões comportamentais que de padrões de consumo. Assim, embora os textos sobre comportamentos sejam estruturados em sua maior parte no modo imperativo, a maleabilidade com relação aos padrões apresentados demonstra a falta de uma padronização, apesar do limitado universo semântico referente (devido a adequação ao publico a quem se destina). Em contraposição à essa variedade, percebem-se como invariantes os valores presentes nas peças publicitárias, o que levou à conclusão de serem estes os elementos de coesão criadores da identidade do público da revista, ou seja, as mulheres. O simulacro da feminilidade é relacionado diretamente com o ser consumidor e estético, não com o comportamental ético; espere uma mulher encontrar um parceiro idealizado romântico para toda a vida ou simplesmente aprender “dicas” para uma noite erótica num motel com um parceiro ocasional, ambas se identificam como “mulheres modernas” pelo perfume ou pela maquiagem que usam. A criação de um simulacro do ideal feminino encontra, na revista, suas invariantes nos valores atribuídos ao consumo de produtos. Estes, por sua vez, apresentam-se como meio para a conjunção das consumidoras com esse simulacro do ideal.
Palavras-chave:  semiótica do discurso; gênero; simulacros de feminilidade.
Anais da 57ª Reunião Anual da SBPC - Fortaleza, CE - Julho/2005