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F. Ciências Sociais Aplicadas - 4. Direito - 9. Direito Penal | ||
A ESTIGMATIZAÇÃO DA MULHER VÍTIMA DE CRIMES SEXUAIS E SEUS EFEITOS JURÍDICOS COMO FORMA DE VIOLÊNCIA DE GÊNERO | ||
Lilah de Morais Barrêto 1 (lilahbarreto@yahoo.com.br) e Miguel Ribeiro Pereira 1 | ||
(1. Depto. de Direito, Universidade Federal do Maranhão - UFMA) | ||
INTRODUÇÃO:
A Constituição Federal consagra em seu artigo 5º, inciso I, a igualdade entre homem e mulher, posição ratificada em diversos tratados internacionais. No entanto, verificam-se socialmente manifestações de discriminação e cerceamento em relação às liberdades individuais no âmbito da sexualidade da mulher. Em reconhecimento a esta realidade e ao conseqüente constrangimento que a publicidade de um processo em face de crimes contra a liberdade sexual pode acarretar, o artigo 225 do Código Penal os inclui na excepcional incidência da ação penal privada. Por outro lado, a política legislativa e criminal é assaz criticada pela classificação desses crimes e caracterização das condutas previstas nesses tipos penais, bem como pelo tratamento dado à vítima nas esferas policial e processual. Esta pesquisa pretende enfrentar a perspectiva introduzida pela vitimologia diante desses crimes e verificar em que medida as práticas institucionais reproduzem a estigmatização social dessas vítimas e se fundamentam em estereótipos de gênero para julgamento dos delitos sexuais. Objetiva-se com o estudo desvelar os preconceitos ínsitos na consciência dos operadores jurídicos para a mudança da prática das instituições que estes compõem e efetivação da igualdade e direitos da mulher. |
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METODOLOGIA:
Para obter os resultados e produzir a conclusão desta pesquisa, foi realizado levantamento bibliográfico acerca do tema, em suas dimensões sociológica e jurídica, com o posterior estudo da doutrina e disposições legais, confronto de diferentes posicionamentos, incluindo manifestações de movimentos sociais e embasamento estatístico, além de observação da jurisprudência em sede dos crimes sexuais e análise do discurso presente nas decisões e acórdãos, como forma de compreensão e crítica acerca das práticas institucionais com relação às vítimas desses crimes, da influência da vitimologia e da incidência dos preconceitos de gênero. |
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RESULTADOS:
Os crimes sexuais encontram-se classificados no título VI do Código Penal, sob a denominação de Crimes Contra os Costumes, sendo esta política legislativa bastante criticada doutrinariamente por ferir a concepção da mulher como sujeito de direitos, bem como por distinções entre tipos penais pautadas preponderantemente em critérios de gênero. Neste sentido, observa-se grande avanço na legislação, com a retirada de várias expressões discriminantes, como “mulher honesta”, e mudança na previsão de crimes que apresentavam o gênero como pressuposto para sua configuração, por meio da recente lei nº 11.106. A aplicação da lei nas esferas policial e judicial também é alvo de várias críticas na doutrina e por parte dos movimentos sociais feministas. Não existem estatísticas específicas desse tipo de violência contra a mulher em escala nacional, mas os dados de alguns estados, como o Rio de Janeiro, apontam que o registro desses crimes é feito por apenas dez por cento das vítimas, em função do constrangimento e descrédito quanto à responsabilização do agente. Os estereótipos referentes à sexualidade da mulher são reproduzidos na jurisprudência, constando na fundamentação de várias decisões, que se valem da perspectiva vitimológica para desqualificar a vítima e negar a credibilidade de seus depoimentos. Segundo a vitimologia, o comportamento da vítima deve ser perquirido, observando se esta assumiu um perfil provocador, o que ensejaria uma diminuição de pena ou até absolvição do agente. |
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CONCLUSÕES:
A estigmatização da qual a lei penal tenta proteger a vítima de crimes sexuais, ao prever para estes a ação penal privada, é reproduzida institucionalmente por meio de preconceitos de gênero que, de forma paradoxal, a mesma lei comportava em alguns de seus dispositivos, principalmente os anteriores às mudanças introduzidas pela lei nº 11.106. Destarte, a tutela prestada pelo Estado aos direitos sexuais manifesta-se frágil, tendo em vista que os provimentos jurisdicionais costumam condicioná-la à verificação de padrões comportamentais moralmente aceitos na sexualidade da vítima, negando-lhe a liberdade que deveriam proteger. A necessidade de perquirir sobre a versão apresentada pela vítima e analisar sua conduta face ao crime, embora represente o contraditório e uma garantia do acusado, tem sofrido uma apropriação indevida por parte de certos operadores jurídicos, desde a esfera policial, o que colabora para o receio das vítimas em registrar a ocorrência e a descrença na responsabilização do agente. A proposta da vitimologia merece algumas ressalvas no que tange a esses delitos, posto que a persecução sobre a conduta da vítima não deve lhe impingir um novo constrangimento, atendo-se à sua relação no fato delituoso, sem representar uma invasão à sua intimidade e ao legítimo exercício da liberdade sexual ou discriminação por não corresponder às expectativas erigidas socialmente sob forma de estereótipos de gênero. |
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Trabalho de Iniciação Científica | ||
Palavras-chave: Crimes sexuais; Estereótipos de gênero; Vitimologia. | ||
Anais da 57ª Reunião Anual da SBPC - Fortaleza, CE - Julho/2005 |