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G. Ciências Humanas - 9. Sociologia - 7. Sociologia
GOVERNO JOSÉ AUGUSTO (ACRE 1962-64): UM PARADIGMA DE RUPTURA?
Lyvia Milenna de Souza Rocha 1 (milenna_rocha@hotmail.com), Francisco Bento da Silva 1 e Elder Andrade de Paula 2
(1. Centro de Documentação e Informação Histórica, Universidade Federal do Acre - UFAC; 2. Departamento de Filosofia e Ciências Sociais, Universidade Federal do Acre - UFAC)
INTRODUÇÃO:
O objetivo central deste trabalho, é analisar como o processo de elevação do Território Federal do Acre à categoria de Estado autônomo da federação brasileira, no ano de 1962, bem como a convocação da primeira eleição direta para a escolha do chefe do executivo acreano, somada às crises de uma economia monoextrativista dependente, a um certo afrouxamento das relações patrão-seringueiro ou barracão-colocação no Alto Acre e a uma oligarquia submissa e acostumada à política de apadrinhamento e clientelismo, faz acentuar a corrida pelo controle da maquina estatal. O processo eleitoral foi disputado entre o “cacique” partidário do PSD e autor do projeto autonomista, Guiomard Santos e a aliança (PTB, UDN, PSP, PP), tendo a frente o professor José Augusto de Araújo.
Mais que acompanhar o desencadeamento e os resultados do processo eleitoral que teve como vencedor o jovem José Augusto, a perspectiva é refletir sobre o que aconteceu no período compreendido entre a posse do primeiro governador do Acre, eleito em sufrágio universal e o golpe militar de 1964. A intenção é jogar uma “nova luz” sobre o passado, contrapondo o discurso e a pratica do governo José Augusto, seu nível de compromisso com as “reformas de base” do governo federal, suas propostas inovadoras e sua intensidade em representar uma ruptura com as práticas políticas no Acre.
METODOLOGIA:
No processo da pesquisa foram utilizados documentos do Acervo Documental do Centro de Documentação e Informação Histórica da Universidade Federal do Acre (CDIH/UFAC), na sessão Fundo de História Política, cuja coleção sobre o governo de José Augusto, foi doado pela senhora Maria Lúcia de Araújo, viúva do ex-governador, sendo composto por fotografias, cartas, entrevistas, discursos e telegramas que expressam, em última instância, as relações sociais e de poder daquele contexto histórico. O diálogo com essa documentação propicia uma série de reflexões que, aliadas às fontes orais e aos depoimentos de homens e mulheres que viveram aquele conturbado período histórico, recolocam a recente história política e as práticas de uso da máquina pública acreana em um campo de debate completamente diferente do que foi convencionado pela historiografia oficial da Amazônia Sul-Ocidental.
RESULTADOS:
Ao assumir o governo do Estado do Acre, José Augusto de Araújo, manteve forte ligação com as “reformas de base” de João Goulart, assustando a oligarquia local. Por não “bater de frente”, deu espaço para a criação das ligas camponeses que, para os conservadores, após o golpe de 64, seria visto como mais um “prova” de que o mesmo tinha a intenção de fazer a reforma agrária no Acre, mesmo que à força. Na área da educação, junto com Hélio Khoury, formado em sociologia e seu assessor técnico, introduziu o método Paulo Freire como uma das mais inovadoras experiências na região.
Com o advento do golpe militar, após pouco mais de um ano de seu mandato, o primeiro governador eleito pelo voto popular, foi obrigado a renunciar no dia 8 de maio de 1964, em favor do capitão Edgard Cerqueira Filho sendo sua renúncia homologada com unanimidade de votos da assembléia legislativa acreana.
A reflexão em torno da forte propaganda acerca das ações de José Augusto, mantida por aqueles que guardam a lembrança de seu breve mandato, bem como o silêncio sobre seu “banimento” do Acre, particularmente por parte dos diferentes governadores que assumiram a direção do executivo acreano propiciaram perceber a prática de um poder instituído que sempre procurou se legitimar esvaziando os segnificados das ações governamentais de seus antecessores e se apropriando de seus projetos inacabados, reapresentando-os sob nova roupagem e retórica.
CONCLUSÕES:
O primeiro governador eleito do Acre sofreu oposição dos partidos que se revezavam no poder (PTB e PSD), na proporção em que iniciou um processo de ruptura com algumas praticas políticas tradicionais. Porém, esse rompimento não foi “desinteressado” e refletia a crise política/institucional em que se encontrava o Acre e o Brasil naquele contexto.
A oligarquia local não conseguia se desvincular dos antigos laços de apadrinhamento e clientelismo, encarando como “perigosa” a política de “democracia populista e nacionalista” de José Augusto, seguidor local e amigo pessoal de João Goulart. O discurso produzido era permitir ao Acre outras oportunidades para a sua economia monoextrativista, baseada na produção gumífera, onde o Estado era encarado como única possibilidade de solução para os problemas, consistindo, como observou Weffort, numa política de reformismo que visava, ao mesmo tempo, “a preservação e ampliação do poder”.
O curioso é que José Augusto, não havia sido eleito pelos menos favorecidos, pois, em 1962, os analfabetos não votavam e apenas 9% da população acreana participou do processo eleitoral. Não obstante, o mesmo ficou conhecido como “o pai dos pobres” e até hoje é lembrado entre os mais velhos como um governador bom, humilde e preocupado com todos. Visão essa que seus simpatizantes e opositores, ainda hoje, reproduzem sob a forma do culto aos seus atos inacabados, por um lado e sob o manto de um “estranho” silêncio e receios, por outro.
Instituição de fomento: CNPQ
Trabalho de Iniciação Científica
Palavras-chave:  Política; Estado; Discurso.
Anais da 57ª Reunião Anual da SBPC - Fortaleza, CE - Julho/2005