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H. Artes, Letras e Lingüística - 4. Lingüística - 6. Lingüística
A RETÓRICA DE SEARLE: UMA ANÁLISE DA ARGUMENTAÇÃO DO FORMALISMO NOS ESTUDOS DA LINGUAGEM
Claudiana Nogueira de Alencar 1 (clau@iel.unicamp.br)
(1. Depto. de Lingüística, Instituto de Estudos da linguagem, UNICAMP)
INTRODUÇÃO:
Neste trabalho, pretendi investigar o processo de produção do conhecimento lingüístico, através do estudo da estrutura retórica de discursos teóricos sobre a linguagem, e discutir as conseqüências dos pressupostos teóricos escolhidos para fundamentar a pesquisa lingüística. Para isso, elegi como objeto de estudo a tradicional interpretação da teoria dos atos de fala de J. Austin pelo filósofo J. Searle. A filosofia de Austin, como tem sido amplamente aproveitada na lingüística, é fruto de um trabalho de re-leitura feita pelo filósofo norte-americano John R.Searle, considerado como o herdeiro intelectual legítimo do mestre inglês (Rajagopalan: 1996). No entanto, Searle formaliza sua teoria conciliando pensamentos tradicionais sobre linguagem com relação aos quais as idéias de Austin tinham se mostrado diametricamente opostas (Ottoni: 1998; Love, 1999; Rajagopalan, 2000). Procurei, pois, orientar a análise retórica a partir da seguinte problematização: que razões de ordem epistemológica fizeram com que Searle interpretasse Austin de modo a formalizá-lo em consonância com os mais tradicionais paradigmas do conhecimento sobre linguagem? Tal problematização enfrenta aspectos relativos às nossas próprias crenças relacionadas à linguagem e a paradigmas científicos tradicionais. O revolver de tais questões indica a relevância da investigação cujos resultados estão longe de esgotar um campo ainda pouco explorado entre nós.
METODOLOGIA:
Delimitada a obra Speech Acts: an essay in the philosophy of language (1969) de J. Searle como uma peça argumentativa, por ser comumente indicada como uma introdução à teoria dos atos de fala, percorri, com algumas modificações, o seguinte caminho metodológico proposto por Margutti Pinto (1998): no primeiro momento, analisei a contextualização, a contingência do autor e o ponto de partida da argumentação, que significa o conjunto das premissas que servirão de fundamento à construção de seu discurso (Perelman 1958:87). No segundo momento, efetuei a análise das técnicas argumentativas utilizadas no texto.
RESULTADOS:
Como resultado da análise, percebi o mito da linguagem, que remonta a Aristóteles, como a linha geral da argumentação da teoria searleana dos atos de fala. De acordo com Roy Harris (1998) o mito da linguagem tem raízes profundas na cultura ocidental, e está baseado em duas antigas teses sobre comunicação: a tese da telementação e a tese da determinação. A partir da utilização da técnica heurística da iteração de conceitos, Searle parece imitar o modelo filosófico de Austin, anteriormente dado. No entanto, o que foi selecionado de Austin por Searle, foram as seqüências em que Austin demonstra suas idéias (conceitos, racionalizações). Todas as nuances e performances, as saídas do script, ficaram de fora. Tomado pelo mito da linguagem, somente o que podemos chamar conteúdo de Austin foi recuperado por Searle em seu trabalho. Ao definir o ato de fala em termos da dicotomia conteúdo proposicional/força ilocucionária, Searle sugere a construção de regras (universais) para os atos de fala, oferecendo uma feição lógica e formal a sua teoria, numa imitação do modelo aristotélico. Percebi que o mito da linguagem (Harris, 1981) desenvolveu tanto a atividade interpretativa de Searle (a passagem de Austin para Searle) através da tese da telementação, quanto o produto dessa atividade, a teoria dos atos de fala de Searle, construindo um modelo formal para sustentá-la (tese da determinação).
CONCLUSÕES:
Pude, assim, concluir que, como teóricos da linguagem, ao pretendermos romper com as crenças e mitos que se cristalizam no senso-comum, tornamo-nos vítimas de uma falácia epistemológica: ao usarmos a retórica da formalização, pressuposto de qualificação do conhecimento lingüístico, somos tomados pelo mito da linguagem e por suas constitutivas falácias: a da telementação e a da determinação
Palavras-chave:  Searle; atos de fala; formalismo.
Anais da 57ª Reunião Anual da SBPC - Fortaleza, CE - Julho/2005