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F. Ciências Sociais Aplicadas - 10. Documentação e Informação Científica - 1. Documentação e Informação Científica
ALMANAQUE DA DENGUE: CONSTRUÇÃO COMPARTILHADA DO CONHECIMENTO SOCIAL
Regina Maria Marteleto 1 (reginamar@eci.ufmg.br), Ana Amélia Lage Martins 1, João Paulo Ferreira Barbosa 1, Tiago Neves Guerra Lages 2, 3 e Aleixina Maria Lopes Andalécio 1
(1. Escola de Ciência da Informação, Universidade Federal de Minas Gerais UFMG; 2. Instituto de Informática, Depto de Ciência da Informação, PucMinas; 3. Departamento de Física, Instituto de Ciências Exatas, UFMG)
INTRODUÇÃO:
Esta pesquisa tem como eixo e suporte as concepções da Antropologia da Informação – AI. O pressuposto teórico-metodológico geral da AI é a necessidade de ter o sujeito como fonte e eixo da problemática informacional, funcionando, portanto, no escopo dos estudos de usos e usuários da informação, porém com um enfoque multidisciplinar mais ampliado. Estudamos como os atores dos movimentos sociais, na condição de sujeitos da informação, transformam os sentidos que circulam em formas discursivas e narrativas para a intervenção social, e como se opera a gestão, nas redes sociais organizadas, do conhecimento produzido. Para tanto, utilizamo-nos de conceitos como: “Terceiro Conhecimento”, “construção compartilhada do conhecimento”, informação, comunicação, conhecimento, espaço, tempo, narrativa, discurso, leitura (não necessariamente associada à idéia de texto escrito), hipertexto, saúde, mediação, redes; que se constroem e se mostram de fundamental importância nos processos de comunicação e transferência informacional. Como concretização desta estrutura teórica apresentamos neste espaço o Almanaque da Dengue. O almanaque é um experimento de informação sobre a dengue em região periférica da cidade do Rio de Janeiro que busca representar o discurso das diversas esferas envolvidas em uma questão de saúde pública.
METODOLOGIA:
A construção do Almanaque da Dengue requereu uma longa pesquisa sobre o tipo de publicação que caracteriza o almanaque. Essa pesquisa foi feita em livros, sites da Internet e diretamente no Museu Histórico Nacional, no Rio de Janeiro. O objetivo dessa pesquisa foi garantir que o almanaque fosse um instrumento apropriado para a representação de diferentes vozes e tipos de informação e conhecimento que circulam pelo universo estudado Para explorar a informação que constrói os diferentes discursos, foram feitas entrevistas com lideranças populares e com especialistas do campo acadêmico; depoimentos de pessoas que adoeceram de dengue, usuários dos sistemas de saúde da região; análise de documentos; e análise do discurso da mídia.
O passo seguinte foi ler, categorizar e recortar todo este material colhido durante a pesquisa para ser trabalhada como texto no almanaque. Paralelamente, foi feita uma ampla pesquisa sobre os aspectos técnicos, científicos e políticos da dengue, em sites, livros e documentos coletados durante o projeto. Outra fonte de dados para a elaboração do conteúdo do almanaque foram entrevistas feitas em projetos anteriores, que constam do banco de dados da pesquisa. Para orientar a organização desse material de forma a compor um todo coerente, foram selecionados alguns personagens representativos cujas falas funcionaram como fios condutores das diversas expressões e ações da população.
RESULTADOS:
Durante os testes com especialistas e lideranças populares a que o Almanaque da Dengue foi submetido, foram marcadas algumas mudanças de linguagem, substituindo expressões por outras mais adequadas. Foi apontado ainda que o experimento continha blocos de texto muito extensos, o que poderia prejudicar a leitura e que deveria conter mais falas da população.
A versão final está dividida em blocos temáticos que conduzem as discussões sobre a dengue. O experimento é aberto por um diálogo entre três personagens que trocam idéias sobre a questão dos pontos de vista popular e científico. Em seguida, são apresentados dados técnicos sobre a doença. Esse conteúdo é interrompido por falas da população, que lembram ao leitor que a dengue tem outros aspectos, políticos, econômicos, sociais, que vão além da pura definição biológica. Outros blocos são compostos por uma discussão mais ampla sobre o que é preciso (e o que não é) para controlar a dengue; os sintomas da doença; as associações entre a dengue e problemas como a fome e a desigualdade social; os aspectos biológicos da doença e sua história no Brasil e no mundo; vacinas e possibilidades de erradicação do mosquito transmissor; movimentos sociais e solidariedade; história da dengue na região; jogos, brincadeiras e piadas; informações sobre a dengue hemorrágica; dicas de prevenção, além dos componentes dos almanaques em geral, como referências astrológicas, por exemplo.
CONCLUSÕES:
O diálogo continuado com a sociedade, que é produtora e consumidora de um produto de informação como o Almanaque da Dengue, mostrou-se fundamental ao longo do processo de pesquisa e na elaboração final do experimento. A construção de experimentos como esse tem como objetivo macro apontar caminhos metodológicos para a criação de canais de comunicação em saúde mais eficazes, que situem a informação local e levem em conta, além do conhecimento técnico produzido na Academia e nas esferas governamentais, a experiência e o conhecimento produzido pelas pessoas que vivenciam os problemas. Ainda que o Almanaque seja um trabalho concluído, no que diz respeito à sua concretização enquanto ente material e enquanto aplicação dos pressupostos metodológicos da AI não consideramos que a pesquisa em si assim esteja. Pela própria dinâmica do conhecimento social e pela intrínseca reformulação do hipertexto em narrativas surgem novas questões a serem respondidas. Entre elas é possível citar: qual a finalidade deste construto? Como utilizá-lo? O almanaque se caracteriza como memória de um determinado local e narrativas, ou sua utilização possui um caráter mais geral para centros urbanos ou rurais? Acreditamos que várias outra questões podem e serão levantadas uma vez que o trabalho do pesquisador não é estanque e absolutamente conclusivo; ele depende da constante reconfiguração e formulação de questionamentos, análises e contextos onde a pesquisa acadêmica dialoga com a multifacetada realidade.
Instituição de fomento: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, CNPq
Palavras-chave:  terceiro conhecimento, narrativas; antropologia da informação ,redes; almanaque, saúde pública, hipertexto.
Anais da 57ª Reunião Anual da SBPC - Fortaleza, CE - Julho/2005