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G. Ciências Humanas - 9. Sociologia - 6. Sociologia Urbana
O ESTADO AJUSTADOR BRASILEIRO FACE À QUESTÃO SOCIAL: UM OLHAR SOBRE AS POLÍTICAS URBANAS
Eliana Costa Guerra 1 (elianacostaguerra@hotmail.com) e Alba Maria Pinho de Carvalho 2
(1. Mestrado Acadêmico em Geografia, Laboratório de Estudos Urbanos, Universidade Estadual do Ceará UECE; 2. Departamento de Ciências Sociais Universidade Federal do Ceará - UFC)
INTRODUÇÃO:
Trata-se de uma análise do padrão de intervenção do Estado Brasileiro contemporâneo, assim compreendendo o Estado que se constitui nos últimos 20 anos, na confluência de dois processos estruturais básicos em curso: a democratização, deflagrada nos anos 1980; a inserção do Brasil nos circuitos da mundialização do capital, a partir da década de 1990, configurando o chamado ajuste estrutural brasileiro. O eixo analítico são as novas configurações do Estado face à complexificação da questão social brasileira, destacando as políticas urbanas no âmbito de sua engenharia sócio-política, com foco, em particular, no desenho das políticas habitacionais. Nesta linha de reflexão, constituem objetivos deste trabalho: demarcar vias de estudo acerca da estruturação e da dinâmica do Estado Brasileiro, pondo ênfase nas suas contradições, decorrentes de dois projetos políticos distintos; analisar o desenho das políticas habitacionais, tendo em vista o desmonte de estruturas nacionais e a emergência dos entes municipais.
A relevância deste estudo decorre da necessidade histórica de adentrarmos no cenário sócio-político do Brasil contemporâneo, analisando fenômenos aparentemente paradoxais, que, por um lado, consubstanciam a ampliação da política e, por outro, a flexibilização de direitos.
METODOLOGIA:
O Processo de investigação compreendeu movimentos distintos que se complementaram na dinâmica interna de estudo. O primeiro movimento consistiu em um mergulho no cenário brasileiro contemporâneo, através das seguintes vias: leitura crítica de documentos oficiais; pesquisa sistemática em jornais de circulação nacional para delinear o ritmo da “história se fazendo”; resgate de olhares de estudiosos da história brasileira recente. Esta abordagem panorâmica convergiu para um segundo movimento investigativo: análise do modelo de políticas públicas com foco nas políticas urbanas. Nesta direção, desenvolvemos estudo de campo acerca das políticas habitacionais em duas metrópoles: Recife e Fortaleza. Neste estudo de campo, optamos por uma triangulação metodológica: observação sistemática “in loco”, em espaços públicos, dos processos de negociação e de implementação das políticas; entrevistas semi-estruturadas com os principais atores implicados nas questões estudas nas duas metrópoles e análise de documentos oficiais e produzidos pelas organizações sociais.
RESULTADOS:
O processo investigativo permitiu configurar uma chave analítica: a compreensão do tecido sócio-político do Brasil contemporâneo implica trabalhar a confluência contraditória da democratização e do ajuste. Neste movimento, o Estado configura-se como um “Estado Ajustador” que “ajusta e ajusta-se” à nova ordem do capital, numa dinâmica de domesticação da democracia, tenta sufocar conquistas e direitos. Este processo enfrenta resistência de movimentos que encarnam a gramática democrática e buscam assegurar suas conquistas. O Estado secundariza o social, valendo-se da descentralização das políticas públicas para transferir responsabilidades para os municípios, que recebem encargos sem a devida correspondência de recursos financeiros e sem capacidade política e técnica de ação. Desta lógica, emerge um modelo de política social focalizada, seletiva, voltada para os mais carentes. O Estado Ajustador com sua engenharia política promove erosão seletiva no social, constituindo-se como Estado de “baixa responsabilidade social”. Redefinindo o paradigma das políticas sociais, coloca-se como parceiro dentre outros, ao lado do mercado, da sociedade civil, dos municípios. Estes constroem dinâmicas particulares, segundo o perfil da sociedade civil e as peculiaridades locais. Materializa-se, assim, aparente paradoxo: a descentralização, uma das frentes de luta democrática, no resgate do município como instância de poder, é (re)significada, destacando-se como elemento de sustentação do ajuste.
CONCLUSÕES:
A Questão Social Brasileira Contemporânea complexifica-se nos processos excludentes do ajuste. A engenharia política do Estado Ajustador tem rebatimentos peculiares nos espaços metropolitanos. A rigor, é nas metrópoles que a Questão Social aparece de forma mais visível e contundente, exigindo ações públicas de peso. A partir dos anos 1980, escolhas políticas e técnicas são feitas, visando enfrentar as graves condições de vida das populações urbanas. Destacamos exemplos de ações em matéria de habitação popular realizadas em Fortaleza (Programas de mutirão habitacional) e em Recife (Plano de Regularização das Zonas Especiais de Interesse Social/PREZEIS). A integração das zonas precárias à cidade, através de tais ações, coloca-se como passo essencial na promoção do direito à moradia e à cidade. As políticas em questão (construção de moradias, regularização fundiária, reestruturação de áreas precárias e insalubres) materializariam assim o acesso a tais direitos. O acesso a infra-estruturas, serviços e equipamentos de base, sem dúvida indispensáveis à melhoria das condições de vida dos citadinos, não resulta, entretanto, em integração ou inclusão social do conjunto das populações empobrecidas. Tais ações inserem-se, no melhor dos casos, no rol de políticas reformistas, tendendo a funcionar como ações de regulação dos conflitos urbanos. Revelam ainda tentativa dos entes locais para fazer face ao desmonte das estruturas do Estado responsáveis pela promoção do direito à moradia.
Instituição de fomento: CAPES, CNPq, FUNCAP
Palavras-chave:  Ajuste Brasileiro; Questão Social; Políticas Urbanas.
Anais da 57ª Reunião Anual da SBPC - Fortaleza, CE - Julho/2005