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G. Ciências Humanas - 5. História - 9. História Social
“QUEBRA COCO NEGA, EU NÃO! EU NÃO! QUEBRA COCO NEGA, EU ESTOU QUEBRANDO!": IMAGINÁRIO E COTIDIANO DE MULHERES QUEBRADEIRAS DE COCO BABAÇU
Viviane de Oliveira Barbosa 1 (vivianedeob@yahoo.com.br), Leonan Pereira Rodrigues 1, Valéria de Jesus Moreno de Lemos 2, Maria da Glória Guimarães Correia 1 e Maristela de Paula Andrade 3
(1. Depto. de História, Universidade Federal do Maranhão - UFMA.; 2. Depto. de Geografia, Universidade Estadual do Maranhão - UEMA.; 3. Depto. de Sociologia e Antropologia, Universidade Federal do Maranhão - UFMA.)
INTRODUÇÃO:
Algumas mulheres camponesas, trabalhadoras agroextrativistas dos Estados do Maranhão, Pará, Piauí e Tocantins articularam-se em um movimento, o MIQCB (Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu), assumindo a identidade de quebradeiras de coco, quando tiveram a necessidade de lutar pelo direito de coleta e quebra do coco babaçu e pelo direito à terra. Esse Movimento possui algumas caracterizações específicas, quais sejam: a preservação dos babaçuais e a defesa ambiental, a valorização da condição feminina através das discussões de gênero e a afirmação da identidade étnica, incluindo-se assim, no contexto dos "novos movimentos sociais" como destaca Hobsbawm (1995). Neste trabalho, nos preocupamos em perceber as experiências de algumas mulheres quebradeiras de coco no Maranhão, apontando para suas vivências e memórias e para elementos simbólicos que perpassam o seu cotidiano constituindo um conjunto de valores, práticas e idéias, que implica no delineamento de suas relações dentro e fora do Movimento.
METODOLOGIA:
Utilizamos relatos e memórias daquelas mulheres acerca de suas experiências, discutindo os elementos que perpassam o seu cotidiano, principalmente em relação às suas lutas em defesa dos babaçuais e às questões de gênero e identidade. Isto tem sido possível com a utilização dos métodos e técnicas da história oral e também através de um diálogo interdisciplinar entre áreas do saber, principalmente, a História e a Antropologia. A pesquisa em arquivos também tem sido fundamental, na medida em que tem constituído um caminho para encontrarmos representações sobre aquelas mulheres e seu Movimento. Além disso, buscamos examinar os cantos produzidos para o MIQCB, procurando notar como estes constroem e referenciam os objetivos e prioridades do Movimento, entendendo, especificamente, que os elementos que se referem à questão de gênero devem ser percebidos numa dimensão relacional, na qual dialogam as construções históricas homem e mulher, enquanto sujeitos construtores de uma realidade sócio-cultural e, aceitando ainda, que a configuração de gênero não está dissociada da de identidade.
RESULTADOS:
Observamos, nos relatos que analisamos, a afirmação da identidade feminina e de quebradeira de coco por parte dessas mulheres e também a afirmação de sua etnicidade (ser negra ou de origem indígena), além de sua preocupação ambiental e ecológica, garantia de seu trabalho extrativo. Os cantos produzidos e que são freqüentemente cantados nas reuniões do MIQCB confirmam a defesa aos babaçuais: “Ei não derruba essas palmeiras, ei não devora os palmeirais, tu já sabes que não pode derrubar, precisamos preservar a riqueza natural”. A afirmação da identidade também é evidenciada: “Eu sou quebradeira, eu sou quebradeira e vim para lutar pelos meus direitos, pelos meus direitos vim reivindicar mais educação e saúde pra toda nação. Eu sou quebradeira, sou mulher guerreira e venho do sertão”. A palmeira de babaçu é representada como uma mãe sofrida que precisa de proteção: “Ave palmeira que sofre desgraça, malditos derruba, queima, devasta. Bendito é teu fruto que serve de alimento, e no leito da terra ainda dá sustento”. A afirmação da identidade coletiva e étnica dessas mulheres é contínua: “Quebra coco nega, eu não! eu não! Quebra coco nega, eu estou quebrando...”. O fato é que há diversas formas de demonstração dos símbolos que constituem as experiências dessas mulheres dentro do Movimento e fora dele, uma vez que não há uma separação nas relações que são tecidas dentro e fora do MIQCB, elas, em grande medida, são complementares.
CONCLUSÕES:
Verificamos que essas mulheres tiveram dificuldade de garantir seus direitos, principalmente o de extração do coco babaçu, porém foram aos poucos mostrando a sua representatividade, afirmando-se como quebradeiras de coco e lutando pela sua sobrevivência e de suas famílias. Os cantos, as poesias, as construções de relatos dessas mulheres podem ser considerados enquanto rituais de militância. Nesses rituais, as histórias de lutas das gerações passadas são transmitidas oralmente, consubstanciando uma teia complexa na qual são reatualizados seus imaginários. É nessa esfera de configuração das histórias, em que as quebradeiras de coco estão inseridas, identificando-se enquanto "mulheres que lutam", que percebemos o universo simbólico de interação com a natureza e a construção de sua militância política, algumas assumindo inclusive cargos político-partidários como vereadoras. Seus testemunhos e relatos falam de suas experiências, apontando para uma interação entre o sentido cultural e a feição política de suas vidas. Embora cada uma delas tenha uma vivência individual, há histórias e experiências que as unem, que as identificam no grupo social e que possibilitam a construção de um sentimento de pertença, que as fazem ser e identificar-se como mulheres quebradeiras de coco babaçu.
Trabalho de Iniciação Científica
Palavras-chave:  Quebradeiras de coco babaçu; Gênero; Imaginário.
Anais da 57ª Reunião Anual da SBPC - Fortaleza, CE - Julho/2005