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H. Artes, Letras e Lingüística - 4. Lingüística - 5. Teoria e Análise Lingüística | ||
A REFERENCIAÇÃO E A ESCUTA DOS DESEJOS | ||
Mariza Angélica Paiva Brito 1 (marizabrito@yahoo.com.br) e Mônica Magalhães Cavalcante 2 | ||
(1. Programa de Pós-Graduação em Lingüística, Universidade Federal do Ceará - UFC; 2. Depto. de Letras Vernáculas, Universidade Federal do Ceará - UFC) | ||
INTRODUÇÃO:
Nesta pesquisa, elaboramos uma revisão crítica das características de linguagem que têm sido apontadas, nas áreas de Lingüística e da Psicanálise, para a conceituação da fala do psicótico. A revisão crítica feita da base teórica foi também realizada a partir de nossa experiência clínica com os pacientes que atendemos no Hospital São Gerardo, com o propósito de conseguir caracterizar e entender as especificidades da linguagem dos psicóticos, e apontar as marcas lingüísticas, assim encontradas, a partir das atuais considerações da Lingüística de Texto e de seu conceito de coerência e de referenciação. A partir disso, lançamos o seguinte questionamento que guiou nosso estudo: que traços lingüísticos podem revelar o desejo do inconsciente? É possível afirmar que o uso de expressões referenciais é um poderoso recurso que pode auxiliar a escuta psicanalítica? |
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METODOLOGIA:
Nossa pesquisa é de caráter hipotético-dedutivo. Elaboramos nosso trabalho seguindo alguns passos desse método: detecção de um problema e elaboração de hipóteses (diga-se de passagem, não estritamente influenciadas por uma observação prévia cientificamente orientada, como acontece no suposto método indutivo). Mas a corroboração (ou refutação) de nossas hipóteses estará também sujeita à observação empírica. Abordamos os conceitos de coerência e referenciação à luz dos pressupostos da Lingüística de Texto e suas novas propostas para a compreensão do texto/discurso e seus variados contextos. Investigamos algumas marcas lingüísticas, como os processos referenciais, no discurso dos esquizofrênicos que revelem a expressão de seus desejos. A análise qualitativa, de cunho essencialmente teórico, não ficou restrita, portanto, à revisão bibliográfica dos estudos sobre o assunto, uma vez que fomos a campo, especificamente a um hospital psiquiátrico, coletar um corpus de falas de pessoas que foram rotuladas como esquizofrênicas. A partir daí, comparamos as duas etapas de nossa pesquisa: o que encontramos na literatura sobre o assunto e o que verificamos empiricamente no atendimento a esses sujeitos. Os sujeitos de nossa pesquisa são oitos pacientes que atendemos num hospital psiquiátrico. Passamos nove meses, duas vezes por semana, analisando e gravando as falas dos sujeitos de nossa pesquisa. Esses pacientes tinham o diagnóstico de esquizofrenia.. |
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RESULTADOS:
A análise dos depoimentos dos pacientes revelou que toda a sintomatologia na qual esses esquizofrênicos se encontram hoje tem um suporte em sua vivência psíquica anterior a seus internamentos e ao agravamento dos seus sintomas. Ou seja, o delírio não é simplesmente tirado da cartola como um coelho, o delírio é uma tentativa de elaboração de situações que não foram muito bem estruturadas pelo sujeito, daí Freud afirmar ser o delírio uma tentativa de cura. Vimos, por exemplo, em um dos casos, o de F.M., essa tentativa de resgate de sua história e principalmente de nomeação dos sentidos das suas fantasias. Por isso reafirmamos a importância de uma escuta psicanalítica e uma análise da construção referencial como princípio ético para com a verdade de cada sujeito. Dentre os processos referenciais que mais nos auxiliaram a estabelecer relações com a escuta dos desejos, estão as anáforas correferenciais recategorizadoras e as anáforas indiretas que compõem as possíveis associações entre referentes só aparentemente não-relacionados, mas que ajudam a reconstruir os sentidos subjacentes e a pôr ordem no caos aparente. |
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CONCLUSÕES:
Argumentamos, ao longo de nossa pesquisa, em favor da importância de uma escuta psicanalítica não apenas centrada em si mesma, mas também ancorada nos novos avanços da Lingüística de Texto, por isso recorremos à noção de referenciação como um suporte para a fala esquizofrênica. Conforme mostramos em três relatos de caso, uma análise feita a partir de uma perspectiva mais ampla, não-presa à textualidade, permite a reconstrução de muitos sentidos. Embora os relatos não possam ser considerados como textos bem articulados, com continuidade temática e não-contraditórios com a realidade do mundo, ainda assim expressam uma verdade acentuada de desejos. Consideramos que localizar, simplesmente, marcas lingüísticas na fala esquizofrênica para corroborar um diagnóstico, como faz a Psiquiatria, é desrespeitar e negar o ser humano em sua essência, uma vez que não existe uma fala patológica em si, na medida em que o seu contraponto, a fala normal, não se sustenta. O uso de expressões referenciais confirmou-se como um poderoso recurso que pode auxiliar a escuta psicanalítica. |
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Instituição de fomento: CAPES | ||
Palavras-chave: psicanálise; referenciação; esquizofrenia. | ||
Anais da 57ª Reunião Anual da SBPC - Fortaleza, CE - Julho/2005 |