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F. Ciências Sociais Aplicadas - 4. Direito - 4. Direito Constitucional
“A incompatibilidade do rito das ações possessórias frente à natureza dos conflitos fundiários do Brasil”
Paulo Francisco Soares Freire 1 (pfsfreire@yahoo.com.br) e Elisabete Magnilia 1
(1. Universidade Estadual Paulista - Unesp)
INTRODUÇÃO:
A natureza dos conflitos fundiários no Brasil é de negação de direitos fundamentais a milhões de brasileiros que vivem no campo ou que foram expropriados do campo pelo aumento da concentração fundiária e, por conseguinte, da riqueza e também pela mecanização de alguns setores agrícolas. Estes atores sociais, políticos e jurídicos lutam não só para garantirem seus direitos, mas também pela efetivação do Estado Democrático de Direito para toda a sociedade brasileira.Tanto a doutrina quanto a jurisprudência defendem e aplicam o rito das ações possessórias previstas nos arts. 920 a 932 do CPC para “solucionar” os conflitos coletivos fundiários. Privilegiam, portanto, o instituto de propriedade em oposição aos inúmeros princípios sociais consagrados no pacto social de 1988.
A incompatibilidade não ocorre apenas no ramo da aplicabilidade dos direitos (choque entre o rito possessório nos conflitos fundiários e os direitos fundamentais), mas sobretudo entre a realidade histórica fundiária brasileira e a aplicabilidade dos direitos no Brasil.
Destarte deve haver um novo rito para as ações possessórias quando envolver conflitos coletivos pela terra, que a aproxime da realidade agrária brasileira. Mais do que isso, pois apenas mudar a lei processual não soluciona o problema, uma atuação crítico-dialética dos juristas frente a esta realidade, que permita enxergar os “excluídos” e “descamisados” do campo como legítimos defensores dos seus direitos e dos de toda sociedade.
METODOLOGIA:
O presente trabalho foi realizado em quatro etapas.
O levantamento hercúleo de bibliografia, doutrinária e jurisprudencial, acerca da natureza dos conflitos fundiários brasileiros.
Foi realizado estudos doutrinários e jurisprudenciais sobre a legislação processual das ações possessórias aplicáveis aos casos de conflitos agrários.
Uma abordagem comparativa entre a natureza dos conflitos coletivos fundiários e o rito das ações possessórias, utilizando-se principalmente bibliografia jurisprudencial.
Com base em todo material arduamente analisado e discutido foi elaborada uma proposta de um novo rito para estas ações.
Durante toda a realização do trabalho ocorreram análises da conjuntura agrária em conjunto com movimentos sociais e juristas da área.
Além do estudo teórico, colaborando para a utilização da metodologia dialética, também contei com a condição de extensionista do NEDA – Núcleo de Estudos de Direito Alternativo da Unesp Franca - e do NATRA – Núcleo Agrário Terra e Raiz da Unesp-Franca-SP (que, atualmente, desenvolve atividades no acampamento “Mario Lago”, localizado em Ribeirão Preto-SP e no acampamento “Iraci Salete Strozake”, localizado em Batatais-SP).
RESULTADOS:
Baseado nas análises da jurisprudência e da doutrina dominante pode-se observar a discrepância entre a aplicabilidade do Direito, referente às ações possessórias, e a realidade agrária brasileira, referente à natureza dos conflitos rurais do Brasil. Esta caracteriza-se por lutas por direitos constitucionalmente tutelados, tais como: direito à moradia (art. 6 da CF/88); ao trabalho (art. 1, IV, art. 6, art. 7 e art. 193 da CF/88); à educação (art. 6 e art. 205 da CF/88; Ex: 160000 alunos estudam nas 1800 escolas do MST, ao todo são 4000 professores); à dignidade da pessoa humana (art. 1, III da CF/88); de acesso à terra (art. 5, caput e art. 184 a 186 da CF/88, estes referem-se ao acesso ao imóvel rural que não cumpre sua função social); de exercer diretamente a democracia (art. 1, caput CF/88); à cidadania (art. 1 da CF/88); ao meio ambiente ecologicamente equilibrado (art. 225 da CF/88); à soberania (art. 1, I da CF/88); à justiça social (art. 193 da CF/88); entre outros como o direito a se alimentar adequadamente.
O conflito no campo ocorre com a reação de uma pequena parcela da população às ocupações, ou melhor, reage ao levante de trabalhadores e trabalhadoras rurais sem terra conscientes das injustiças e da opressão em que vivem e que continuarão a viver se não lutarem por seus direitos. O que demonstra também uma contradição técnico-jurídica, qual seja, a supervalorização do Código de Processo Civil em detrenimento da Constituição da República Federativa do Brasil.
CONCLUSÕES:
Refletir sobre a aplicação da legislação referente ao rito das ações possessórias nos casos de conflitos coletivos no campo brasileiro.
A extrema necessidade de um novo procedimento para as ações possessórias, condizente com a realidade agrária brasileira e com o pacto social firmado na Constituição da República Federativa Brasileira de 1988. Dessa forma a simples comprovação de posse (geralmente comprovada com o título de propriedade) e do esbulho para a concessão da liminar corresponde a uma disparidade do ramo de aplicação do Direito com a realidade conflituosa do campo brasileiro. Portanto, há uma extrema necessidade de modificar os arts. 920 a 932 do Código de Processo Civil brasileiro, incluindo nestes a oitiva do Ministério Público, legítimo defensor dos interesses coletivos da sociedade, antes da concessão da liminar; a realização de audiência preliminar entre as partes envolvidas no conflito antes da concessão da liminar; a comprovação pelo proprietário e pelos órgãos estatais, tais como INCRA, do cumprimento da função social do imóvel rural, objeto do litígio. Além destes objetivos, há outros mais gerais: contribuir com a luta pela Reforma Agrária e para a construção efetivamente democrática do Direito.
Trabalho de Iniciação Científica
Palavras-chave:  Direito; Reforma Agrária; Luta.
Anais da 57ª Reunião Anual da SBPC - Fortaleza, CE - Julho/2005