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G. Ciências Humanas - 9. Sociologia - 7. Sociologia | ||
POLICIAIS NOVATOS DENTRO DE UMA ANTIGA CORPORAÇÃO: LIMITES E POSSIBILIDADES DO CURSO DE FORMAÇÃO DE SOLDADOS DE FILEIRA | ||
John Robson Sousa Meneses 1 (johnrobsonc.sociais@ig.com.br) e César Barreira 1 | ||
(1. Departamento de Ciências Sociais, Universidade Federal do Ceará - UFC) | ||
INTRODUÇÃO:
As políticas de Segurança Pública vêm perdendo, em especial nos últimos dez anos, sua credibilidade junto à população. Pesquisas revelam que os principais motivos desse fracasso são o envolvimento de policiais em atos criminosos, bem como a má formação dos mesmos. Diante dessa situação, desde novembro de 2000, por pedido da Secretaria de Segurança Pública e Defesa do Social do Estado do Ceará, o Centro de Educação da Universidade Estadual do Ceará vem participando do processo de formação dos policiais militares, através do Curso de Formação de Soldados de Fileira, cuja ênfase se dá na ação reflexiva e crítica da realidade, pautada na ética e defesa intransigente da cidadania. No entanto, a Polícia Militar, enquanto instituição, ainda guarda várias marcas do período ditatorial brasileiro, dentre elas a violência direta (sob forma de ameaça e tortura a civis, por exemplo) e simbólica (esta mais vinculada às questões da hierarquização policial, da obediência forçada dos policiais novatos em relação aos antigos, etc). Além disso, o treinamento militar, bastante semelhante ao utilizado pelo Exército brasileiro, é direcionado mais à contenção imediata dos conflitos que à prevenção de crimes. Por tudo isso, cabe constatar os limites dessa proposta de formação em parceria com a Universidade. É nesse sentido que o presente trabalho, iniciado em janeiro de 2003 e concluído em julho de 2004, propôs-se a investigar como procede a aplicação desta educação no cotidiano da prática policial. |
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METODOLOGIA:
A metodologia utilizada compõe-se fundamentalmente, de pesquisa bibliográfica, documental e de campo. A análise teórica centrou-se no pensamento de autores como Michael Foucault, Norbert Elias, Clifford Geertz, Alba Zaluar. Obra de importância essencial para a pesquisa foi também o livro “A academia vai a Academia” (que descreve a experiência de alguns professores da Universidade Estadual do Ceará no Curso de Formação, que ocorre dentro dos quartéis). Os principais documentos analisados foram o novo Código Disciplinar da Polícia Militar do Ceará e o Regimento Disciplinar da Policia Militar. Escolhemos como lócus da pesquisa o Batalhão de Choque da Polícia, dado a maior vínculo deste com a questão do uso da força na contenção de conflitos populares. Em campo, optou-se pelo uso dos seguintes instrumentais: entrevista com os alunos do curso (durante e após o estágio supervisionado – período em que os policiais novatos são postos nas ruas, para atuação inicial, enquanto “aprendizes”), observação das aulas do Curso de Formação (tanto das disciplinas ministradas por professores civis quanto daquelas de responsabilidade dos instrutores militares) e aplicação de questionários, a uma amostra de 20% dos alunos do Batalhão de Choque (mesma porcentagem utilizada para a entrevista, que corresponde a um total de 25 alunos). |
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RESULTADOS:
Analisando as falas, contidas nas entrevistas, dos policiais novatos que participaram do Curso de Formação, pôde-se perceber que embora estes possuam uma consciência maior sobre sua função profissional (alguns policiais chegam a citar como uma de suas competências a realização de um trabalho educativo, preventivo, em relação ao uso de drogas e à violência urbana); terminam por reproduzir as mesmas práticas cotidianas dos policiais antigos, apesar de criticá-las. O principal motivo de tal contradição, revelam tais policiais nos questionários, está na obrigatoriedade de cumprimento do princípio hierárquico, que prevê o mando do mais velho sobre os demais (60% dos respondentes citam este fato), associada à sustentação da norma disciplinar (vale destacar que 35% destes consideram o Novo Código Disciplinar, já que baseado na punição exacerbada a todo tipo de conduta julgada irregular, como o maior empecilho ao desenvolvimento de um trabalho melhorado da polícia como um todo). Dados que servem de justificativa ao número elevado de policiais (67% dos respondentes) que afirmam não haver aplicabilidade dos conteúdos disseminados durante o Curso de Formação no estágio supervisionado ao que são submetidos. |
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CONCLUSÕES:
Os dados acima apontam algumas falhas no tocante ao desenvolvimento da ação policial. As condições materiais também denotam certa precariedade (notamos que faltam balas e coletes para o treinamento relativo ao uso e manuseio de armas de fogo, os alojamentos são pouco arejados, etc; além de que os direitos trabalhistas desses policiais são, muitas vezes, desrespeitados, passando-se a exigir dos mesmos horários de trabalho em regime de plantão, sem que seja efetuado pagamento de adicionais noturnos ou contagem de horas-extra). E, ainda, percebemos que a estrutura herdada do Exército no tocante à hierarquia e disciplina já não mais correspondem às novas exigências postas à política de Segurança Pública, às necessidades da sociedade contemporânea ou mesmo da própria polícia. Dadas estas condições, concluímos que o Curso de Formação de Soldados de Fileira, embora represente uma iniciativa louvável (que deve, portanto, ser repensada e aprimorada), não pôde surtir os efeitos esperados na turma de policiais do Batalhão de Choque da Polícia Militar do Ceará, especificamente no período em que foi desenvolvida a pesquisa de campo (ou seja, de janeiro a julho de 2004). |
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Palavras-chave: SEGURANÇA PÚBLICA; INSTITUIÇÃO MILITAR; HIERARQUIA MILITAR. | ||
Anais da 57ª Reunião Anual da SBPC - Fortaleza, CE - Julho/2005 |