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E. Ciências Agrárias - 1. Agronomia - 2. Economia e Sociologia Agrícola
ORGANIZAÇÃO DOS(AS) PRODUTORES(AS) AGRÍCOLAS DAS RESERVAS DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL MAMIRAUÁ E AMANÃ - CONTRIBUIÇÕES PARA O FORTALECIMENTO DA AGRICULTURA FAMILIAR RIBEIRINHA
Bianca Ferreira Lima 1 (bianca@mamiraua.org.br), Amintas Lopes da Silva Junior 1, Janaina de Aguiar 1, Kayo Julio Cesar Pereira 2, Márcio Alexandre da Silva 1 e Jó Marinho 1
(1. Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá - IDSM; 2. USP, Programa de Pós-Graduação Interunidades em Ecologia de Agroecossistemas)
INTRODUÇÃO:
O presente artigo discute alguns dos modos de vida característicos dos(as) agricultores(as) das Reservas de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá e Amanã (RDSM e RDSA), marcados por formas típicas de organização social, uso dos recursos naturais e ocupação do espaço. Portanto, procurou-se analisar, neste trabalho, as relações predominantes na organização da atividade produtiva, assim como alguns aspectos relacionados à obtenção de benefícios trabalhistas.

A produção agrícola nas RDSM e RDSA é um dos principais meios de sobrevivência da população local. É caracterizada pelo uso intenso dos recursos naturais e pela adoção quase nula de insumos externos. A agricultura é do tipo itinerante com mão-de-obra familiar. O manejo agrícola adotado é a derruba e queima da mata primária ou de capoeiras, para implantação dos agroecossistemas. Tanto em áreas de terra firme como de várzea predomina o cultivo da mandioca, a qual se constitui na principal fonte de carboidratos da dieta dos moradores das reservas.

As Reservas de Desenvolvimento Sustentável são áreas protegidas por lei que permitem a presença humana. Visam promover a conservação dos recursos naturais bem como a melhoria da qualidade de vida das populações que nelas habitam, respeitando as formas locais de organização e incentivando o manejo sustentável dos sistemas de produção. A RDSM foi implantada em 1996, e no ano de 1998, foi criada a RDSA. Juntas, totalizam cerca de 3.474.000 hectares.
METODOLOGIA:
Este trabalho foi desenvolvido em cinco comunidades da RDSM e em cinco comunidades da RDSA, que desde 2002 participam do monitoramento de agroecossistemas, envolvendo ao todo 164 famílias produtoras. A principal forma de coleta de dados foram entrevistas, realizadas por meio da aplicação de um questionário estruturado que aborda temas como a conversão anual de habitat para uso agrícola e permite acompanhar as atividades nas diferentes áreas de cultivo (roçados, quintais, praias, lamas, sistemas agroflorestais) e o processamento da produção (casas de farinha e cozinhas comunitárias), assim como identificar as formas e locais de escoamento da produção.

Foram escolhidas comunidades que se dedicam muito, pouco e quase nada à atividade agrícola. Também houve a realização de reuniões comunitárias e visitas às áreas de produção e beneficiamento, nas quais um a três agricultores(as) mostravam os caminhos e explicavam a organização do espaço e da produção.

Os dados coletados foram sistematizados em banco de dados em access e analisados em excel.
RESULTADOS:
Observou-se que na RDSA, as áreas destinadas aos roçados (em média 1,42 hectare por família) são maiores que na RDSM (0,27 ha por família). Isto se deve ao fato da RDSA possuir ecossistemas de terra firme na maior parte de sua área, enquanto na RDSM predomina a várzea, sujeita a inundações. No entanto, os agroecossistemas da RDSM são mais diversificados. A atividade de plantio em praias e lamas é mais intensa na RDSM, totalizando 0,14 hectares por família, enquanto na RDSA este número é de 0,08 hectares por família. Tanto na RDSA como na RDSM, os plantios e as colheitas feitas em praias utilizam exclusivamente mão-de-obra familiar, não havendo em nenhum momento mutirões comunitários. Isto difere dos plantios em outros ambientes, principalmente no que diz respeito às atividades de derruba da mata virgem e primeira capina do roçado, quando é necessária a ajuda dos vizinhos e organiza-se então o multirão, ou ajuri. Os ajuris são organizados pela família dona do plantio que fica responsável pela oferta das refeições durante o trabalho, e também se compromete em participar dos outros ajuris da comunidade.

Quanto aos direitos dos(as) agricultores(as) das RDSM e RDSA, estes são pouco conhecidos e usufruídos pelos(as) ribeirinhos(as). 33,54% dos entrevistados dizem não saber acessar os benefícios da previdência social, enquanto apenas 0,63% vão à cidade em busca destes. O restante procura prefeituras (11,39%) e sindicatos (8,64%), dentre outros (46,43%), na tentativa de obtê-los.
CONCLUSÕES:
A devolução dos resultados obtidos na pesquisa, realizada em reuniões comunitárias, proporcionou várias discussões entre as famílias produtoras. Este tipo de informação estimula o reconhecimento da identidade de agricultor(a), além da reflexão a respeito das práticas agrícolas e do gerenciamento dos sistemas produtivos. Em decorrência, o planejamento para o desenvolvimento e concretização de ações de extensão rural passa a levar mais em consideração as demandas locais. Neste contexto, após o retorno das informações coletadas, e conseqüente reflexão realizada, as comunidades têm visto a necessidade de maior organização e luta para obtenção e usufruto dos direitos trabalhistas. Muitos avanços e conquistas já estão sendo alcançados neste sentido.

Na maioria das famílias, principalmente naquelas em que não há compra de farinha (indicador comunitário para saber se a família é dedicada ou não à atividade agrícola), qualquer membro da família pode informar a respeito dos agroecossistemas. Mulheres, homens e crianças (fora do período escolar e em menores proporções) são capazes de tomar decisões relacionadas ao manejo de seus sistemas agrícolas e executam tarefas em diversas etapas das cadeias produtivas. As maiores dificuldades estão relacionadas com a comercialização dos produtos dentro de uma economia solidária, pois o histórico de venda para os patrões e regatões na Amazônia são heranças que muitas comunidades ainda procuram mudar.
Instituição de fomento: IDSM/OS-MCT e Petrobras
Palavras-chave:  Agricultura Familiar; Populações tradicionais; Unidades de Conservação.
Anais da 57ª Reunião Anual da SBPC - Fortaleza, CE - Julho/2005