IMPRIMIR VOLTAR
G. Ciências Humanas - 7. Educação - 15. Formação de Professores (Inicial e Contínua)
O papel da produção escrita para a formação do Pedagogo
Maíra de Araújo Mamede 1 (maira@unb.br) e Erika Zimmermann 1
(1. Pós-Graduação em Educação - Faculdade de Educação - UnB)
INTRODUÇÃO:
Os índices alcançados pelo Brasil tanto em avaliações nacionais, como o SAEB, quanto em avaliações internacionais, como o PISA, demonstram a preocupante realidade da educação brasileira. No âmbito do ensino de ciência, a questão agrava-se pela falta de formação específica dos professores das séries iniciais e pela transformação sobre a visão da ciência em nossa sociedade, a partir da pós-modernidade. Neste sentido, esta pesquisa tem por objetivo contribuir para a melhoria da formação disciplinar no pedagogo, pautada em um modelo reflexivo e autônomo da profissionalidade docente, através da inclusão de práticas de produção textual na formação inicial. Buscamos apoio na literatura especializada sobre ensino de ciências, notadamente na abordagem Ciência, Tecnologia e Sociedade, que busca restabelecer os vínculos entre o conhecimento científico e tecnológico e as implicações sociais subjacentes, para promover ao letramento científico dos alunos. Para que isso ocorra, é preciso, contudo, que o próprio professor desenvolva uma outra relação com o conhecimento científico, problematizando dogmas relacionados à Ciência, como sua neutralidade, sua objetividade e sua inquestionabilidade. Acreditamos que a produção textual possa servir como instrumento de formação docente, ao permitir um maior distanciamento do professor frente a suas próprias concepções e facilitar, assim, a reflexão.
METODOLOGIA:
O estudo, fundamentado na abordagem naturalística, constitui-se em uma pesquisa-ação, realizada ao longo de um semestre na disciplina de Metodologia de Ensino de Ciências e Tecnologia para início de Escolarização, do curso de Pedagogia em uma Universidade Pública. A partir de uma perspectiva colaborativa com a professora responsável pela disciplina, realizou-se uma intervenção no processo de produção escrita dos futuros pedagogos, com o objetivo de mediar a relação que estes têm com a ciência, levando-os a refletir sobre a natureza do saber que eles deverão ensinar. A disciplina organizou-se em três etapas: discussão acerca da filosofia da ciência, aspectos relevantes do ensino de ciências e elaboração de um projeto de ensino de física para as séries iniciais. Os dados foram coletados através da observação das aulas, da análise do currículo do curso e da ementa da disciplina, bem como da análise dos textos produzidos pelos alunos, individual e coletivamente, ao longo de todo o semestre. Cada texto produzido passava pela correção da professora e pela análise da pesquisadora, podendo ser reescrito pelos alunos.
RESULTADOS:
Através da análise das produções escritas, pudemos perceber a primazia de textos do tipo narrativo/descritivo; os alunos limitaram-se a recontar as situações que tinham sido vistas, sem proceder à análise crítica do que tinham visto. Outro aspecto relevante foi a utilização recorrente de jargões do campo pedagógico, sem uma problematização das situações. Palavras como “vivenciar”, “experienciar”, “contextualização” e “conhecimentos prévios” estão presentes na grande maioria dos textos, mas não há qualquer discussão sobre os objetivos pedagógicos que estão subjacentes a estes conceitos. Houve ainda algumas contradições pedagógicas no discurso dos alunos, que se valeram de terminologias de correntes pedagógicas diversas e mesmo antagônicas. Estão presentes em um mesmo texto, por exemplo, as idéias de que o aluno “constrói o conhecimento” e de que o professor deve “passar o conhecimento”, ressaltando um discurso contraditório. Quanto ao vocabulário, outro elemento interessante foi a recorrente utilização de palavras, sem uma clareza quanto a seu significado, como no caso onde houve uma confusão entre “senso comum” e “consenso”. Acreditamos que este fato seja decorrente da imaturidade dos alunos, que, em sua maioria, encontram-se no terceiro semestre da graduação. Ao longo do semestre, percebemos, contudo uma mudança de postura dos alunos frente à ciência e uma maior preocupação com a produção de textos.
CONCLUSÕES:
A cultura finalista da avaliação que permeia o processo de ensino-aprendizagem ao longo de toda escolarização influi diretamente nas atividades realizadas pelos alunos. Os textos eram elaborados com o único objetivo de prestar contas à professora das atividades realizadas e constituíam-se em relatórios. Os alunos escreviam aquilo que achavam que a professora gostaria de ler e permaneciam em um nível superficial de reflexão sobre os assuntos tratados. A mudança dessa cultura exigiu um tratamento cuidadoso da questão, no qual se estimulou nos alunos o desenvolvimento da autoria em seus textos, pelo respeito às colocações trazidas, independentemente da postura epistemológica da professora. Evidenciou-se, ainda, a importância do trabalho de orientação da professora e da pesquisadora junto aos alunos durante todo o processo de produção textual, especialmente durante a reescrita dos textos, prática que não costuma ser habitual no ensino superior, onde os textos são utilizados principalmente para fins avaliativos e quase nunca para fins de aprendizagem. Acreditamos que a transformação desta realidade passe por uma mudança de cultura em relação à produção textual no interior dos cursos de graduação, especialmente por parte dos professores, que devem estar conscientes da importância de seu papel de mediador da construção da autonomia e da reflexividade de seus alunos.
Instituição de fomento: CAPES
Palavras-chave:  formação docente; produção textual; ensino de ciências.
Anais da 57ª Reunião Anual da SBPC - Fortaleza, CE - Julho/2005