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F. Ciências Sociais Aplicadas - 4. Direito - 8. Direito Internacional
A JUSTIÇA MILITAR NO BRASIL E O DIREITO INTERNACIONAL DOS DIREITOS HUMANOS
Ana Luisa Gomes Lima 1 (analu_gomeslima@hotmail.com), Ana Paula Morais Galvão 1, Camila Colares Bezerra 1, Lívia de Oliveira Revorêdo 1 e Lucas Galvão de Britto 1
(1. Graduando, Curso de Graduação em Direito, Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN.)
INTRODUÇÃO:
Apenas na Comissão Interamericana de Direitos Humanos, já foram apresentados sete denúncias, em desfavor do Estado brasileiro, envolvendo crimes cometidos por policiais militares contra civis. Em todos os casos, observa-se o cometimento de crimes brutais, na maioria execuções sumárias, que, embora tenham sido investigados por instituições militares, permanecem impunes. Conforme Relatório 2004 da Anistia Internacional, em 2003, foram mortos 915 civis em conflitos com a polícia do Estado de São Paulo, demonstrando um aumento de 11% em relação ao ano anterior. Já no Rio de Janeiro, entre janeiro e novembro de 2003, o número de civis mortos pela forças policiais do estado atingiu a marca de 1.195 pessoas – um acréscimo de 32,7% em relação ao mesmo período de 2002. Diante da crescente violência e relatos de constante impunidade, busca-se através desta pesquisa avaliar a situação da Justiça Militar no Brasil e seus efeitos sobre a proteção e promoção de direitos e garantias fundamentais, especialmente no que concerne à população civil. Objetiva-se analisar a normativa internacional dos direitos humanos a qual o Brasil está obrigado a respeitar, mais especificamente no tocante às garantias e proteção judiciais, bem como verificar se há o efetivo cumprimento dessas disposições, por parte do Estado brasileiro, enquanto persiste em permitir em seu território que sob a jurisdição militar estejam a investigação e o julgamento de crimes perpetrados por militares contra civis.
METODOLOGIA:
A pesquisa foi iniciada com a leitura de periódicos, artigos e livros jurídicos, para fins de compreender o funcionamento da Justiça Militar no Brasil. Concomitantemente, verificou-se tratados e declarações de âmbito internacional, com vistas a estabelecer a normativa à qual estaria subordinado o Estado brasileiro. A partir daí, buscou-se analisar estatísticas e casos concretos, visando, assim, constatar a compatibilidade, ou não, desse sistema de investigação e julgamento com o Direito Internacional dos Direitos Humanos. A pesquisa, então, de modo mais detalhado, estendeu-se à análise dos casos que envolvem a justiça militar e tramitam contra o Estado brasileiro na Comissão Interamericana de Direitos Humanos, a saber: Aluisio Cavalcanti; Parque São Lucas; Diniz Bento da Silva; Eldorado dos Carajás; Jailton Néri; Edson Damião Calixto; e, Carandiru. Neste ponto, verificamos não apenas as denúncias per si, como também as manifestações do Estado em relação à temerária suscitada, suas justificativas e metas para solucionar o problema. A pesquisa foi limitada ao sistema interamericano em virtude de inexistir denúncia dessa espécie tramitando nos órgãos de monitoramento das Nações Unidas. Por fim, pesquisamos os supostos avanços na legislação pátria e as políticas desenvolvidas pelo Estado com vistas a sanar a violência policial e a impunidade que acometem o país.
RESULTADOS:
Os tratados internacionais ratificados pelo Brasil fazem-no obrigado a respeitar, e fazer respeitar em seu território, as garantias judiciais e o direito a um julgamento justo, por tribunal independente e imparcial. Todavia, a legislação pátria não condiz com esses compromissos assumidos. Atualmente, promulgada a Lei n.° 9.299/96, a competência para julgar os crimes dolosos contra vida cometidos por militares contra civis pertence à justiça comum. Permanecem sob a jurisdição militar diversos outros crimes como rapto, seqüestro, lesões corporais de todas as naturezas, torturas, e até mesmo crimes contra a vida de civis, desde que considerados culposos. Neste contexto, destaque-se que o apontamento de um crime como sendo intencional ou não também compete à própria Justiça Militar, uma vez que sob seus auspícios estão as investigações das ocorrências. O inquérito policial militar é, muitas vezes, objeto de falhas e fraudes, havendo casos de ausência de laudos médico-legais e de ouvida de testemunhas civis, assim como violação do local do crime. As cortes militares de primeira instância - auditorias militares - são compostas por quatro oficiais das forças armadas ou da polícia militar, obrigatoriamente da ativa, e um juiz civil, o único que deve ter necessariamente formação acadêmica em Direito. Comumente, o réu é julgado por colegas os quais já julgou anteriormente no mesmo tribunal. Na instância superior, dos quinze membros do órgão colegiado, apenas cinco são juízes civis.
CONCLUSÕES:
Por diversas vezes, alegou o Estado brasileiro que a problemática da Justiça militar seria tratada quando da promulgação da Reforma do Judiciário. Entretanto, até a presente data, mesmo com o advento da referida lei, não houve mudanças significativas em relação a esta matéria desde a entrada em vigor da Lei 9.229/96, esta sem capacidade efetiva de reduzir a impunidade. Considera-se a jurisdição penal militar necessária, porém, em um estado democrático de Direito, esta deve ter caráter restritivo e excepcional, devendo sua competência restringir-se ao julgamento de crimes relativos a bens jurídicos próprios da ordem militar. Desse modo, crimes cometidos por militares contra civis, sejam dolosos ou não, ultrapassam as funções militares, devendo ser investigados e julgados pela justiça comum, sob pena de se violar o direito a um julgamento por tribunal justo e imparcial, bem como as garantias judiciais do devido processo legal. Este quadro de impunidade e violação sistemática de direitos fundamentais que ocorre no Brasil somente poderá reverter-se com a devida mudança na legislação nacional, com a extinção da competência da Justiça Militar sobre todo e qualquer crime cometido contra civil. Até a concretização de medidas mais efetivas por parte do Estado, estas não apenas de caráter legislativo, os índices de violência policial só tendem a aumentar, restando seus perpetradores novamente impunes.
Palavras-chave:  Direito Internacional; Direitos Humanos; Justiça Militar.
Anais da 57ª Reunião Anual da SBPC - Fortaleza, CE - Julho/2005