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F. Ciências Sociais Aplicadas - 10. Documentação e Informação Científica - 1. Documentação e Informação Científica
TORTURA, IMPRENSA E SILÊNCIO:O ACESSO À INFORMAÇÃO, À DOCUMENTAÇÃO E À MEMÓRIA
Maria Luiza de Castro Muniz 1 (mlcmuniz@yahoo.com.br) e Icléia Thiesen Magalhães Costa 2
(1. Graduanda do Depto. de História, Universidade do Rio de Janeiro - UNIRIO.; 2. Profa. Dra. do Depto. de História, Universidade do Rio de Janeiro - UNIRIO)
INTRODUÇÃO:
Decorridos quarenta anos do golpe militar de 1964, ganham força batalhas jurídicas que há anos tramitam pelos tribunais. Menos que uma luta por indenizações, anistias ou acesso à documentos secretos, são reações ao esquecimento e ao silêncio. A busca de informações sobre o passado recente no Brasil entra em jogo para trazer à tona o que ficou apagado ou rasurado nos escaninhos da memória oficial. O presente trabalho é fruto de pesquisa sobre a ditadura militar no Brasil, bem como a atuação da imprensa na conjuntura socioeconômica e política nas décadas de 1960 e 1970. Este trabalho tem por objetivo analisar o papel da imprensa junto à sociedade destacando, por um lado, a atuação de agentes sociais que, militando à esquerda, construíram uma ponte entre o espaço da redação e da prisão. De outro, caracterizar a reação da classe média à intensa propaganda anticomunista. Cumpre analisar em que medida as estruturas de poder utilizadas pelo Estado dialogam com a lógica da produção da notícia e os efeitos desta relação sobre os rumos do país.
METODOLOGIA:
A história oral é adotada como procedimento metodológico, sendo necessária a percepção crítica da forma como se dá a re-elaboração do passado segundo cada entrevistado - jornalistas e descendente de dirigente do PC do B. Dessa forma, buscamos subsídios para pensar a sociedade brasileira no referido período, sob o prisma das “memórias subterrâneas”. Partindo da premissa de que a memória é seletiva, a metodologia da história oral é aplicada no sentido de relacionar os elementos que determinam a articulação dessa memória ao contexto mencionado. Assim, analisamos a memória como um fenômeno construído coletivamente e submetido a flutuações, transformações, mudanças. Entendendo que a história oral é constituída por três dimensões, valorizamos a interdependência entre prática, metodologia e teoria de maneira a produzir o conhecimento histórico. Focalizamos a redação do jornal - onde produção de notícia e censura dividiam o mesmo lugar - e a prisão, onde ocorriam as práticas de tortura como parte das estruturas institucionalizadas de poder e as coletas de informação. Para tanto, o jornalista vítima da tortura ganha status de elemento unificador, cuja memória é privilegiada nesse trabalho, pelo duplo papel ocupado entre a redação e o espaço prisional, a vida legalmente estabelecida e a clandestinidade.
RESULTADOS:
A análise das narrativas e as leituras nos permitiram verificar que nos anos anteriores ao golpe havia jovens ativos, politicamente engajados em jornais estudantis, reunidos em centros acadêmicos que refletiam a diversidade de opiniões existente na sociedade. Para os entrevistados, o início dos anos 60 ficou marcado como um período de intensa ebulição intelectual. Contudo, esta foi interrompida bruscamente, como será mostrado, por uma polarização forjada e pela repressão militar. Segundo constatamos, a pluralidade de opiniões, de posições partidárias e especialmente de linhas editoriais dos jornais foi praticamente reduzida a duas propostas antagônicas. Com base nos depoimentos analisados, ressaltamos o respaldo da classe média para a ação militar, análogo e complementar àquele fornecido pela imprensa. As experiências vivenciadas pelos entrevistados na redação ou no espaço prisional indicam que mecanismos de vigilância e disciplina atuaram simultaneamente através dos órgãos de informação e repressão do governo. Contudo, verificamos uma “cultura do silêncio”, se sobrepondo às diversas formas de resistência ao regime. Por fim, ressaltamos o papel do espaço na obtenção de informações por meios do uso legitimado dos aparelhos de repressão.
CONCLUSÕES:
As radicalizações, tanto à esquerda quanto à direita, resultaram na “memória subterrânea” e em um esquecimento que foi socialmente construído. Logo, a memória oficial se impôs, não só por meio da repressão, mas pelo caráter pacificador da transformação lenta, gradual e segura das estruturas ditatoriais. A reconstrução da memória dos entrevistados compreendeu considerações acerca dos movimentos de resistência, da intolerância em relação às diferenças de opinião que acabaram fragmentando e enfraquecendo partidos e organizações, dos rumos comerciais que o jornalismo seguiu. Suscitou, ainda, discussões que apontam para a necessidade de se analisar como ocorreu o processo de distensão do regime e suas conseqüências para a vida política, econômica e social do país. Enfim, cumpre considerarmos a atuação, tanto dos meios de comunicação, quanto de um determinado segmento da sociedade civil na construção de uma memória nacional, num processo de disputa ainda pouco estudado.
Trabalho de Iniciação Científica
Palavras-chave:  informação e memória; silêncio na imprensa; história oral.
Anais da 57ª Reunião Anual da SBPC - Fortaleza, CE - Julho/2005