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D. Ciências da Saúde - 3. Saúde Coletiva - 4. Saúde Pública
CONCEPÇÕES E DILEMAS DA SEXUALIDADE MASCULINA EM TEMPOS DE AIDS
Sílvia Maria Nóbrega-Therrien 1 (silnth@terra.com.br) e Laurinete Sales de Andrade 1
(1. Depto. de Saúde Pública da Universidade Estadual do Ceará-UECE)
INTRODUÇÃO:
Este estudo analisa as representações sociais sobre a sexualidade masculina no contexto da epidemia do HIV/Aids. A epidemia caracterizou-se pelo seu modo avassalador e ao mesmo tempo pelo seu caráter mutante. Com o passar do tempo o quadro epidemiológico sofreu mudanças e novos atores passaram a ser incorporados ao perfil da doença. Os heterossexuais passaram a fazer parte dos portadores de HIV. Com essa nova realidade, consolidou-se a idéia do doente vítima, ou seja, pessoas com comportamentos “aceitos” socialmente e que são também atingidos pelo vírus. A população masculina heterossexual ainda é pouco enfocada quando se trata da prevenção ao HIV/Aids. Os homens são colocados somente como transmissores, no entanto se eles estão transmitindo o vírus do HIV é porque estão também se infectando. Nesse sentido, é imprescindível que se busque entender também que fatores influenciam a vulnerabilidade masculina heterossexual ao HIV. O fato de o homem culturamente ser considerado numa posição de poder em relação às mulheres os tem colocado como os grandes vilões da epidemia. Neste sentido, fez-se necessário, estudar, pesquisar e buscar caminhos para compreender o que tem tornado os homens também vulneráveis ao HIV. À luz dessas questões levantadas o objetivo deste trabalho é apreender as representações sociais de homens heterossexuais e sua relação com o contexto epidêmico da Aids.
METODOLOGIA:
A abordagem desse estudo é de natureza qualitativa, com caráter descritivo e exploratório. Teve como referencial teórico a Teoria das Representações Sociais (TRS), visto que, os fatos, as idéias, o senso comum e as ações dos sujeitos são imbuídos de significados e intencionalidades referentes aos atos, às relações e às estruturas sociais. O local da pesquisa foi um hospital público que funciona como centro de referência no atendimento às DST/HIV/Aids na cidade de Fortaleza. Os sujeitos pesquisados foram os homens que se auto-identificaram heterossexuais, com idade acima de 18 anos. Não importou para o enfoque da pesquisa que estes homens exercessem também práticas sexuais com outros homens, o que se levou em conta foi a sua concepção de identidade. Dessa forma, o critério utilizado para escolha dos sujeitos foi o aceite dos mesmos em participarem da pesquisa, a auto-identificação com a heterossexualidade e não se declararem doentes de Aids nem soropositivo para HIV. Utilizamos a entrevista buscando estabelecer um clima de confiança entre participantes. Foram realizadas 10 entrevistas, seguindo o critério de saturação teórica. Os dados foram analisados através da análise de conteúdo. Os sujeitos estudados foram informados sobre os objetivos da pesquisa e aos que aceitaram participar do estudo foi assegurado o anonimato. O projeto do estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade Estadual do Ceará.
RESULTADOS:
A sexualidade masculina é revelada como algo incontrolável, portanto, fora do controle do homem, sendo ancorada como algo natural e biológico. Essa questão aparece como uma legitimação da natureza masculina. A concepção de sexo como incontrolável reafirma a condição de homem como ser viril, gerando satisfação de um modo geral. Por ser considerado um ato indomável, um instinto, esse comportamento dificulta a prevenção ao HIV/Aids. Diante da necessidade do prazer e do descontrole do seu corpo, o homem não se contém e têm relações desprotegidas. O uso da camisinha aparece predominantemente como uma das formas mais seguras de enfrentar a vulnerabilidade ao HIV/Aids. Em sua falas os entrevistados colocam a importância da camisinha em suas vidas, mas a utilização cotidiana da mesma ainda se apresenta como um processo doloroso, difícil, que altera para eles a sexualidade masculina.. Ao se reportarem a Aids, o medo foi um sentimento que se destacou. A possibilidade de ser infectado gera preocupação, pois, a Aids é representada com grande pavor. O fato da Aids não ter cura e a possibilidade do contágio aparece como uma catástrofe que não deve muitas vezes se quer ser comentada. A Aids aparece ancorada em doenças antigas como o câncer, a lepra e a peste. Os entrevistados colocam que a proximidade com uma pessoa conhecida, com os sintomas, com o tratamento e muitas vezes com a morte, significa um confronto real com a possibilidade de adquirir a doença.
CONCLUSÕES:
A sexualidade foi revelada como “incontrolável” por uma condição natural do homem. Essa naturalização da sexualidade dá subsídios para justificar alguns atos atribuídos aos homens como o fato de terem múltiplas parceiras e serem infiéis. Apesar dos discursos revelarem que vivenciaram relações de risco e mostrarem preocupação e interesse na prevenção da Aids, os entrevistados se colocam distantes diante da real possibilidade de vir a ter Aids. A doença é representada como a “doença do outro”. O peso da doença é revelado quando atrelam a esta os sentimentos de medo, angústia e sofrimento. O uso da camisinha aparece como uma alternativa, porém, problemática, porque traz implicações no prazer sexual. Quando o homem não quer usar o preservativo, ou ter múltiplas parceiras, ele está assumindo papéis culturais e os percebendo como naturais. È preciso que esses significados sejam percebidos como construções históricas e sociais, pois somente a partir daí poderá se desconstruir as normas das relações de gênero.A sexualidade precisa ser problematizada e percebida como uma construção histórica e social. As políticas de saúde precisam implementar ações que proporcionem estas descobertas, para isto, é necessário primeiro que se identifiquem as relações de gênero que permeiam o nosso meio social, e a partir daí sejam elaboradas e implementadas estratégias de prevenção ao HIV/Aids.
Palavras-chave:  Sexualidade; Homem; Aids.
Anais da 57ª Reunião Anual da SBPC - Fortaleza, CE - Julho/2005