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D. Ciências da Saúde - 3. Saúde Coletiva - 3. Saúde de Populações Especiais | ||
EDUCAÇÃO FÍSICA E SAÚDE MENTAL | ||
Felipe Wachs 1 (felipewachs@hotmail.com) e Márcio de Almeida Malavolta 1 | ||
(1. Escola de Saúde Pública do Rio Grande do Sul) | ||
INTRODUÇÃO:
A Educação Física tem ganhado, ao longo dos anos, cada vez maior espaço e atenção em aspectos relativos à saúde. As práticas associadas à educação física comumente podem ser chamadas de promotoras de saúde, extrapolando a simples lógica de prevenção que conceituava saúde como ausência de doença. A apropriação de um conceito ampliado de saúde permite que ela ocupe papel destacado nas práticas sociais que vão desde as mais diversas atividades de lazer à reabilitação física de cardiopatas. No entanto, os profissionais de educação física estão muito mais associados à promoção de saúde ou prevenção de doenças do que a reabilitação. Dificilmente atuam em hospitais na atenção terciária à saúde. Nossa pesquisa foi desenvolvida com pessoas em fase aguda de sofrimento psíquico internadas no Hospital Psiquiátrico São Pedro. Problematizamos em nossa pesquisa quanto o hospital psiquiátrico age em sua atenção/tratamento dos pacientes de forma a reforçar a fragmentação de seus corpos, sintoma já presente na psicose. Analisamos, através de uma pesquisa-ação, se uma oficina de corporeidade contribuiria na reabilitação psicossocial dos indivíduos participantes ao possibilitar um espaço terapêutico que abordasse um indivíduo não dissociado em corpo e mente. Merleau Ponty (1999) diz que o corpo não é apenas espaço corporal, entendido como corpo inteiro, posse indivisível de partes que se relacionam de maneira original, mas também, e principalmente, corpo que habita o espaço e o tempo, assumindo-os, dando-lhes significação original. Como objetivos específicos tivemos: possibilitar um espaço de consciência corporal no interior de um hospital psiquiátrico, (re)construir potências de sujeitos, produzir estranhamento nas equipes e na instituição em relação a uma outra forma de tratar. |
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METODOLOGIA:
A metodologia adotada é de pesquisa-ação, um tipo de pesquisa social com base empírica que é concebida e realizada em estreita associação com uma ação ou com a resolução de um problema coletivo e, no qual, os pesquisadores e os participantes representativos da situação ou do problema estão envolvidos de modo cooperativo ou participativo (Thiollent, 1985). De tal forma que operacionalizamos uma atividade que abordasse o corpo de forma integrada afim de verificar sua contribuição na reabilitação de indivíduos em sofrimento psíquico agudo. A participação na oficina é aberta, não existe uma seleção por patologias ou qualquer tipo de pré-requisito para participar. Existe, dessa forma, um respeito pelas características psicóticas dos participantes. Há peculiaridades desse grupo como participantes entrarem e saírem da sala durante atividades, desvio de atenção, falas em momentos inadequados, intervenções delirantes, fugas de idéias, procura por atenção constante, que são levados em consideração na própria organização e metodologia de trabalho. Os grupos são formados por um número médio de 15 pessoas, com idade entre 18 e 60 anos com encontros semanais tendo uma hora de duração. Outra importante característica que influenciará o planejamento do grupo é que a média de tempo de internação no hospital é de 30 dias, impossibilitando uma intervenção de longo prazo e proporcionando uma grande rotatividade dos participantes. A organização das atividades é feita valorizando cada encontro como finalidade terapêutica em si, onde ao final é realizada uma avaliação em conjunto com os participantes. O instrumento utilizado para coleta de dados foi diário de campo e revisão de prontuários, onde coletou-se informações referentes a produção de saúde nos usuários, impressões nossas e da equipe. |
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RESULTADOS:
Apesar da instituição manicômio estar estruturada de forma a fragmentar o indivíduo em corpo e mente, com a inserção da oficina de corporeidade, através de atividades corporais, foi possível verificar movimentos no sentido de uma abordagem mais holística de tratamento e da valorização de aspectos saudáveis tão ignorados em uma instituição que reflete o tratamento centrado na doença. Verificamos que a oficina pôde servir de espaço continente à crise/sofrimento psíquico presentes na internação, mas também agir de forma pró-positiva no ser-no-mundo fora dos muros do manicômio. Durante as oficinas foi possível realizar leituras corporais dos sintomas que os indivíduos não estavam conseguindo verbalizar ou que não estavam sendo percebidos no momento de uma entrevista/consulta. Através do acompanhamento do plano terapêutico aplicado a cada um dos participantes da oficina foi possível observar a regressão dos sintomas da psicose, principalmente os relacionados a percepção corporal e a dissociação corpo e mente. Quando surgiram ou foram abordadas atividades onde, por exemplo, relacionou-se estar deprimido e sentir o corpo pesado, ou estar agitado, com raiva e "quebrar a casa", pudemos observar uma estruturação de outras defesas e a melhor utilização de recursos do ego. Durante a crise, onde o sujeito sofre intensamente e o corpo está em profundo desmantelamento, foi importante poder abordar o sujeito de maneira que a esse fosse possibilitado uma reflexão sobre as percepções de si, do outro e do mundo. |
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CONCLUSÕES:
Verificamos que um espaço que aborde a corporeidade é de suma importância como uma tecnologia de atendimento em saúde mental e contribui na reabilitação psicossocial de indivíduos em sofrimento psíquico. A realização da mesma em um hospital psiquiátrico provocou estranhamento e gerou movimentos em uma instituição e em equipes que costumam trabalhar em uma lógica dissociativa dos indivíduos. Durante a construção do plano terapêutico dos usuários passou a existir o reconhecimento da oficina por parte das equipes como um instrumento relevante para o tratamento. Foi possível através da pesquisa-ação, onde construímos uma oficina de corporeidade, analisar como positiva, a partir dos resultados obtidos, uma prática que parte de um corpo uno onde cada pessoa percebe e significa o mundo, é percebida e significada, relaciona-se, expressa-se, assume posturas e papéis. Existe uma valorização do indivíduo, sua individualidade e subjetividade, suas necessidades, direitos, obrigações, seguindo uma lógica de alternativas mais participativas e inclusivas. Desta forma acreditamos numa intervenção que através do corpo possibilite a constituição de subjetividades. A realização de técnicas corporais provocou movimentos/dinâmicas, que não apenas movimento físico, mas movimentos na forma como o sujeito se percebe, vê-se, relaciona-se, posiciona-se. É, partindo dessa premissa, que as atividades e o desenvolvimento da oficina obtêm caráter terapêutico. Nos casos que foram acompanhados de participantes da oficina foi possível verificar a minimização do sofrimento durante a internação em um “manicômio”. Concluimos ao final desse processo de pesquisa-ação que a relevância de um trabalho corporal permite que possamos pensar em uma clínica da educação física no atendimento a pessoas em sofrimento psíquico. |
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Instituição de fomento: Escola de Saúde Pública do Rio Grande do Sul | ||
Palavras-chave: educação física; saúde mental; corporeidade. | ||
Anais da 57ª Reunião Anual da SBPC - Fortaleza, CE - Julho/2005 |