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G. Ciências Humanas - 4. Geografia - 2. Geografia Regional
ASSENTAMENTOS RURAIS, MUDANÇA NO USO DO TERRITÓRIO E ACUMULAÇÃO CAPITALISTA
André Vasconcelos Ferreira 1 (vf.andre@ig.com.br), André Lima Sousa 2 e Walquíria Krüger Corrêa 1
(1. Depto. de Geografia, Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC; 2. Depto. de Economia, Universidade Federal do Ceará - UFC)
INTRODUÇÃO:
O espaço rural brasileiro tem se definido prioritariamente pela ação de grandes agentes capitalistas que, na atualidade, conquistaram grande acesso aos territórios periféricos de países como o Brasil. Sob o impacto da mundialização do capital, a reprodução dos trabalhadores rurais ficou ainda mais comprometida. É de se questionar o fato de um setor dos trabalhadores ter se mantido no campo, enquanto outros tantos são expulsos pela territorialização capitalista, cuja atividade não privilegia a manutenção de postos de trabalho e tende a expropriar os pequenos e médios proprietários pela dependência, ou pela força, que lhes impõe. Há de se indagar, sobretudo, acerca das estratégias de reprodução de um setor de trabalhadores rurais, em princípio desprovido de qualquer privilégio político-econômico, entretanto, capaz de ampliar o espectro de sua territorialização. Estamos tratando, em particular, dos trabalhadores rurais cuja intervenção social na condição de sujeito coletivo deu vida ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra e indagamos a realidade sobre as estratégias sócio-espaciais do MST, que levaram o referido Movimento a uma expressiva territorialização, em tempos de um grande império burguês que lhes impõe sérios obstáculos. A importância desse estudo se apresenta quando se discute, e se tem necessidade de mais discutir, possíveis soluções para a situação caótica de miséria e desigualdade social a que nos levaram nossas estratégias de desenvolvimento.
METODOLOGIA:
Os procedimentos adotados na pesquisa visam reconhecer, na materialidade histórica, o uso do território, conforme Santos (2002), praticado pelas ações do MST, com particular referência às ações e estratégias praticadas pelo Movimento no processo que envolve a territorialização do Assentamento Sepé Tiaraju, em Campos Novos – SC. Para tanto, lançamos mão de uma ampla revisão bibliográfica, considerando a problemática camponesa na sua relação com a territorialização capitalista e, também, de um conjunto de informações primárias e secundárias acerca das ações e relações praticadas pelo MST, sobretudo, pelos integrantes do Assentamento citado. No caso das informações primárias, recorremos à realização de entrevistas semi-estruturadas, com o auxílio de um gravador, envolvendo 10 das 15 famílias assentadas no Sepé Tiaraju, além de um membro da Direção Nacional do Movimento. Também foram colhidas informações por meio de um bloco de anotações durante as visitas de campo realizadas, que foram: três delas ao próprio Assentamento Sepé Tiarajú; uma a Chapecó-SC, onde está sediada a Secretaria Estadual do MST, que dispõe de uma biblioteca; e outra a Abelardo Luz-SC, onde registramos uma das manifestações de massa do Movimento. No mais, recorreu-se a um arquivo digital cedido pelo Incra-SC para a elaboração de um mapa de localização do referido Assentamento. Por fim, produzimos informações visuais utilizando de uma série fotográfica registrada no Assentamento, e em outras ações do MST.
RESULTADOS:
As fontes de informações da pesquisa demonstram a incidência de diferentes formas de cooperação e intercâmbio praticadas pelos integrantes do MST, em particular, os Assentados do Sepé Tiaraju que permitem vislumbrar o conteúdo das estratégias de desenvolvimento e territorialização do Movimento Sem Terra mediante os seguintes aspectos: 1. Relativa diversificação produtiva, com o fim de obter uma produção para auto-consumo, incluindo a segurança alimentar e a obtenção de insumos para a redução de custos produtivos e de consumo dos Assentamentos, uma produção mercantil capaz de gerar renda mensal e sazonal, além da produção da chamada “poupança viva” visando a acumulação de recursos naturais para eventuais necessidades; 2. Importância das ações mediadas por intercâmbios solidários, desde a luta pela obtenção do título de propriedade da terra, realizada através de ocupações, acampamentos e manifestações em prédios e vias públicas, até a cooperação praticada pelos Assentados com os outros integrantes do Movimento e demais setores da sociedade; 3. Ênfase na estratégia de formação educacional dos integrantes do MST em diferentes níveis, passando pelo ensino fundamental, ciranda infantil, ensino médio, superior e técnico-científico, onde ressalta-se a importância cultural dos conhecimentos e práticas agroecológicas; 4. Manutenção de estratégias de inserção mercantil, ainda que se ressalte a crise de endividamento da maior parte das cooperativas criadas pelo Movimento.
CONCLUSÕES:
Os resultados demonstram que as estratégias de territorialização do MST apresentam-se com êxito, tendo em vista a cooperação solidária que este Movimento é capaz de suscitar em seu benefício; primeiramente, a fim de garantir a propriedade da terra, mas, sobretudo para a obtenção cotidiana de sua reprodução, frente a territorialização expropriatória do capital. Em ambos os casos, os Sem Terra empreendem uma rede de intercâmbios solidários, incluindo o seu auto-intercâmbio e a aliança com outros movimentos sociais, levada a cabo desde as escalas mais reduzidas até as mais amplas que, inclusive, dão conta de alianças mundiais, como é o caso da Via Campesina que articula ações de organizações campesinas de vários países do Planeta. Sua opção pelo incentivo à cooperação agrícola e à agroecologia demonstra a influência que o intercambio solidário, incluindo seres humanos e não-humanos, tem para o MST; argumentamos que ela é, inclusive, responsável pelas iniciativas mercantis melhor sucedidas envolvendo o Movimento, mas que não têm sido capazes de compensar as perdas inerentes às desiguais trocas mercantis. Por outro lado, o MST parece ainda atribuir grande importância à sua inserção mercantil, privilegiando, em muitos aspectos, o intercâmbio privado e egoísta do mercado, por meio do qual se efetiva a dominação e expropriação capitalista, deixando de render as maiores homenagens por sua territorialização às relações solidárias praticadas pelo Movimento, inclusive a fim de priorizá-las.
Instituição de fomento: Conselho Nacional de Desenvolviemento Científico e Tecnológico
Palavras-chave:  Assentamentos rurais; Território; Acumulação capitalista.
Anais da 57ª Reunião Anual da SBPC - Fortaleza, CE - Julho/2005