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G. Ciências Humanas - 5. História - 11. História
JORNALISMO E LITERATURA: MEMÓRIA E HISTÓRIA NAS OBRAS O HARÉM DAS BANANEIRAS E OS ANOS MAIS ANTIGOS DO PASSADO DE CARLOS HEITOR CONY
Radamés Vieira Nunes 1
Regma Maria dos Santos 1
(1. Universidade Federal de Goiás)
INTRODUÇÃO:

Este trabalho destina-se a refletir sobre o estudo interdisciplinar entre história, literatura e jornalismo e, concomitantemente, compreender os preceitos estéticos, políticos e ideológicos de Carlos Heitor Cony, que como um sujeito de seu tempo dialogou, interferiu e construiu uma leitura de seu contexto. Um contexto de bruscas transformações no cenário político e nos valores culturais, marcados pela aceleração do tempo, desenvolvimento tecnológico, globalização e outros fatores característicos da modernidade que redefiniram o cotidiano do escritor, bem como de todo povo brasileiro das ultimas décadas do século XX. Para tanto nos valeremos das crônicas de Carlos Heitor Cony, selecionadas nos livros O harém das bananeiras e Os anos mais antigos do passado. Escolhemos esses dois livros de crônicas, como fonte documental para nossa pesquisa, porque para além dessa definição eles podem ser chamados de livros de memória ou até mesmo de biografia do autor. Neles há uma pluralidade de elementos que nos permitiram refletir sobre as especificidades da crônica como gênero híbrido e reconhecer as influências, discussões, pensamentos, perplexidades, contradições, sentimentos, angústias, temores, ironias, raivas, desesperos, entre outros elementos capazes de reconstruir a fisionomia da cultura e contexto social em que se moldou Carlos Heitor Cony. Um homem como nós, mas também diferente. 

METODOLOGIA:
O desenvolvimento dessa pesquisa foi pautado na história cultural especialmente na vertente vinculada a Carlo Ginzburg denominada micro-história, baseada na redução da escala de observação, no uso exaustivo das fontes, na valorização da narrativa, no apego preferencial a personagens desconhecidos e na diversidade temática. Sob o princípio dessa vertente historiográfica analisamos o livro O harém das bananeiras, publicado em 1999, constituído por cem crônicas, publicadas anteriormente no jornal Folha de São Paulo, entre os anos de 1997 e 1999 e o livro Os anos mais antigos do passado, publicado em 1998, constituído por cento e duas crônicas publicadas antes na Folha de São Paulo e na revista Manchete, as crônicas deste livro fazem parte de uma seleção de toda produção de Cony ao longo de sua carreira como cronista. Para além desse material analisamos também, como suporte complementar, alguns artigos, romances e entrevistas do autor; todos situados na última década do século XX. Para analise desse material nos fundamentamos no método indiciário de Carlo Ginzburg, baseado na semiótica e inspirado em Moreli, que consiste em buscar nos indícios periféricos e nas evidências marginais elementos que nos permite elaborar conjecturas. Valeremos-nos ainda dos conceitos de representação e apropriação esboçados por Roger Chartier
RESULTADOS:

Carlos Heitor Cony, no século XX foi um amante dos fatos cotidianos e entrelaçando memória, história e ficção, escreveu sobre as transformações no cenário político e nos valores culturais do Brasil. Inspirados em Ginzburg, na obra O queijo e os vermes com moleiro friuliano Mennocchio; ou mesmo Mikhail Bakhtin a partir de Rabelais. Podemos, a partir das crônicas de Cony, recuperar o conflito de classes na dimensão sócio-cultural, confirmando a inviabilidade de separar o popular do erudito na dimensão cultural, devido o influxo recíproco entre as culturas. No livro O harém das bananeiras nos deparamos com uma criança que pronunciou sua primeira palavra com cinco anos de idade, uma criança que foi motivo de risada devido a um problema de dicção que o fazia falar “fodão” quando na realidade queria dizer fogão, e ainda com um jovem seminarista que se obrigava voluntariamente à castidade. Encontramos também um Cony adulto que lançou críticas à ditadura, atacando com veemência e ousadia o governo totalitário de 1964 que o sujeitou a seis prisões e vários processos. Um Cony que como um Kafka cético e pessimista, em relação ao futuro da humanidade, descobriu só recorrer à literatura quando está infeliz. Deparamo-nos com um agnóstico confesso, mas que, paradoxalmente, tem admiração e confiança nos santos do catolicismo. Um idoso herdeiro da ironia machadiana que, através de suas crônicas, sorriu intelectualmente, um sorriso amargo dos desabores da vida cotidiana do final do século XX.

CONCLUSÕES:
desenvolvimento de uma pesquisa como para o ensino de história, como material didático a ser utilizado em sala de aula para facilitar e dinamizar o processo de ensino - aprendizagem. A prática interdisciplinar é muito útil para aqueles historiadores que queiram identificar aspectos históricos negligenciados pela historiografia tradicional. A redução da escala de observação á uma perspectiva micro nos permite perceber dados não observáveis por uma visão histórica macrossocial. Recuperar a história individual de Carlos Heitor Cony é caminhar naturalmente rumo à história cotidiana do Brasil no século passado. Bastando uma rápida leitura nas suas produções literárias para perceber que Cony faz de si mesmo, de sua família e de sua memória seus assuntos prediletos, desvendando-se ao mundo e a si mesmo. Analisando sua vasta obra, nota-se que ele parece ser vários em um só, embora seu desejo fosse de ser impessoal e intransitivo como a chuva que chove.  Daí porque insistimos com Carlos Heitor Cony: há muito que se aprender, pesquisar e comentar desse instigante autor.
Trabalho de Iniciação Científica  
Palavras-chave: historia; crônica; memória.
Anais da 58ª Reunião Anual da SBPC - Florianópolis, SC - Julho/2006