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G. Ciências Humanas - 8. Psicologia - 5. Psicologia da Saúde

O BRINCAR COM CRIANÇAS PORTADORAS DE PARALISIA CEREBRAL EM ENFERMARIAS PEDIÁTRICAS

Bianca Lopes de Souza 1
Rosa Maria de Araújo Mitre 1
(1. Programa Saúde e Brincar – Instituto Fernandes Figueira/FIOCRUZ)
INTRODUÇÃO:

A paralisia cerebral (PC) é uma patologia conseqüente de uma lesão estática ocorrida no período pré, peri ou pós-natal (até os cinco anos de idade), que afeta o sistema nervoso central em fase de formação, maturação ou evolução estrutural e funcional. Sendo uma disfunção predominantemente sensório-motora, que envolve distúrbios no tônus muscular, postura e movimentação voluntária. O ônus psicossocial provocado pela PC é enorme, sendo ampliado durante o processo de hospitalização infantil,  pois às limitações da própria deficiência associam-se as perdas comuns decorrentes da experiência de hospitalização, intensificadas em função tanto da gravidade da incapacidade quanto das restrições orgânicas impostas pelo adoecimento. Isso faz com que essas crianças sejam geralmente encaradas pelos profissionais de saúde como grandes desafios, pois estes prendem-se muitas vezes, a uma visão tecnocrática, não conseguindo vislumbrar potencialidades e possibilidades para elas. É nesse contexto que o brincar se apresenta como uma forma de expressão e regaste da condição de ser criança. Por ele conseguimos transpor as incapacidades e deficiências, alcançando o sujeito em sua integralidade, sendo um importante promotor de saúde. Pensando nisso, desde de setembro de 2004 este estudo vem sendo desenvolvido nas enfermarias pediátricas do Instituto Fernandes Figueira (IFF) / FIOCRUZ, com o objetivo de investigar o papel do brincar durante o processo de hospitalização dessas crianças portadoras de PC.

METODOLOGIA:

Por se tratar de uma pesquisa qualitativa, a metodologia envolve a realização de observação participante da interação das crianças de 3 a 9 anos, portadoras de PC, internadas nas enfermarias pediátricas do IFF, durante os atendimentos do Saúde e Brincar - Programa de Atenção Integral a Criança e ao Adolescente; análise de prontuário; além disso, a realização de entrevistas semi-estruturadas com roteiro com os acompanhantes destas crianças. Os atendimentos do Programa Saúde e Brincar acontecem duas tardes por semana, por duas horas, com a criação de um espaço lúdico dentro das enfermarias pediátricas, onde as crianças internadas e seus acompanhantes são convidados a brincar coletivamente, assistidos pela equipe do programa.  E as que, por alguma questão, não podem ir até o setting adaptado, brincam no próprio leito. Quanto às entrevistas, foram elaboradas a fim de contextualizar essas crianças em suas atividades cotidianas, e possibilitar a esse responsável a expressão de sua percepção sobre estas no contexto hospitalar. Todas as entrevistas foram transcritas e foi utilizada a metodologia de Análise de Conteúdo (Bardin, 1971) para análise das entrevistas de acordo com as principais categorias: 1) com relação ao diagnóstico; 2) com relação à rotina da criança fora do hospital; 3) com relação ao processo de internação hospitalar; 4) com relação ao papel do brincar no período de hospitalização infantil. Para cada uma das quatro categorias foram criadas sub-categorias.

RESULTADOS:

A análise dos dados das 4 entrevistas realizadas (2 mães, 1 avó e 1bisavô) revelou que, com relação ao diagnóstico, a identificação da deficiência, que para 3 participantes aconteceu na própria família, ocorreu no primeiro ano de vida e as causas da PC variaram bastante. Além disso, eles relataram, que a notícia foi recebida com sentimentos de angústia e culpa pela patologia, mas informaram ter esperança e fé na reversão do quadro clínico. Sobre a rotina da criança, a alimentação é um dos cuidados que despende maior parte do tempo, seguido do acompanhamento dos tratamentos ministrados. Sobre o processo de internação, os acompanhantes mencionaram a pouca acessibilidade da equipe de saúde e a sobrecarga emocional e física sobre o acompanhante como aspectos principais da hospitalização. Quanto às crianças, até dezembro de 2005, 5 meninos e 3 meninas foram atendidas, idade média de 5 anos. Destas, 5 estavam hospitalizadas por pneumonia por broncoaspiração, e 7 tinham histórico de outras internações. Sobre o brincar, tanto pelas entrevistas e por nossas observações, este tem se mostrando bastante eficaz, facilitando e mediando: o aparecimento de habilidades desconhecidas; a criação de alianças de confiança destas crianças com outras, com os acompanhantes e com a equipe de saúde; o aprendizado e a adaptação destas crianças ao meio; o autoconhecimento e a criação de formas ampliadas de comunicação; a valorização social; e o processo de interação e socialização de uma forma geral.

CONCLUSÕES:

A partir dos dados obtidos durante este estudo, pode-se afirmar que o brincar é percebido como um mediador e facilitador do processo de hospitalização da criança portadora de PC e seu acompanhante, sendo considerado um importante promotor de saúde, já que auxilia o desenvolvimento global da criança e favorece sensações de bem-estar e felicidade em ambos. Considerando os imensos obstáculos individual e social acarretados pela paralisia cerebral, o brincar tem se mostrado capaz de resgatar e apontar possibilidades para essas crianças tão marcadas pelas incapacidades, fazendo com que essas possam ganhar visibilidade dentro das enfermarias, passando a ser reconhecidas enquanto sujeitos ativos de seus tratamentos, evidenciando o potencial existente nestas crianças. Desta forma, pode-se concluir que o brincar, por apresentar-se enquanto eficiente promotor de saúde atuando de maneira semelhante tanto com crianças portadoras de paralisia cerebral como com outras crianças, acaba tornando-se uma prática inclusiva, uma vez que na brincadeira todo mundo é criança.

Instituição de fomento: PIBIC/CNPq
Trabalho de Iniciação Científica  
Palavras-chave: Hospitalização infantil; Brincar; Criança portadora de paralisia cerebral.
Anais da 58ª Reunião Anual da SBPC - Florianópolis, SC - Julho/2006