IMPRIMIR VOLTAR
H. Artes, Letras e Lingüística - 4. Lingüística - 6. Lingüística
MANIFESTAÇÕES DE TABUS LINGÜÍSTICOS NAS DESIGNAÇÕES DE PROSTITUTA: UM ESTUDO EM ATLAS LINGÜÍSTICOS BRASILEIROS
Sânia Fontoura Fernandes 1
(1. UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO DO SUL - UFMS )
INTRODUÇÃO:
: A linguagem constitui, o meio essencial para a intercomunicação verbal ou não-verbal entre os homens e é através dela que o homem reflete a sua realidade sociocultural. Esse fato se dá pela faculdade que o indivíduo tem de aprender novas línguas e novas palavras por meio da interação com outros indivíduos e com outros espaços geográficos. Particularmente, nesse processo de expansão lexical, essas interações causam mudanças relevantes nos usos vocabulares (BIDERMAN, 1981, p.139), condicionando o surgimento de unidades lexicais e de expressões que, por serem consideradas profanas, grosseiras e até ofensivas, ferem os padrões de moralidade impostos pela sociedade. Essas criações lexicais são denominadas de Tabus Lingüísticos – palavras que remetem à imagem de algo que causa sentimento negativo ao indivíduo, uma vez que são tabus porque se referem a algum referente também considerado tabu. Como o tabu lingüístico apresenta estreita relação com o objeto tabu, da mesma forma como estes são evitados, seus nomes também o são, em virtude da ligação do nome ao abjeto por ele designado (GUÉRIOS, 1979, p.01).
METODOLOGIA:
O cronograma do Plano de Trabalho estabelecido para esta pesquisa obedeceu às seguintes etapas: - leitura e fichamento do referencial bibliográfico que fundamentou a pesquisa; - levantamento das unidades lexicais que nomeiam o conceito “mulher que vende o corpo”, nas seguintes fontes: 1. base de dados do Projeto ALMS – Atlas Lingüístico de Mato Grosso do Sul – nas respostas fornecidas por informantes do sexo masculino e feminino de idade entre 18 e 30 anos e 45 e 70 anos, analfabetos ou com escolaridade de até a 4ª série do Ensino Fundamental, para a pergunta 254 do Questionário Lingüístico do Projeto ALMS . 2. cartas lexicais de número 106 – Prostituta; 107 – Distribuição Diatópica de Rapariga e 108 – Variantes fonéticas para prostituta do APFB – Atlas Prévio dos Falares Baianos (1963); 3. cartas lexicais de número 110 – Variantes fonéticas para prostituta; 111 – Variantes fonéticas de solteira (mapas da BA e do SE); e 112 – Outras designações para prostituta do ALSE - Atlas Lingüístico do Sergipe (1987); a) Consulta a dicionários de Língua Portuguesa (FERREIRA, 1986; HOUAISS, 2001; NASCENTES, 1966); de Folclore (CASCUDO, 1954) e de Símbolos (LEXIKON, 1997); b) análise sincrônica dos dados, buscando-se, quando necessário, dados diacrônicos necessários para auxiliar a interpretação dos dados; c) sistematização e análise semântico-lexical das designações catalogadas, focalizando a presença de tabus lingüísticos e de eufemismos nas mesmas.
RESULTADOS:
Tabu - vocábulo polinésio que, segundo Houaiss (2001), designa interdição cultural e/ou religiosa quanto a determinado comportamento, ou quanto à linguagem. Na seqüência serão apresentados os dados inventariados nesta pesquisa: DESIGNAÇÕES PARA “MULHER DE VIDA FÁCIL” – Projeto ALMS Amambai: Biscate, comedêra, prostituta, puta, perstituta Dourados: Mulher à toa, mulher de zona, prostituta, puta Paranaíba: Puta Ponta Porã: Mulher à toa, mulher da vida, prostituta, vagabunda, rapariga Rio Brilhante: Mulher à toa, mulher da vida, prostituta. DESIGNAÇÕES PARA “MULHER DE VIDA FÁCIL” - APFB Carta 106: Bapedera, basora, babipua, hasora, varredera, vasoura Carta 107: Paparida, papariga Carta 108: Istatuta, putastuta, postetuda, pristituta, prostetuda, prostituta. DESIGNAÇÕES PARA “MULHER DE VIDA FÁCIL” - ALSE Carta 110: Popituta, protestuda, prostituta, protistuta Carta 111: Mulher solteira, solteira Carta 112: Dama, quenga, militriz, mulher-dama. Os dados registrados acima evidenciam que a unidade lexical prostituta (e suas variantes fonéticas) foi documentada na base de dados do Projeto ALMS, no APFB e no ALSE. Trata-se do termo genérico que designa a mulher que se expõe à “devassidão pública”, mais aceito socialmente. Nesse caso, a marca de tabu recai mais sobre a ‘profissão’ do que sobre a designação. A análise evidenciou a presença de tabus lingüísticos nas designações pesquisadas, muitos deles relacionados ao preconceito que a sociedade atribui ao referente comumente denominada de prostituta.
CONCLUSÕES:
A análise dos dados evidenciou que, para a sociedade, ser prostituta é ser uma mulher infeliz, uma “mulher errada”, razão por que essas “profissionais do sexo” são vítimas de preconceitos e de exclusão social, fato que gera o tabu lingüístico, já que o tabu não recai somente sobre a palavra, mas também sobre o referente ao qual ela se refere. A idéia arraigada de que sexo é errado, é pecado deixa transparecer uma concepção conservadora da sociedade que exclui todos os indivíduos que “infringem” essa “regra”. Essas mulheres são mal vistas porque remetem à idéia de imoralidade subjacente tanto em suas ações como em suas denominações. Contrariamente, o sexo é considerado sagrado e puro, se praticado dentro do casamento, situação em que é aceito socialmente e visto como um ato “necessário” da natureza humana para a sua multiplicação: crescei e multiplicai-vos (GÊNESIS, 01: 28). Em síntese, a pesquisa demonstrou aspectos da dinamicidade lexical manifesta na linguagem popular, variante lingüística que, ao mesmo tempo em que se configura como conservadora, contribui para a renovação e para a expansão do léxico.
Trabalho de Iniciação Científica  
Palavras-chave: Tabu lingüístico; Léxico; Atlas lingüístico.
Anais da 58ª Reunião Anual da SBPC - Florianópolis, SC - Julho/2006