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G. Ciências Humanas - 5. História - 2. História do Brasil
A "pátria", o "país" e a "nação": dos Romances à Inconfidência Mineira (1788-89)
André Pedroso Becho 1
(1. Universidade Federal de Minas Gerais/UFMG)
INTRODUÇÃO:

A Inconfidência Mineira de 1788-1789 foi um movimento intensamente apropriado por nossa intelectualidade e imaginário popular, sendo concebido como elemento essencial para a construção da nossa identidade nacional. A história, a memória oficial, o cinema e a literatura têm contribuído para a disseminação dessa leitura mitológica da Inconfidência.

Este projeto visa delimitar com maior precisão o lugar da Inconfidência Mineira na história nacional. O primeiro objetivo, consiste em avaliar as influências intelectuais que os Inconfidentes receberam para a constituição de uma leitura própria da realidade em que se inseriam, retornando-se aos Autos de Devassa da Inconfidência Mineira e à produção literária dos inconfidentes. Ao lado destes escritos consagrados, serão analisados outros até então esquecidos pela historiografia, mas que podem ter sido apropriados pelos Inconfidentes, mais precisamente alguns Romances. O segundo objetivo deste projeto é reconstituir as noções de pátria, país e nação que emergem dos discursos dos Inconfidentes. Esse rastreamento permitirá avaliar em que medida os conjurados de Minas constituíram uma visão crítica que ultrapassava os limites de sua própria capitania engendrando um esboço de uma identidade mazomba.

METODOLOGIA:

A primeira etapa da pesquisa envolveu a leitura e análise crítica da bibliografia sobre a Inconfidência Mineira e sobre o contexto político, econômico e social das Minas no último quartel do século XVIII.

A segunda etapa da pesquisa foi dividida em dois momentos diferentes. Em primeiro lugar, concentramo-nos na leitura e análise dos onze volumes dos Autos de Devassa da Inconfidência Mineira e de alguns escritos literários dos Inconfidentes, procurando avaliar as influências intelectuais que estes podem ter recebido. Em segundo lugar, realizamos a leitura dos romances presentes na biblioteca de alguns dos inconfidentes, procurando uma melhor compreensão da forma como podem ter sido apropriados. São estes: Dom Quixote, de Miguel Cervantes; Aventuras de Telêmaco, de Fénelon; Contos Morais, de Marmontel; e as Ouevres, de Voltaire.

                 A última e, mais importante etapa da pesquisa, consistiu no levantamento do conteúdo do vocabulário político dos protagonistas da Inconfidência presente nos Autos de Devassa. Foi dada especial atenção aos termos utilizados para indicar identidades coletivas, com o levantamento do número de ocorrências, e o seu agrupamento e análise, de acordo com o sentido em que se mostram inseridas no contexto geral do discurso.
RESULTADOS:

Em primeiro lugar, percebemos como um legado luso-brasileiro, mediado por livros e pelas leituras, imbricou-se na fala dos Inconfidentes, amalgamando-se com as Luzes e relacionando-se com as notícias da independência dos Estados Unidos da América. Constatamos também, as potencialidades destas teorias e das possíveis apropriações dos Romances presentes em suas bibliotecas, para fomentar conflitos, já que poderiam legitimar, se inseridas no contexto colonial, investidas contra o poder “tirânico” da Coroa, que oprimia os colonos na América portuguesa.

Do levantamento acerca do vocabulário político utilizado pelos Inconfidentes, foi possível verificar que as noções de pátria, país e nação dos Inconfidentes eram distintas do sentido com que são utilizadas atualmente. Para eles, uma nação era um país Europeu, não sendo encontrada nenhuma referência de uso deste termo para remeter-se ao Brasil. Não aparece nenhuma ocorrência da identidade “brasileiro”, e tudo indica que, para a maior parte da população das Minas, as identidades coletivas não ultrapassavam o nível regional. O que vem a confirmar está afirmação é o uso dado ao termo país, que se refere unicamente a uma identidade regional. Já o termo pátria, apresenta o simples significado de naturalidade, sendo usado para indicar, na maioria das vezes, a capitania de Minas Gerais.

CONCLUSÕES:

A partir dos resultados alcançados nesta pesquisa, percebemos como a idéia de uma nacionalidade brasileira ainda não estava nos horizontes dos Inconfidentes Mineiros. Esta já começava a delinear-se sob a forma de um esboço borrado e impreciso, representada pelo termo América, mas não era forte o suficiente para se sobrepor às identidades regional e  portuguesa. Observamos a existência de um expressivo fortalecimento das identidades regionais, ao ponto de se sentirem seguras o suficiente para se levantar contra o “Reino”. Muito antes um Brasil independente, o que os Inconfidentes almejavam, em primeiro lugar, era a participação nas decisões políticas e econômicas sobre a Capitania de Minas Gerais, independente ou não, de existir uma ruptura com a nação portuguesa. Percebemos, inclusive, que muitos dos Inconfidentes ainda se entendiam enquanto portugueses.

Instituição de fomento: PROBIC/CNPq
Trabalho de Iniciação Científica  
Palavras-chave: Inconfidência Mineira; Romance; Pátria, país e nação.
Anais da 58ª Reunião Anual da SBPC - Florianópolis, SC - Julho/2006