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D. Ciências da Saúde - 2. Medicina - 7. Saúde Materno-Infantil

A  DEPRESSÃO MATERNA E A VIDA COTIDIANA DE CRIANÇAS EM IDADE ESCOLAR

Louise Azenha Tango 1
Sonia Regina Loureiro 2
(1. Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto-USP; 2. Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto-USP)
INTRODUÇÃO:
A infância constitui-se em um período de desenvolvimento em que ocorrem muitas aquisições e que determinados eventos têm maior impacto. Dentre estes eventos, a depressão materna tem sido referida como uma condição de vulnerabilidade ao desenvolvimento, por influenciar a vida cotidiana das crianças. Os eventos de vida são situações do dia a dia que trazem para a criança, tanto a possibilidade de desenvolvimento positivo como de risco psicossocial e quando ocorrem inesperadamente podem causar estresse. A depressão tem sido considerada um evento estressante diferenciado de outros que podem ocorrer na vida da criança, pois não constitui-se em um evento único e ocorre por tempo limitado. Os filhos de mães depressivas estão expostos a uma variedade de estressores, entre os quais destaca-se um ambiente familiar conflituoso, envolvendo irritabilidade e brigas entre os pais favorecendo a emergência de efeitos negativos no cotidiano das crianças. Neste contexto, objetiva-se comparar as percepções sobre os eventos de vida de crianças que convivem com mães com história psiquiátrica de depressão, à crianças cujas mães não apresentam história psiquiátrica.
METODOLOGIA:
Foram avaliadas 40 crianças, na faixa etária de 7 a 12 anos, de ambos os sexos, distribuídas em dois grupos: G1- 20 crianças, cujas mães apresentam história psiquiátrica com diagnóstico clínico de Depressão, e G2- 20 crianças, cujas mães não apresentam história psiquiátrica, sistematicamente avaliadas.Procedeu-se com as crianças a avaliação individual através do teste de Raven considerando-se nível intelectual pelo menos Médio como critério de inclusão no estudo. Os eventos de vida positivos e negativos foram investigados através da Entrevista de Eventos Vitais Positivos e Negativos.Trata-se de uma entrevista semi-estruturada composta por três partes: Relato Espontâneo, Dirigido e Classificação de eventos. No relato espontâneo, a criança é estimulada a comentar sobre qualquer evento de vida. No relato dirigido, é apresentada uma lista de 17 eventos de vida positivos e negativos, e a criança deve confirmar ou não sua ocorrência. Na classificação de cartões, a criança é solicitada a ordenar os 17 eventos de vida positivos e negativos, do mais importante ao menos importante, utilizando para tal cartões com o nome dos eventos. Os dados do Teste de Raven foram codificados conforme as recomendações técnicas, as entrevistas foram transcritas e os eventos codificados. Foram aplicados os procedimentos estatísticos não paramétricos (p< 0.05) de comparação de grupos (Teste Mann-Whitney, Exato de Fisher, Qui-Quadrado) e de correlação (Correlações de Kendall´s Tau ).
RESULTADOS:

Quanto às percepções relativas aos eventos de vida, não foram observadas diferenças significativas em relação à média de eventos positivos (G1=1,7 e G2=2,0) e negativos (G1=1,9 e G2=2,0) nos relatos espontâneos e dirigidos. Com relação aos eventos específicos, as crianças de G1 relataram comparativamente a G2 maior porcentagem de eventos relacionados à categoria Começar ou realizar uma atividade nova e menor porcentagem de ocorrência dos eventos Descansar e Ficar doente ou se machucar.  Na classificação da importância de eventos, G1 classificou como mais importantes os eventos positivos Alguém da família ficar bem de saúde (física e mental), Comemorar aniversários ou festas e Começar ou realizar uma atividade nova e os eventos negativos Sentir medo, ficar inseguro e Receber advertências e punições. Analisando-se as correlações entre os eventos, o grupo de crianças que convive com a depressão materna apresentou três correlações significativas relacionadas ao evento Saúde da criança e duas correlações significativas nos domínios relacionados a conflitos no ambiente familiar. Já o grupo que convive com mães sem história psiquiátrica apresentou quatro correlações significativas relativas ao evento Brincar e duas ao evento Começar uma atividade nova.

CONCLUSÕES:

Observou-se semelhança entre os grupos quanto à diversidade de experiências de vida. O grupo de crianças que convivem com a depressão materna classificou como mais importante o evento Alguém da família ficar bem de saúde (física e mental), o que pode estar associado à convivência com a depressão materna. Tal grupo também classificou como mais importantes os eventos ligados a comemorações e atividades novas, o que indica a importância dada a eventos favorecedores da socialização e do desenvolvimento de competência. No entanto, o mesmo grupo classificou como menos importante o evento Conviver com amigos, o que não é esperado para este período do desenvolvimento, já que crianças em idade escolar interagem de maneira mais significativa com seus colegas. As associações entre os eventos sugeriram diferenças nas percepções das demandas do cotidiano, sendo que as crianças que convivem com a depressão materna apresentaram maior ênfase em dificuldades, caracterizando a presença de estressores relacionados à saúde da família e ocorrência de conflitos em casa. Considera-se que a depressão materna influencia o cotidiano e a adaptação psicossocial de crianças em idade escolar, caracterizando uma condição de vulnerabilidade e risco. Desta forma, aponta-se para a necessidade de cuidados de saúde mental direcionados a tais crianças de forma a favorecer-lhes uma melhor adaptação psicossocial e suporte para o enfrentamento de tal adversidade na sua vida cotidiana.

Instituição de fomento: CNPq
Trabalho de Iniciação Científica  
Palavras-chave: Depressão materna; Crianças; Eventos de vida.
Anais da 58ª Reunião Anual da SBPC - Florianópolis, SC - Julho/2006