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G. Ciências Humanas - 9. Sociologia - 5. Sociologia Rural

FACES DA AUTONOMIA - UM ESTUDO DE CASO NA ASSOCIAÇÃO DE GRUPOS DE AGRICULTURA ECOLÓGICA DE TURVO/ PR (AGAECO)

Mayra Lafoz Bertussi 1, 2
(1. Departamento de Ciências Sociais, Universidade Federal do Paraná - UFPR; 2. Instituto Equipe de Educadores Populares - IEEP)
INTRODUÇÃO:
O Brasil vem assistindo um processo de transformação na base técnico-econômica da agricultura, causando aumento de produção e de produtividade do trabalho. Entretanto existem conseqüências como esgotamento dos recursos naturais, empobrecimento e exclusão social no campo, afrouxamento das relações comunitárias típicas do campesinato tradicional. Modificações que afetaram a capacidade de auto-regulação do campesinato, e romperam com uma certa coerência da exploração tradicional. A modernização conservadora afetou uma característica marcante das condutas camponesas: a autonomia. Fato que atingiu o tecido social rural na sua capacidade de reprodução dos pequenos agricultores familiares. Desse cenário emergem novas estratégias de sobrevivência e a busca de alternativas que propiciam a inclusão social dessa categoria de agricultores. A agroecologia apresenta-se como instrumento para a substituição da base tecnológica, resgate e valorização da identidade cultural, orientação para condutas que visem uma maior autonomia e organização sócio-política e econômica, além da construção de alternativas de comercialização. O presente estudo visa analisar os espaços atuais relacionados com a formação da autonomia camponesa no contexto de uma organização de agricultores ecológicos que atuam numa estratégia de redes de colaboração solidária para se relacionar com o público consumidor. O objeto da pesquisa são os agricultores da Associação de Grupos de Agricultura Ecológica de Turvo/ PR (AGAECO).
METODOLOGIA:
Os dados desta pesquisa foram obtidos a partir da primeira fase do projeto financiado pelo CNPq intitulado “Redes Locais de Abastecimento Alimentar: Estratégias de promoção da agricultura familiar aliadas à superação de risco à insegurança alimentar e nutricional em populações urbanas de baixa renda”. Aplicou-se um instrumento quantitativo com todas famílias associadas a AGAECO (38), de onde foram retirados dados de cunho econômico-produtivo. A questão específica da autonomia foi abordada através de um instrumento qualitativo, com a realização de sete entrevistas semi-estruturadas, tendo como critério adotado o tempo de filiação na associação.
RESULTADOS:
Os dados sócio-produtivos da pesquisa demonstraram: a maioria têm descendência cabocla, polonesa e alemã. A faixa etária de maior contingente (53%) está entre os 20 e 60 anos, e 25% das pessoas na faixa etária dos 20 aos 29 anos cursaram até o 1o grau, e 25% nessa faixa etária cursaram até o 2o grau. Em relação à propriedade, cerca de 38% dos estabelecimentos possuem de 5 até15 hectares, sendo que 90% do total afirmaram ser proprietários da terra e 100% trabalham com mão de obra familiar. A principal fonte de rendimento provém da agropecuária realizada no próprio estabelecimento familiar, sendo que 39,5% das famílias conta com valores de 90 a 100% da renda total. Cerca de 69% das famílias têm um rendimento que vai de 40 até 100% da renda total da família proveniente da agricultura ecológica, e praticamente 55% do grupo conta com um rendimento de 80 a 100% do total de renda. Quanto à autonomia de produção, a ênfase dada está na apreensão de métodos e técnicas ecológicas próprias de trabalho adaptadas às condições daquela realidade, e ampliação nas possibilidades de mercado. Sobre aspecto organizativo foi ressaltado, na totalidade das entrevistas, a auto-gestão na associação e a valorização da identidade de agricultor ecológico, enquanto no aspecto político foi explicitado a capacidade de formação de mercados locais baseados nos preceitos da economia popular solidária regido pelos próprios agricultores. No âmbito mercantil foi colocado a instabilidade econômica desses mercados.
CONCLUSÕES:
A partir dos dados sócio-produtivos pode-se definir o agricultor pesquisado como um moderno-camponês. Conclui-se que no âmbito da produção a AGAECO tem um relativo ganho de autonomia, pois foi relatada uma redução frente à dependência de tecnologias externas, de insumos e técnicas de trabalho exteriores à propriedade, e principalmente porque afirmou métodos próprios de trabalho. No campo da organização a entidade tem o seu principal fruto, pois inseriu uma capacidade de reflexão política conseqüente da proposta de auto-gestão. A organização da associação permite também um reforço na identidade do agricultor ecológico, e principalmente a consolidação do ideal de relações sociais baseadas por um viés ético mais humanitário. O maior ganho dos agricultores da AGAECO está numa reflexão político-ideológica das relações sociais que prima pela solidariedade em detrimento do individualismo, pelo menos no campo da utopia que se quer alcançar. Entretanto em relação às atividades mercantis da AGAECO os depoimentos colocam que as atividades da associação apesar de proporcionarem rentabilidade não se caracterizam como estáveis, uma vez que apresentam oscilação de rendimento. A comercialização direta para o consumidor já é uma prática intrínseca na AGAECO, o que permite uma considerável independência frente às políticas de integração comercial da agricultura convencional, contudo foi colocado que essas formas de comercialização direta ainda não apresentam estabilidade econômica.
Instituição de fomento: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq
 
Palavras-chave: campesinato; autonomia; agroecologia.
Anais da 58ª Reunião Anual da SBPC - Florianópolis, SC - Julho/2006