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G. Ciências Humanas - 4. Geografia - 2. Geografia Regional
A COMPREENSÃO DO TERRITÓRIO BRASILEIRO ATRAVÉS DA ANÁLISE DO CICLO DO OURO NAS CIDADES HISTÓRICAS DE MINAS GERAIS.
Ivana de Araújo Monteiro 1
Waldir W. Campos 1
Ricardo Sartorello 1
Francisco Capuano Scarlato 2
Hans C. G. Dechandt  1
(1. Departamento de Geografia/ FFLCH; 2. Profº. Drº. Departamento de Geografia/ FFLCH)
INTRODUÇÃO:

Nada que o homem faça pode ser destituído de sua humanidade. A chave para a compreensão da arte, das ferramentas, da casa, está em decifrar nelas o que há do homem que as produziu ou delas se utilizou, e não há na geografia objeto que invoque esta consciência de forma mais ativa, mais rica em comunicação e conteúdo, que as estruturas urbanas. Manifestações da história e do cotidiano de uma sociedade na paisagem, revela pensamentos, valores e a lógica de (re)produção tal como eram fundadas à sua época.
Norteados por esta perspectiva de leitura do espaço, pretende-se remontar aspectos do modo de vida nas cidades históricas de Tiradentes, Ouro Preto, São João Del Rey e Congonhas do Campo, à época da mineração considerando a história de formação, apogeu e declínio dos núcleos de povoamento (da fase de ocupação à transformação dos territórios) e exploração do ouro e a constituição da primeira rede urbana entre regiões distantes da colônia e como este processo foi determinante para conformação atual do território brasileiro.
Abordam-se também as contradições internas desta sociedade nas formas de trabalho, nas estratégias de sobrevivência, na busca do enriquecimento e nas manifestações político-artísticas considerando paralelamente as estruturas da sociedade açucareira e a dinâmica atual destes municípios - como as interações sociais e os sistemas de objetos se diferenciaram da sociedade dos senhores de engenho e como estão inseridas no cotidiano atual dos moradores.

METODOLOGIA:

O desenvolvimento do trabalho teve etapas bem definidas. A princípio foi feito o levantamento das obras de referência que permitiram uma visão geral dos grandes ciclos econômicos, com ênfase no ciclo do ouro, relacionando-os com a regionalização territorial do Brasil. Foi o momento que se buscou nexos comparativos entre estes períodos que coadunam uma intersecção temporal/histórica, uma visão panorâmica entre elementos que se contrapunham ou eram transportados com forma diferente de um período para o outro.

A segunda etapa consistiu no trabalho de campo para a analisar as feições destas antigas cidades, que ofereceram elementos dedutivos sobre o universo cotidiano das relações contemporâneas e passadas. Procedeu-se com observações quanto a estrutura arquitetônica dos prédios monumentais, versando sobre a volumetria e o adensamento espacial, comparando as funções que eles assumiram ao longo da história, aproveitando também relatos que os moradores fazem da sua relação com a estrutura destas cidades. Verifica-se que sobre todos os aspectos empíricos a perspectiva analítica incorpora a dialética presente em todos os níveis das relações humanas. Um jogo de tensão e conflito entre a repressão e a revolta, o emboaba e o paulista, os automóveis e as ruas pequenas e tortuosas entre a Igreja e o pecado. Contradições que se perpetuaram ao longo da história.

A última etapa sintetiza os aspectos teóricos contextualizado-os com o trabalho de campo que definiram o relatório.

RESULTADOS:

O recorte histórico e analítico do trabalho possibilitou destacar elementos sócio-econômicos que compõem o legado do ouro para o território brasileiro. Destaca-se a herança manifestada no espaço pelo estilo barroco e neoclássico dentro de uma notória dinâmica urbana, pois, ao contrário dos outros ciclos, foi um período de grande concentração populacional, cujo fator determinante foi o modo como o ouro era explorado.
A economia da mineração não foi capaz de gerar um processo acumulativo que acarretasse uma industrialização. A riqueza não aplicada em algo que garantisse uma variedade de produção ou acúmulo técnico que alavancasse uma agricultura destinada ao abastecimento.
Entretanto, a infra-estrutura viária e portuária que se estabeleceu, impulsionou o desenvolvimento das regiões sul e sudeste e deslocou o eixo político-econômico do nordeste para essa região. Graças ao Caminho Novo, o Rio de Janeiro torna-se a sede da coroa portuguesa. Esse fator político é marcado por uma maior intervenção da metrópole na colônia, concomitante ao crescimento de conflitos sociais que se disseminam em todos os níveis de relações. O poder se concentrava nos comerciantes e nos administradores da coroa e estes foram se estabelecer em outros locais quando esta atividade deixou de ser lucrativa, ficando a região da mineração por um longo período estagnada, até ter sua economia impulsionada pelo turismo, que assim como a economia do ouro, também organiza seu espaço.

CONCLUSÕES:

A economia do ouro modificou as estruturas fundamentais do Brasil colonial mobilizando enorme contingente populacional e criando o primeiro núcleo urbano da colônia. A necessidade de abastecimento de insumos básicos ligou diferentes áreas do território, que até então, permaneciam como núcleos isolados e autônomos, promovendo uma integração territorial essencial para a conformação do país e deslocando o poder político para a região sudeste, que se tornaria sede da coroa.
A civilização do ouro também trouxe uma nova configuração social, onde o escravo poderia comprar sua liberdade com o trabalho nas minas e se somar àquela porção de pessoas livres. Havia uma maior mobilidade social, ao mesmo tempo, em que a cidade formava seus territórios e era palco de tensões e conflitos.
O declínio da atividade mineradora promoveu o êxodo da população mais rica para o centro-sul do território em busca de outras atividades. A pecuária extensiva se torna então a atividade básica de subsistência. Os seus baixos rendimentos imprimiam-lhe um caráter itinerante e autárquico, interiorizados, no centro-oeste e nordeste. Os núcleos históricos foram paulatinamente ocupados por pessoas de baixa-renda. Com o tombamento dos edifícios, o turismo torna-se a atividade lógica e passa a intervir na organização desse espaço, como agente de mercado capaz de reinventar o uso dado para as construções, em detrimento da população local, que é expulsa para a periferia das cidades.

Instituição de fomento: Universidade de São Paulo.
 
Palavras-chave: Cidades Históricas; Formação Territorial; Ciclo do Ouro .
Anais da 58ª Reunião Anual da SBPC - Florianópolis, SC - Julho/2006