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G. Ciências Humanas - 8. Psicologia - 5. Psicologia da Saúde

ESPECIFICIDADES DA FORMAÇÃO DE MÉDICOS E PSICÓLOGOS E SUAS DIVERGÊNCIAS NA PRÁTICA HOSPITALAR

Janara Pinheiro Lopes 1
Gabrielle Bessa Pereira Maia 1
Leônia Cavalcante Teixeira 1
(1. Universidade de Fortaleza - UNIFOR)
INTRODUÇÃO:

O hospital, lugar tradicionalmente privilegiado da prática médica, vem acolhendo novas disciplinas e, dentre estas, a Psicologia. O exercício profissional de médicos e psicólogos no ambiente hospitalar possui peculiaridades que, à primeira vista, podem gerar controvérsias, mas, na verdade, apontam para formações diferenciadas que se complementam a partir dos seus saberes específicos. A Biomedicina ou Medicina Ocidental destaca-se por sua particularidade frente a outras modalidades médicas ao ressaltar o caráter biológico e organicista, focalizando a doença como seu elemento central. Em outra perspectiva, o campo “psi” é marcado pelas contribuições da psicanálise ao superar a noção biológica do corpo, da psicossomática ao destacar a implicação do doente no seu adoecimento e da psicologia da saúde ao questionar a leitura e prática tradicionais das noções de saúde/doença. Assim, a partir das dificuldades do nosso trabalho no setor de psicologia em um hospital público, interessamo-nos em investigar os conceitos corpo/mente, saúde/doença e vida/morte adquiridos na formação acadêmica de médicos e psicólogos para esclarecer os impasses existentes na atuação desses profissionais.

METODOLOGIA:

O local da nossa investigação científica foi o Hospital Geral de Fortaleza - HGF, por ser uma instituição de saúde pública que oferece um espaço para pesquisa, extensão, ensino e prática profissional. É um hospital de referência no estado do Ceará ao prestar serviços de emergência, ambulatório, enfermaria e cirurgia em diversas especialidades médicas, acolhendo psicólogos que atuam em todos esses setores e residentes de medicina. Entrevistamos cinco médicos residentes da referida instituição e cinco psicólogos independente da sua abordagem teórica. Verificamos os saberes psicológicos que foram adquiridos por esses profissionais na academia e analisamos os sentidos que estes os atribuem, assim como a maneira como se apropriam desses conhecimentos em sua prática. Para tanto, realizamos uma pesquisa qualitativa sem fins de generalização estatística, tendo como instrumento de coleta de dados entrevistas semi-estruturadas, com a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa – COÉTICA (registro – 04-056).

RESULTADOS:
Observamos que na formação médica há uma primazia do orgânico sobre o psicológico, eclodindo concepções restritas à biomedicina nas quais o corpo seria um conjunto de sistemas harmônicos. Enquanto que a formação dos psicólogos não contemplou disciplinas da área hospitalar, dificultando a apreensão satisfatória do corpo adoecido, fazendo com que esses profissionais recorram a conceitos da psicologia social para embasarem a prática no hospital público. Verificamos que os médicos remetem o corpo ao orgânico, sendo ligado à mente e, tais instâncias se influenciam mutuamente; concebem a doença como um desequilíbrio da harmonia dos sistemas e da interação mente/corpo. Para os psicólogos, o corpo é sede de uma linguagem representativa do sofrer, sendo o adoecimento orgânico definido a partir da mente, predominando a perspectiva de interferência desta no adoecer e o corpo estaria vinculado ao psicológico. Para tais profissionais, a saúde se refere aos sentidos da Organização Mundial de Saúde, mas os psicólogos ainda destacaram que as práticas sociais contribuem para a visão de tal conceito. Para os médicos, a morte seria a falência do organismo e da terapêutica, revelando o fracasso da sua formação acadêmica, sendo assim, um aspecto difícil de lidarem na sua prática. Os psicólogos se referiram à morte como categoria na qual a falência orgânica também seria premente, considerando que perdas cotidianas seriam não só de aspectos fisiológicos, mas de um processo normal do viver.
CONCLUSÕES:
Concluímos que a Biomedicina ainda é o principal fundamento teórico adquirido na formação acadêmica dos residentes. Este modelo de compreensão biológica foi constatado nas entrevistas realizadas com os médicos que contemplaram a perspectiva anátomo-fisiológica. Contudo, ressaltamos as referências à categoria da mente e como esta é indissociável da dinâmica corporal do sujeito. As entrevistas com os psicólogos revelaram uma tendência reducionista da influência unilateral da mente sobre o corpo diante do adoecer, sendo este apenas sede das representações da instância psíquica. Assim, os psicólogos caem nas malhas da psicologização dos sintomas que é um espaço perigoso para elaborações sobre o adoecer que não pode ser visto como casuístico, precisando ser questionado em suas raízes sociais e familiares. Constatamos que as divergências teóricas desses profissionais ocorrem devido as concepções diferenciadas no campo “psi” e biomédico e que as conceituações sobre o corpo/mente, saúde/doença e vida/morte de ambos profissionais repercutem nas práticas junto ao paciente, situando-o em universos fragmentários e reducionistas, provocando impasses nas suas atuações. Contudo, verificamos que tais profissionais procuram se aperfeiçoar e se capacitar para prestarem uma mellhor assistência ao paciente. Percebemos, ainda, que o psicólogo na equipe de saúde em um hospital possibilita ao paciente criar um espaço para cuidar de outros aspectos que fogem da ordem biológica do seu adoecimento.
Instituição de fomento: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq
Trabalho de Iniciação Científica  
Palavras-chave: psicologia hospitalar; formação médica; biomedicina.
Anais da 58ª Reunião Anual da SBPC - Florianópolis, SC - Julho/2006