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G. Ciências Humanas - 7. Educação - 15. Formação de Professores (Inicial e Contínua)

PRÁTICA DE ENSINO DE CIÊNCIAS E PROJETO DE EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA: POSSIBILIDADES INTRA E INTERESPECÍFICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES E DE ENSINO-APRENDIZAGEM

Lucia Maria Paleari  1
(1. UNESP - DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO - IB, CP 510 CEP 18640-000 BOTUCATU, SP)
INTRODUÇÃO:
A grave situação do Ensino de Ciências no Brasil recebeu destaque em 2000, quando o Programme for International Student Assessment revelou alunos de escolas públicas e particulares do Ensino Fundamental (EF) e Médio (EM) desprovidos de fundamentos científicos, matemáticos e lingüísticos necessários à compreensão de mundo. Numa realimentação positiva, professores deficientes para o ensino de ciências e oriundos inclusive de centros tidos como de excelência em universidades públicas, enfrentam inúmeras dificuldades, enquanto abrem mão da competência e compromisso social. Esse quadro, imerso em grande e veloz desenvolvimento tecnológico, é testemunhado pelos licenciandos das Ciências Biológicas (CB), que descartam de antemão a docência como carreira profissional. Considerando que não se edifica o cidadão, e conseqüente uma nação, sem pessoas literária e cientificamente letradas e que os alunos do EF e EM encontram-se na fase mais fecunda de formação, como despertar nestes o entusiasmo geral pelo estudo das matérias científicas e no licenciando o interesse pelas inúmeras possibilidades de ensino-aprendizagem e pesquisa disponíveis no EF e EM? Com o objetivo de obter elementos para responder a tais questões, elaborou-se este estudo, que envolveu licenciandos de Ciências Biológicas numa dinâmica constante de observação-atuação-reflexão junto a crianças do EF do Projeto de Extensão Universitária Colorir e de classes regulares de escolas públicas.
METODOLOGIA:

Assumindo a aprendizagem como compreensão e não mera memorização, construção pessoal, utilização de conhecimentos prévios para as re-elaborações mentais e adotando a abordagem sistêmica para melhor compreensão de mundo, conduzimos durante cinco anos um projeto de extensão com crianças de 11 a 14 anos de uma escola pública periférica ao campus universitário em Rubião Jr, Botucatu, que participaram de atividades de informática, ciências, artes, literatura, inglês e educação física. Licenciandos das Ciências Biológicas passaram a integrar essa experiência a partir de 2001, desenvolvendo parte das aulas de regência, desafiados a trabalhar com fundamentos preferencialmente de Física e Química por meio de experimentos, por terem nessas áreas as maiores dificuldades e maior distanciamento durante a graduação. As implicações para a biologia e contexto social dos assuntos mereceram cuidadosa atenção. O trabalho dos licenciandos foi supervisionado pela docente responsável e as atuações acompanhadas também por colegas, com registros (escrita e vídeo), análises e discussões no grupo.

RESULTADOS:

Confrontados com a própria insuficiência de conhecimentos e habilidades práticas, experiências e questionamentos perspicazes das crianças do Colorir, a postura arrogante dos licenciandos cedeu ao estudo e cuidadosa preparação das atividades, sem negligenciar a adequação pedagógica. Apresentaram dificuldades para romper com o condicionamento de aulas baseadas em informações e memorização. O processo de ensino-aprendizagem ganhou significado com conceitos e idéias fundamentais desenvolvidos ou re-elaborados a partir de aulas dinâmicas e experimentais, não detectadas nas escolas investigadas. Reavaliaram conceitos prévios ao constatarem que condição social desfavorável impingida às crianças do Colorir não foi empecilho a avanços intelectuais, autonomia, capacidade crítica. Essas crianças substituíram rua, novelas e desenhos animados, pelas atividades de extensão; melhoraram a capacidade de compreensão e argumentação durante debates usando conhecimentos adquiridos; revelaram avanços no desempenho escolar; passaram a avaliar criteriosamente programas de televisão; reivindicaram e participaram de dois encontros científicos na Universidade; concorrentes em exames para cursos técnicos e vaga como bibliotecário foram aprovados; um deles inscreveu-se, disputou e foi premiado na Olimpíada Paulista de Física, com convite posterior que lhe permitiu participar de duas semanas de estudos, sendo uma na Universidade Federal de São Carlos e outra no Instituto Tecnológico de Aeronáutica.

CONCLUSÕES:

Estágios supervisionados em escolas públicas oferecem visão parcial e quase sempre desalentadora das condições e possibilidades de ensino-aprendizagem e atuação profissional. Tendo como contraponto crianças da rede pública de ensino em projeto de extensão universitária, licenciandos puderam redimensionar essa visão inicial, ao serem desafiados do ponto de vista do conhecimento científico e pedagógico a avaliar e transcender as práticas e interações viciosas e descomprometidas, que vão de encontro à docência competente e cidadania, enquanto atividades interdisciplinares, questionamentos e convívio diário estimulam nas crianças o interesse pelo conhecimento, interpretações integrativas e iniciativas de estudo, num crescente de responsabilidade e autonomia. No entanto, os importantes avanços verificados na preparação para a docência não foram acompanhados de equivalente número de opções pela carreira, mesmo diante da grande demanda de professores no EF e EM. Esse quadro dificilmente será revertido sem a revalorização social desse professor, que passa por substancial melhoria de salário, de infra-estrutura das escolas e de investimentos na atualização e adequação dos profissionais, que precisam deixar de ser elementos flutuantes e/ou oportunistas no sistema, para integrarem-se com a permanência, dedicação, competência e responsabilidade, que a formação infanto-juvenil exige.

 
Palavras-chave: Formação de Professores; Ensino de Ciências; Extensão Universitária.
Anais da 58ª Reunião Anual da SBPC - Florianópolis, SC - Julho/2006