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G. Ciências Humanas - 6. Ciência Política - 5. Relações Internacionais
A POLÍTICA DE TUTELA AOS EMIGRADOS ITALIANOS EM SC (1871 - 1930)
Claricia Otto 1
(1. DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA - UNIVERSIDADE ESTADUAL DO OESTE DO PARANÁ / UNIOESTE)
INTRODUÇÃO:

 

Dentre o conjunto de meios para promover os interesses da Itália no Brasil está a instalação de agências consulares e de consulados, juntamente com o envio de seus agentes. Em Santa Catarina, registra-se a instalação de uma Agência Consular em 1871. A partir de 1894 passa a ter sede de consulado, desligando-se da jurisdição do consulado de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul. O governo italiano, numa primeira etapa da movimentação imigratória, não havia pensado em tutelar os emigrados. Diante disso, surgem as seguintes questões: com que objetivos o governo italiano enviou cônsules e agentes consulares para tutelar os emigrados? Por que, em determinado momento, surgiu a preocupação em fazer com que os emigrados estabelecessem vínculos com a Itália? Qual foi a eficácia na promoção e instauração de relações com a mãe-pátria? Em que medida despertou e/ou produziu sentimentos e valores culturais italianos? Esses interesses foram ao encontro das necessidades dos imigrantes? Toma-se como objeto de reflexão o olhar dos cônsules em vista do lugar que ocupam, do poder de construção que lhes fora atribuído. O período abrangido pela pesquisa se estende do final do século XIX até os anos 30 do século XX. A escolha do final do século XIX se justifica por coincidir com a vinda de cônsules italianos. Aproximadamente os anos trinta, quando a documentação aponta para tentativas de construção da italianidade. Essas investidas voltam ao cenário catarinense, com outras feições, nos anos 1970/80.

METODOLOGIA:

Os aspectos centrais, no que se refere aos procedimentos, foram os da pesquisa em arquivos e utilização de fontes orais. A escritura dos documentos encontrados nos acervos é compreendida como uma prática social que contribui na constituição dos sujeitos. Essas fontes não são apenas informativas ou de cunho reivindicatório, a sua elaboração exigiu uma ação. O processo de ordenamento de uma realidade é assumido pelos porta-vozes com o objetivo de legitimar e significar determinada ordem social. Por meio das fontes orais é possível verificar que, no momento da reconstituição, a pessoa verbaliza um significado a partir de seus enquadramentos sociais e de um imaginário social. Os entrevistados foram selecionados entre os moradores das localidades, partindo-se de uma primeira indicação, e cada entrevistado, por sua vez, indicava outro. A realização das entrevistas - gravadas e transcritas - não foi um caminho fácil, porém, um método valioso. Entrevistar pessoas e se propor a reescrever histórias por elas narradas implica interpretá-las também como uma construção e não uma verdade em si. Nesse sentido, verifica-se que o assunto recordado pelos entrevistados só o é porque foi significativo. Todavia, essas memórias, ou seja, o que existe como realidade para o entrevistado, em grande parte é o que socialmente é visto e assumido como real. Ou seja, são representações, cada um fala aquilo segundo as significações por ele apreendidas.

RESULTADOS:

Diante da constatada falta de esperança dos imigrantes, o consulado procura reavivá-los. Esse reavivamento está associado ao projeto de construção de uma identidade italiana. Os porta-vozes objetivam a uma identificação e sentimento de pertencimento dos italianos a um determinado grupo, ser italiano no Brasil. Os jornais italianófilos produzidos e destinados aos núcleos coloniais italianos veicularam discursos cujo objetivo era a construção de um imaginário social acerca da grandeza e do valor da pátria italiana, bem como de seus heróis, principalmente no período da Primeira Guerra Mundial, em que a Itália lutava pela anexação definitiva das regiões do Trentino e do Vêneto. Os agentes consulares e os cônsules desenvolvem estratégias de ação a partir de uma delegação do governo italiano. O que está em jogo nessa construção de identidades são as lutas pelo reconhecimento de autoridade. Dessa forma, as identidades, a começar pela identidade dos porta-vozes, são simbólicas e reais ao mesmo tempo porque são histórica e socialmente construídas. Desse modo, o trabalho procurou demonstrar que o ser italiano não era algo dado, que a italianità estava por ser construída. Os cônsules têm uma visão do espaço conforme a posição ocupada nesse espaço. Entretanto, ressalta-se que o ponto de vista deles está instituído como ponto de vista legítimo. Por ser legítimo, precisa ser reconhecido, pelo menos no interior de uma sociedade específica, neste caso, das colônias italianas catarinenses.

CONCLUSÕES:

A idéia de patriotismo italiano é incutida pela afirmação de que os italianos emigrados deveriam manter sólidos laços com a pátria-mãe. O governo italiano objetivava orientar-se em função de uma política comercial e em proveito dos interesses nacionais. Os discursos dos cônsules cedem lugar às características étnicas como uma espécie de manipulação, uma estratégia em vista dos interesses econômicos da Itália pós-unificada. A vinda de cônsules, propagandistas da italianidade para Santa Catarina resulta dos interesses da política do Estado italiano recém-unificado. Esses porta-vozes colocam-se diante de seus compatriotas, apresentando-se como identificados com seus problemas e suas  necessidades. O diagnóstico do corpo consular é que as colônias italianas não traziam à Itália, no setor comercial e industrial, as vantagens que se esperava. Na visão dos cônsules, o sentimento de italianidade contribuiria para melhorar o comércio, tanto de importação como de exportação. As elites dirigentes italianas pautavam-se pela tese de que à emigração deveriam corresponder mercados consumidores de produtos italianos. Para o governo italiano, os emigrados deveriam contribuir com o aumento da estima que a Itália deveria ter no mundo e isso seria a ampliação de um capital simbólico. O consulado italiano em Santa Catarina atua nessa perspectiva, utiliza-se de estratégias de influência junto à coletividade italiana na tentativa de corresponder aos interesses do governo italiano.

 

 
Palavras-chave: consulado italiano; imigrantes; Santa Catarina.
Anais da 58ª Reunião Anual da SBPC - Florianópolis, SC - Julho/2006