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F. Ciências Sociais Aplicadas - 4. Direito - 12. Direito

EXERCÍCIO DE DIREITOS SEXUAIS E REPRODUTIVOS POR ADOLESCENTES: REPENSANDO OS FUNDAMENTOS DA CAPACIDADE JURÍDICA

Taysa Schiocchet 1, 2, 3, 4
(1. Universidade do Vale do Rio dos Sinos/UNISINOS; 2. Universidade da Região de Blumenau/FURB; 3. Faculdade de Direito de Joinville/FDJ; 4. Centro Universitário de Jaraguá do Sul/UNERJ)
INTRODUÇÃO:

É considerável o número de adolescentes brasileiros que estão inteiramente desamparados, sobretudo no que concerne à assistência sanitária. Justamente com o intuito de diminuir as desigualdades sociais e garantir, ao menos, os direitos essenciais dos indivíduos, emergiu o processo internacional de consolidação das dimensões dos direitos humanos ou fundamentais. Por um lado, os adolescentes foram elevados à categoria de sujeitos de direitos, garantida a primazia do seu melhor interesse, e, por outro, houve o reconhecimento na órbita internacional e, posteriormente, nacional dos direitos sexuais e reprodutivos enquanto parte indivisível dos direitos humanos. A partir dessas premissas, a presente pesquisa buscou identificar, descrever e analisar a normatização jurídica envolvendo os adolescentes, bem como as esferas da sexualidade e da reprodução, a partir da (im)possibilidade de os mesmos exercerem seus direitos sexuais e reprodutivos, sobretudo no contexto sanitário brasileiro, revelando os impasses e contradições do próprio sistema jurídico.

METODOLOGIA:

Para a realização da pesquisa proposta, foi utilizado basicamente o recurso da pesquisa bibliográfica e documental. A pesquisa bibliográfica consistiu na análise de fontes nacionais e estrangeiras de diversas áreas do conhecimento além do Direito, tais como a História, Filosofia, Sociologia e Antropologia, confirmando o caráter interdisciplinar do trabalho. No que se refere à pesquisa documental, procedeu-se à análise de algumas fontes primárias, como instrumentos jurídicos internacionais de proteção dos direitos humanos (de caráter geral e especial), leis e decisões judiciais. Foi realizado preliminarmente um retrospecto histórico com o objetivo de identificar a trajetória dos adolescentes, desde o seu anonimato até o seu reconhecimento como atores sociais e, posteriormente, como sujeitos de direitos. Em seguida, foi feita uma análise histórico-antropológica da sexualidade, enquanto esfera atravessada pelas estratégias do biopoder, questionando-se os padrões de normalidade estabelecidos socialmente nos limites biológicos do corpo. Apreciou-se a formulação e o reconhecimento dos denominados “direitos sexuais e reprodutivos” nos planos nacional e internacional, procedendo-se à devida análise conceitual desses direitos. Com isso, foram identificadas algumas restrições específicas impostas pelo ordenamento jurídico brasileiro ao exercício de direitos sexuais e reprodutivos por adolescentes.

RESULTADOS:

Diante disso, como resultados, destaca-se a possibilidade de uma abordagem transdisciplinar, o que é indispensável em se tratando de uma temática envolvendo o Direito e a Bioética. Foi possível, ainda, descrever a transposição dos universos discursivos da sexualidade e da reprodução para a linguagem jurídica, mediante a formulação e o reconhecimento dos denominados “direitos sexuais e reprodutivos” e, assim, identificar as restrições impostas aos adolescentes para o exercício desses direitos no contexto sanitário brasileiro. As principais restrições identificadas e analisadas foram a restrição ao acesso aos serviços de planejamento familiar e aos serviços de interrupção voluntária da gestação, bem como a impossibilidade de os adolescentes em cumprimento de medida sócio-educativa receber visitas íntimas.

CONCLUSÕES:

Tais restrições amparam-se fundamentalmente na incapacidade jurídica, determinada pelo Direito Privado e informada por valores patrimonialistas, bem como por uma ideologia de superioridade adulta. Contudo, o fenômeno da repersonalização do Direito Privado, juntamente com as reflexões bioéticas, permitiram problematizar a utilização exclusiva de um critério objetivo, o etário, no estabelecimento da capacidade para o exercício de direitos sexuais e reprodutivos. A capacidade de fato é uma categoria jurídica abstrata que despreza as particularidades do caso. Conduzir essa noção para todos os direitos e, sobretudo, para a esfera dos novos direitos, não se coaduna com a construção jurídico-filosófica dos direitos humanos, centrada na dignidade humana, nem com a primazia do melhor interesse dos adolescentes na perspectiva da proteção integral. A incorporação pelo Direito da capacidade progressiva dos adolescentes para o exercício de direitos fundamentais e da personalidade parece viabilizar a proteção dos adolescentes e, concomitantemente, o respeito à sua liberdade e autonomia. Em suma, a pesquisa evidenciou o quão imperativa é a mudança de um paradigma jurídico patrimonialista, individualista, formalista e técnico-racional, que privilegia a ordem e a segurança, por outro transindividual, pluralista e flexível, que fragiliza a dicotomia entre Direito Público e Direito Privado, voltando-se aos fatos e às demandas sociais.

Instituição de fomento: CAPES
 
Palavras-chave: direitos sexuais e reprodutivos ; adolescentes enquanto sujeito de direitos; formulação bioética da capacidade progressiva de exercício.
Anais da 58ª Reunião Anual da SBPC - Florianópolis, SC - Julho/2006