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B. Engenharias - 1. Engenharia - 13. Engenharia Sanitária
MODELAGEM DA COBRANÇA PELO USO DA ÁGUA BRUTA PARA APLICAÇÃO EM ESCALA REAL NA BACIA DO RIO SANTA MARIA
Francisco Rossarolla Forgiarini 1
Geraldo Lopes da Silveira 1
(1. Dpto. de Hidráulica e Saneamento, Universidade Federal de Santa Maria / HDS-UFSM)
INTRODUÇÃO:

A Lei Federal no 9.433 de 1997, conhecida como a Lei das Águas, introduziu a cobrança pelo uso da água bruta no Brasil. Utilizada como um instrumento de gestão, a cobrança deve arrecadar recursos para dar suporte financeiro ao sistema de gestão de recursos hídricos e às ações definidas pelos planos de bacia hidrográfica. Além disso, ela deve indicar para a sociedade que a água é um bem escasso e que possui um valor, com a finalidade de que este recurso seja utilizado de forma racional e que o seu uso atenda aos princípios do desenvolvimento sustentável. Atualmente, é possível identificar inúmeras propostas e estudos teóricos sobre a aplicação da cobrança pelo uso da água bruta em bacias hidrográficas brasileiras. Entretanto, a possibilidade real de aplicação da cobrança tem provocado dúvidas e inquietações na sociedade, principalmente devido aos poucos trabalhos desenvolvidos em que a cobrança foi efetivamente implantada. O objetivo deste trabalho é avaliar a aplicabilidade da cobrança pelo uso da água à realidade de uma bacia hidrográfica brasileira, considerando a limitação dos dados existentes, os outros instrumentos de gestão já estudados e a participação do comitê de gerenciamento da bacia.

METODOLOGIA:

A bacia de estudo foi a bacia do Rio Santa Maria, localizada no sudoeste do Rio Grande do Sul, com área de 15.754 km² e atividade econômica preponderante a produção de arroz. Em primeiro lugar, foram aprimorados e consistidos os dados cadastrais dos usuários de água da bacia. A seguir, foi desenvolvido um modelo de cobrança pelo uso da água bruta em conjunto com o comitê da bacia. A definição dos valores a serem cobrados considerou os seguintes princípios: a) PUP – Princípio Usuário Pagador: cobrança pela captação e consumo de água; e b) PPP – Princípio Poluidor Pagador: cobrança pela diluição de efluentes. Foram realizadas três simulações de cobrança, considerando cenários de investimentos anuais também definidos com o comitê da bacia: i) Cenário 1 = R$ 10.054.921,95; ii) Cenário 2 = R$ 6.452.101,93; e iii) Cenário 3 = R$ 60.931.963,42. Os resultados foram comparados com simulações realizadas utilizando os modelos de cobrança dos comitês CEIVAP e PCJ, bacias brasileiras onde a cobrança já foi implementada. Para os valores de cobrança obtidos nas simulações, foram analisados os impactos econômicos sobre os custos de produção (setor agropecuário e industrial) e sobre a tarifa de água e esgoto (setor de abastecimento humano). O critério utilizado para a análise do impacto econômico foi que os valores cobrados não podem inviabilizar nenhum uso. Foi analisada também a aceitabilidade social da cobrança, por meio da aplicação de questionários à população da bacia.

RESULTADOS:

O setor agrícola é o maior usuário de água na bacia (63,24%), seguido do setor de abastecimento humano (urbano = 26,14% e rural = 5,89%), da pecuária (4,63%) e do setor industrial (0,10%). As simulações resultaram nos seguintes valores médios: Cenário 1 R$ 0,0132/m³; Cenário 2 R$ 0,0085/m³; e Cenário 3 R$ 0,0802/m³. A aplicação do modelo proposto no trabalho, do modelo CEIVAP e do modelo PCJ resultaram nos seguintes valores de arrecadação, respectivamente, por setor usuário: Agricultura 44,85%, 57,13%, 71,68%; Abastecimento Urbano 41,35%, 29,61%, 19,07%; Abastecimento Rural 12,36%, 7,72%, 2,24%; Indústria 0,20%, 0,95%, 0,32%; e Pecuária 1,24%, 4,59%, 6,69%; e por tipo de uso: Captação 27,18%, 42,45%, 36,60%; Consumo 21,71%, 38,08%, 52,24%; e Diluição 51,10%, 19,46%, 11,16%. No setor agropecuário, foi definido o impacto máximo de 1% sobre o custo de produção. Este valor foi superado nas três simulações para o setor agrícola e apenas na simulação 3 para a pecuária. Para o setor industrial, foi definido o impacto máximo de 5% sobre o custo de produção, valor que não foi superado. No setor de abastecimento humano, foi definido o impacto máximo de 1% sobre a tarifa para os usuários rurais e 2,5% para os usuários urbanos. Estes limites foram superados no meio rural na simulação 1 e 3 e no meio urbano na simulação 3. Cerca de 57% da população se mostraram favoráveis à cobrança pelo uso da água bruta com os objetivos descritos na legislação brasileira.

CONCLUSÕES:
As diferentes simulações realizadas indicaram que a cobrança na bacia do Rio Santa Maria é viável, desde que sejam respeitados os impactos econômicos definidos como critério de validação do modelo proposto. A análise de impacto econômico indicou que os setores mais sensíveis à cobrança são a agricultura e o abastecimento rural. Diferentemente dos modelos CEIVAP e PCJ, o modelo proposto determina a cobrança por diluição de acordo com o volume utilizado para diluir os efluentes, segundo a classe de enquadramento dos recursos hídricos. Isto garante o cumprimento das metas ambientais definidas no processo de enquadramento e proporciona uma cobrança maior do uso de diluição, induzindo o reuso da água e o tratamento dos efluentes. A pesquisa demonstrou que, de um modo geral, a população se mostrou favorável à cobrança pelo uso da água bruta. Como conclusão final, avalia-se que, após o entendimento do processo, o comitê apropriou-se dos princípios norteadores da cobrança e de seus objetivos, capacitando-se para deliberar sobre efetiva implementação deste instrumento de gestão dos recursos hídricos. Acredita-se que o estudo poderá servir de orientação e oferecer subsídios técnicos e analíticos de suporte aos processos de cobrança pelo uso da água bruta em escala real para outras bacias hidrográficas.
Instituição de fomento: Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), por meio do Fundo Setorial de Recursos Hídricos (CT-HIDRO).
 
Palavras-chave: cobrança pelo uso da água bruta; modelos de simulação; cadastro de usuários da água.
Anais da 58ª Reunião Anual da SBPC - Florianópolis, SC - Julho/2006