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G. Ciências Humanas - 1. Antropologia - 5. Antropologia Urbana
MOLDURAS RUÍDAS, ESCRITAS REVELADAS: REPRESENTAÇÕES SÓCIO-CULTURAIS A PARTIR DA LEITURA FOTOGRÁFICA DA CIDADE DE CURRAIS NOVOS-RN DE 1930 A 1960.

Gênison Costa de Medeiros 1
Eugênia Maria Dantas 1
(1. Departamento de História e Geografia - CERES / UFRN)
INTRODUÇÃO:

Ler a cidade é perscrutar símbolos, imagens e sons que se mostram ou não para o leitor. É mergulhar no visível e invisível citadino construindo trajetórias e desenvolvendo estratégias para desvendá-la. Nesta perspectiva, procuramos fazer uma leitura da cidade a partir de fotografias, objetivando identificar as representações sócio-culturais que configuraram o cenário da cidade de Currais Novos/RN, localizada na Microrregião do Seridó Potiguar, do período de 1930 a 1960. Neste interstício temporal, destacamos a figura de dois fotógrafos que forjaram imagens nesta cidade, a senhora Helena Coelho Ferreira e Raimundo Nunes Bezerra. A partir das imagens coletadas identificamos os resquícios de memória esquadrinhados no “papel amarelado”, observando não somente o visível, mas o que transpõe a moldura, o detalhe acidental que contém significações. A relevância desta pesquisa consiste no fato de que a leitura iconográfica amplia os horizontes de interpretações do leitor, levando-o a compreender o imaginário social revelados na fotografia, por meio da aproximação entre imagem e palavra, linguagem e texto, com o intuito de comunicar  tempos e espaços diferentes.

METODOLOGIA:

Para realizar a pesquisa foi coletado imagens do projeto “Fotografia e Complexidade: Itinerários Norte-Rio-Grandenses” e de acervos particulares dispersos na cidade de Currais Novos/RN. Esse material foi submetido a uma leitura que permitiu adentrar na cidade para compreender as representações sócio-culturais capturadas pela “objetiva” de Helena Coelho e Raimundo Bezerra. Para isto, optou-se por utilizar alguns autores que fundamentaram a leitura das fotografias. Em Roland Barthes encontramos os conceitos de Punctum e Studium essenciais para a interpretação fotográfica. Nesta perspectiva, foi adotado Edgar Morin para entender a complexidade inerente à imagem, como também o seu valor estético e cultural. Roger Chartier referencia a pesquisa quando trata das práticas sócio-culturais como hábitos socialmente elaborados e partilhados, que constrói uma realidade comum a um determinado grupo social. Para discutir cidade, optou-se por utilizar Ítalo Calvino com “Cidades Invisíveis”. Desta forma, construíram-se reflexões sobre os grupos, as práticas, e as representações sócio-culturais que produziram o espaço citadino contemplado pela pesquisa.

RESULTADOS:

O projeto “Fotografia e Complexidade: Itinerários Norte-Rio-Grandenses” abriu horizontes para a pesquisa iconográfica realizada na cidade de Currais Novos/RN. Ao observar imagens, dois fotógrafos chamaram a atenção: Helena Coelho Ferreira e Raimundo Nunes Bezerra. O acervo coletado contou com mais de 500 fotografias sendo que apenas 1/3 versavam sobre representações sócio-culturais, objetivo da pesquisa. Ao passo que as imagens foram sendo submetidas à observação, constatou-se que as lentes aprisionaram muitos eventos sócio-culturais que ocorreram nesta cidade. Desfiles cívicos, missas, procissões, rituais fúnebres e inaugurações são algumas das representações descortinadas pela pesquisa que gerou significados e reafirmou o discurso da historiografia e da literatura regional. A agitação da imagem proporcionada pelo calor emanado dos eventos aprisionados, denuncia o citadino sertanejo encenando a cultura, os processos de sociabilidades e a marcha da modernização. Não distante do proposto, encontramos homens, mulheres, padres, políticos que teceram a cidade peculiarizando-a, dando significado ao lugar e reafirmando, desta forma, a identidade do sertanejo.

 

CONCLUSÕES:

Descongelar uma fotografia é dar-lhe movimento e significado, para reencontrar tempos e espaços. Os sinais captados a partir da interpretação iconográfica da fotografia de Helena Coelho Ferreira e Raimundo Nunes Bezerra revelam a cidade apropriada por sujeitos que constroem  suas identidades  produzindo e reproduzindo o espaço. As representações sócio-culturais desvendadas são eventos citadinos que mesclam o rural e o urbano, o elitizado e o segregado. São representações que retratam a condição humana do sertanejo, da devoção fulgurante, da educação normalista, do civismo, dos aspectos regionais que caracterizam o Seridó. Nestas imagens, vislumbra-se o contexto político-econômico de um espaço atingido pelo progresso, pelas novas tendências mundiais, pela moda, pelos adornos exuberantes que forjam uma linguagem ao mesmo tempo local e global. Não se substitui o velho, acrescenta-se o novo a este, constatação essa, feita a partir de uma análise temporal do período recortado pela pesquisa (1930 a 1960). Não se tratou de encontrar apenas particularidades, mas, compreender o contexto espaço-temporal tecido pelos fios que interligam o mundo e seus construtores. Desta forma, constatou-se que a fotografia transversaliza o conhecimento, pois vislumbramos a história, a Geografia, a Sociologia e a Antropologia da cidade, reveladas nos corpos, nos trajetos, nas poses e nos comportamentos impressos nas imagens dos “poetas da luz” que congelaram a cidade de Currais Novos/RN.

Instituição de fomento: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico / CNPq e Pró-Reitoria de Pesquisa / PROPESQ
Trabalho de Iniciação Científica  
Palavras-chave: Fotografia; Cidade; Identidade.
Anais da 58ª Reunião Anual da SBPC - Florianópolis, SC - Julho/2006